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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)
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O jogo para 2022 está zerado

O resultado das urnas machuca Bolsonaro e o PT, mas não há favoritos para a eleição presidencial

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 30 nov 2020, 12h24

Eleições municipais são, por definição, locais. Mas estas, realizadas sob o impacto das 172 mil mortes na pandemia de Covid-19, favoreceram prefeitos e ex-prefeitos, expulsaram a Nova Política que fez tanto sucesso em 2018 e rearrumaram o quadro político. São tantos os fracassados nessa campanha municipal e tão poucos os que podem comemorar que é possível dizer que a eleição presidencial de 2022 está zerada.

Os maiores perdedores foram Bolsonarismo e o PT. Quase todo candidato que o presidente Jair Bolsonaro apoiou, perdeu. É um dedo-podre que vai fazer custar mais caro o apoio de outros partidos em 2022. O PT conseguiu ter um resultado pior que em 2016, que parecia ser o fundo do poço. Como escreveu o jornalista Ricardo Kotscho: “Não adianta querer tapar o sol com a peneira. Foi a maior derrocada do PT nestes 40 anos e, para não ser surpreendido outra vez, seria bom que se preparasse melhor para as próximas eleições, de preferência, antes que as urnas falem. O mundo mudou. O antipetismo ficou maior do que o petismo”.

Mas se os dois concorrentes no segundo turno de 2018 saíram machucados, não há um vencedor do outro lado. O PSDB manteve a Prefeitura de São Paulo apesar do governador João Dória e não pela sua ação. O partido precisará refazer sua estratégia de redes sociais e de posicionamento se quiser ter participação relevante nas próximas eleições.

Ciro Gomes montou a aliança PDT-PSB, mas os resultados foram fracos fora do Nordeste. Os partidos mantiveram seus domínios em Fortaleza, Recife e Aracaju, mas no conjunto não se marcaram como a opção ao PT. O governador do Maranhão, Flavio Dino, do PCdoB, tropeçou nos próprios pés ao ter cinco candidatos a prefeito de São Luís e ainda assim perder.

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“A direita brasileira, a face mais selvagem, bruta, violenta, anedótica, saiu derrotada, mas continuamos numa ofensiva na direita, uma direita amplamente vencedora nas eleições municipais — nas suas várias facetas, porém amplamente vencedora. Então, temos que nos unir do lado daqui para poder enfrentar essa ofensiva”, disse Dino a Leonardo Sakamoto. “Mesmo o resultado do Rio de Janeiro, o que aconteceu? Saiu PDT, PSB de um lado, PT, PCdoB do outro e PSOL com uma terceira candidatura. Ficamos fora do segundo turno. Poderíamos ter ido ao segundo turno, não fomos pela divisão. Essa é a questão principal”.

Quem saiu maior das urnas foi a geleia de partidos que vai do Democratas ao PSD, passando pelo PP e MDB, legendas sem rosto e, principalmente, sem candidato em 2022. Em entrevista a O Globo, o presidente do DEM, ACM Neto, foi reticente: “Converso com o Luciano Huck? Converso. Converso com o (governador de São Paulo, João) Doria? Converso. Assim como converso com o Ciro (Gomes), o Bolsonaro, com os principais atores envolvidos nesse processo, mas nenhuma dessas conversas girou em torno de um compromisso para 2022”. Quem tem tantas opções, não tem nenhuma.

As outras lições desta campanha:

A força da rejeição

Há dois tipos possíveis de alianças da oposição contra um adversário comum. Pergunte a prioridade da gestão do prefeito eleito do Rio, Eduardo Paes, e sua resposta será “não ser Marcelo Crivella”. Saúde, educação, transportes… nenhuma proposta de Paes ficou na memória de qualquer eleitor carioca a não ser a de que ele não é Crivella, o prefeito mais impopular em décadas. A tática que deu certo no Rio pode funcionar no Brasil em 2022? No Rio, o #EleNão funcionou sem conversas prévias.

Em Fortaleza, houve uma união real entre todos os partidos contra o candidato do bolsonarismo. Na campanha de TV, do prefeito eleito José Sarto havia lugar para o seu padrinho Ciro Gomes, o PT, o PSOL, Rodrigo Maia e Marina Silva. Do lado do perdedor, Jair Bolsonaro e o ex-juiz Sergio Moro.

A direita não é invencível nas redes sociais

A campanha de Guilherme Boulos em São Paulo mostrou que a incompetência digital da esquerda não é destino, mas escolha, como escreveu no Twitter o professor Wilson Gomes. Sem marqueteiro milionário, Boulos montou uma campanha de redes sociais criativa e efetiva. Bruno Covas tinhas nas mãos as máquinas municipal e estadual, dez vezes mais tempo no rádio e TV no primeiro turno (3’29”por dia contra 17”) e seis vezes mais recursos (R$17,9 milhões vrs. R$ 3,3 milhões). Para os tucanos, ganhar era obrigação. Para Boulos as redes foram uma metamorfose. Desde as manifestações de 2013, a esquerda tomava um baile nas redes sociais. O jogo mudou.

O novo rosto da esquerda

Derrotado por uma diferença de 1 milhão de votos, o ativista Guilherme Boulos saiu da campanha como vencedor. Em dois meses, ele mostrou poder ser no futuro tudo o que fez o PT ser o PT um dia: jovial, com uma vida espartana e um carisma raro. Em muitos momentos, Boulos lembra o jovem Luiz Inácio Lula da Silva, sem o messianismo.

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A campanha de redes sociais do PSOL custou um décimo da do PT e a derrotou por quilômetros de distância, gerando conexão direta com jovens normalmente desinteressados na política. Boulos massacrou o candidato PT sem falar mal uma vez do partido, facilitando a muitos petistas transferir o seu voto já no primeiro turno. Fez com o prefeito reeleito Bruno Covas o mais civilizado segundo turno no Brasil em décadas, em parte por não carregar a bílis petista, em parte porque sabia necessário afastar de si a imagem do radical.

Na campanha presidencial de 2018, Boulos era o candidato das tiradas engraçadinhas (“temos aqui 50 tons de Temer”), promessas irrealizáveis de esquerda (revogação da reforma trabalhista e do Teto de Gastos) e o pior resultado eleitoral da história do PSOL (0,6% dos votos). Dessa vez, Boulos colocou como vice a conhecida e octogenária ex-prefeita Luiza Erundina, largou as piadas e moderou o tom. O antipetismo que ainda pesa como ônus na esquerda, não colou nele.

Boulos é uma opção mais viável no futuro do que Fernando Haddad ou Ciro Gomes. É altamente improvável que PT ou PDT cedam seu lugar em 2022, mas Boulos tem só 38 anos. O tempo está do lado dele.

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A Lava Jato sumiu

Em 2014, o vazamento pela Polícia Federal do depoimento de um doleiro na semana da eleição mudou milhões de votos e quase tirou a reeleição de Dilma Rousseff. Em 2016, a política respirava as denúncias e prisões da Lava Jato. Em 2018, a prisão de Lula e a divulgação do depoimento de Antonio Palocci na semana da eleição mostravam de que lado a operação estava. Nesta campanha, com a Lava Jato acuada pelo governo Bolsonaro e sem Sergio Moro com a caneta na mão, promotores, juízes e policiais não interferiram.

O kit bolsonarista ainda funciona

Se Bolsonaro foi uma presença nefasta nos palanques, o kit Bolsonarista de campanha deu certo. Em Porto Alegre e Recife, as campanhas dos prefeitos eleitos Sebastião Melo e João Campos, respectivamente, venceram usando a fórmula de baixarias. Postagens de Whatsapp iguais às do gabinete do ódio bolsonarista acusaram as adversárias de incentivar pedofilia nas escolas a perseguir servidores evangélicos, de oferecer carne de cavalo na merenda escolar a liberar a maconha. Funcionou.

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