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Thomas Traumann

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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)
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Brasileiros em tempos sombrios

Perdemos 300 mil pessoas. Quantos mais perderemos?

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 26 mar 2021, 19h54 - Publicado em 24 mar 2021, 15h38

Nas piores estimativas, 210 mil pessoas morreram com as bombas nucleares despejadas nas cidades japoneses de Hiroshima e Nagazaki, em 1945. O Brasil de Bolsonaro provocou a sua própria explosão nuclear, à base de omissão na compra de vacinas, charlatanismo médico e politicagem. Hoje, 24, dia em que o Brasil chega a 300 mil mortos em um ano, ao invés de fazer algo para poupar vidas a reação do governo Bolsonaro foi mudar os critérios de recebimento de dados para fraudar os números.

São 300 mil mortes hoje, mas é difícil ter esperanças de que não serão 400 em maio e 500 mil em julho e assim por diante. Hoje é alguém da minha família. Amanhã é alguém da sua.

O governo Bolsonaro cancelou e dificultou a compra de vacinas, reduziu a distribuição de oxigênio e analgésicos nos hospitais e insiste em boicotar as iniciativas de lockdown que poderiam, ao menos, diminuir o ritmo de propagação do vírus. No mês de março, em nenhum outro país foram registradas tantas mortes por Covid como no Brasil. O descontrole do vírus aqui ameaça outros países. Não somos mais os párias do mundo, somos a lepra do mundo.

Não se perde 300 mil pessoas em um ano sem um esforço cotidiano. Nos últimos doze meses, morreu mais gente de Covid no Brasil do que do coração, de armas de fogo, acidentes de carro, tétano, difteria. Foram noves anos de conflito sangrento para que a Guerra na Síria chegasse perto de 400 mil vítimas. Bolsonaro fará isso em pouco mais de um ano.

Mas não foi só Bolsonaro. Hoje pela manhã, Bolsonaro fez um convescote com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira, e alguns governadores bajuladores. Inventaram uma Comissão que em tese irá coordenador esforços para combater o vírus, mas que todos sabemos é apenas uma resposta de relações públicas. Nada de útil jamais veio de uma comissão.

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É reconfortante responsabilizar o presidente e seus ministros irresponsáveis, mas eles nunca chegariam a tanto se toda uma sociedade não tivesse se omitido. A conivência das elites política, militar e empresarial com o Jair Bolsonaro cobra um preço em falta de leitos nas UTIs, nos kits de teste de Covid com validade vencidas e nos pacientes com hepatite por tomarem cloroquina.

Em seu clássico livro de ensaios biográficos “Homens em Tempos Sombrios”, a filósofa Hannah Arendt traz um retrato cautelosamente humanista sobre como grandes personalidades atravessaram os piores momentos do século 20. Escreveu Arendt: “Mesmo nos tempos mais sombrios temos o direito de esperar alguma iluminação, e que tal iluminação pode muito bem vir menos de teorias e conceitos do que da luz incerta, cintilante, e muitas vezes fraca que alguns homens e mulheres, em suas vidas e suas obras, acenderão sob quase todas as circunstâncias e derramarão ao longo do tempo que lhes foi dado na Terra… Olhos tão acostumados à escuridão como os nossos dificilmente serão capazes de dizer se essa luz era a luz de uma vela ou a de um sol escaldante. Mas essa avaliação objetiva me parece uma questão de importância secundária que pode ser deixada com segurança para a posteridade”.

Hoje no Brasil é difícil enxergar qualquer luz.

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