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Por Sérgio Rodrigues
Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.
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Convescote não tem cardápio

A propósito daquela tola lei antiestrangeirismo proposta por um deputado gaúcho, que comentei aqui no domingo, é bom lembrar as realizações – e os fracassos, bem mais numerosos – de um personagem pitoresco das letras brasileiras do século 19, uma espécie de patrono dos xenófobos linguísticos: o latinista Antônio de Castro Lopes (1827-1901), que Machado […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 12h11 - Publicado em 26 abr 2011, 16h43

A propósito daquela tola lei antiestrangeirismo proposta por um deputado gaúcho, que comentei aqui no domingo, é bom lembrar as realizações – e os fracassos, bem mais numerosos – de um personagem pitoresco das letras brasileiras do século 19, uma espécie de patrono dos xenófobos linguísticos: o latinista Antônio de Castro Lopes (1827-1901), que Machado de Assis chamava, com ironia, de “nossa Academia Francesa”.

Incomodado com a grande circulação de palavras vindas de fora, especialmente do francês, o idioma imperialista da época, Castro Lopes lançou em 1889 o livro “Neologismos indispensáveis e barbarismos dispensáveis”, em que propunha uma série de neologismos, forjados por ele mesmo, como substitutos de estrangeirismos que considerava “bárbaros” (atenção, moçada, o sentido aqui é negativo).

De sua quixotesca fábrica de vocábulos saíram termos esquisitos que não tardaram a cair no mais completo esquecimento: cinesíforo (chofer), ludâmbulo (turista), runimol (avalanche) e focale (cachecol) são alguns deles. Outras de suas invenções tiveram uma sobrevivência anêmica como palavras raras e ainda hoje são encontráveis no dicionário, embora não frequentem a língua viva há muito tempo: é o caso de lucivelo (abajur), nasóculos (pincenê) e preconício (reclame, propaganda).

No entanto, Castro Lopes também marcou seus golzinhos. Cardápio, que ele criou a partir das palavras latinas charta (carta) e daps (banquete) para substituir o francês menu, tornou-se termo de grande circulação, embora menu continue sendo usado também.

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Se cardápio é seu produto de maior sucesso, meu castrolopismo preferido é outro: convescote. Essa palavra adorável, que quer dizer piquenique, ainda aparece de vez em quando na língua de verdade, quase sempre acompanhada daquela inflexão sarcástica ou brincalhona de quem sabe estar lançando mão de um termo de época. O curioso é que, para forjá-la, o latinista se arriscou a minar sua regra de ouro: convescote vem de “conv(ívio)” e “escote” (cota que cabe a cada um numa vaquinha).

Ocorre que “escote” também é um galicismo, do francês antigo escot. Sua única diferença em relação às palavras que Castro Lopes condenava era a antiguidade: tinha chegado ao português no século 16. Quer dizer que o tempo lava tão bem a estrangeirice dos estrangeirismos que até um purista passa a aceitá-los? Exatamente. O abajur, o turista, o chofer, a avalanche e o cachecol só precisavam de tempo. E o tempo passou, apesar do engenhoso Castro Lopes.

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