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Até quando?

Mandetta venceu a batalha, mas a guerra não terminou

Por Ricardo Rangel Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 15 abr 2020, 10h36 - Publicado em 10 abr 2020, 06h00

“Até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência?”

Lúcio Sérgio Catilina, militar e político da Roma antiga, conspirava para derrubar a República; quem o interpelava, em pleno Senado, era Marco Túlio Cícero, cônsul romano e o maior orador da Antiguidade. A pergunta de Cícero era retórica, mas encerrava outra pergunta, mais premente, dirigida a seus pares: “Até quando permitiremos que Catilina atente contra a República?”.

Na manhã de segunda-feira, Jair Bolsonaro saiu do Alvorada com uma caneta cheia de tinta, decidido a demitir Luiz Henrique Mandetta, culpado de fazer sucesso demais. Voltou à noite com a caneta intocada, inerte e impotente — Mandetta não apenas continuava no cargo, mas também dava uma entrevista vitoriosa e recheada de farpas contra o chefe. Entre a manhã e a noite, o presidente foi rechaçado pelo Congresso, pelo STF, por seus próprios ministros.

Alcolumbre, Toffoli e os ministros militares podem ter evitado o pior, mas a solução foi lamentável.

Primeiro, porque temporária: Mandetta venceu a batalha, mas a guerra não terminou — e não terminará enquanto ele não cair. O estilo do capitão é conhecido. Ele frita sua vítima até derrubá-la. A derrota apenas açulou o rancor do presidente, que vai acabar substituindo Mandetta por alguém que lhe lamba as botas.

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Segundo, porque restrita: Mandetta é apenas um dos campos em que o capitão arremete contra a saúde pública. Afora a querela com o ministro, Bolsonaro ataca medidas sanitárias, recomenda medicamentos de toxicidade alta e eficácia incerta, estimula seus acólitos a criar fake news nas redes e a provocar crises com a China (de quem dependemos para o combate ao vírus).

“O ataque à saúde pública é a mais notável e ruinosa das frentes em que o presidente investe contra a República”

Por fim, tutelar o presidente é irregular e temerário. Substituir ministro é prerrogativa exclusiva do chefe do Executivo, não compete aos outros poderes, nem aos ministros, se imiscuir — espera-se dos representantes da República que se mantenham dentro da Constituição.

O ataque — de viés eleitoreiro — à saúde pública é apenas a mais notável e ruinosa das frentes em que o presidente investe contra a República. Interferiu, por motivos espúrios, no Coaf, na Receita, na Polícia Federal. Não fez do filho embaixador porque não quis. Nomeou auxiliares com o propósito de descumprir disposições constitucionais. Intimidou cidadãos e patrocinou campanhas de difamação. Convocou seus fãs para manifestações contra o Legislativo e o STF. Em que pese o bate-boca, o Congresso vem sendo tolerante com tais atrocidades.

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Cícero encerrou a catilinária com outra frase famosa: “Ó tempos, ó costumes”, lamentando sua época, em que se permitia que alguém atentasse contra o Estado impunemente. Um filósofo mais recente, Karl Popper, advertiu que “se estendermos a tolerância ilimitada aos intolerantes, então, os tolerantes serão destruídos e a tolerância com eles”.

Bolsonaro é um antidemocrata e um intolerante modelo. O que Cícero e Popper nos perguntam é até quando aceitaremos que ele abuse de nossa paciência.

Publicado em VEJA de 15 de abril de 2020, edição nº 2682

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