Requião não quer direito de resposta coisa nenhuma! Ele quer é o “direito” de calar as perguntas
Oportuno foi o sujeito que soube sintetizar em duas palavras o desconforto que nos provoca a empatia quando vemos alguém protagonizar um vexame ou uma situação ridícula: “vergonha alheia”. É isto: o senador Roberto Requião me fez sentir vergonha em seu lugar por duas vezes: a) ontem, quando tomou o gravador das mãos de um […]
Oportuno foi o sujeito que soube sintetizar em duas palavras o desconforto que nos provoca a empatia quando vemos alguém protagonizar um vexame ou uma situação ridícula: “vergonha alheia”. É isto: o senador Roberto Requião me fez sentir vergonha em seu lugar por duas vezes: a) ontem, quando tomou o gravador das mãos de um repórter, eliminando a gravação de uma entrevista; b) hoje, ao justificar o seu desatino. Leiam o que informa Gabriela Guerreiro, na Folha Online. Volto em seguida.
Um dia depois de retirar o gravador de um repórter, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) subiu à tribuna do Senado para justificar o gesto ao afirmar que reagiu a uma tentativa do jornalista de acuá-lo com perguntas agressivas. Com diversas críticas à imprensa, Requião disse que ficou com o aparelho para evitar que sua entrevista fosse editada de forma a “desmoralizar um parlamentar sério”. Segundo o senador, o repórter da Rádio Bandeirantes tentou lhe aplicar uma “armadilha” com “perguntas encomendadas”, numa atitude de “bullying” que marca parte da imprensa brasileira. “Temos que acabar com o abuso, o bullying que sofremos nas mãos de uma imprensa às vezes provocadora e muitas vezes irresponsável”, disse.
Requião afirmou, sem citar nominalmente veículos de comunicação, que a imprensa se acostumou a “plantar ruídos que se afastam completamente da verdadeira natureza dos fatos”. Sobre a retirada do gravador, disse que “há momentos em que a indignação é uma virtude”. Sem se mostrar arrependido pelo gesto, Requião disse que ontem “perdeu a paciência” com o repórter. “Talvez não devesse, mas perdi.” O senador afirmou que vai reapresentar no Senado o projeto que regulamenta o direito de resposta na imprensa para garantir espaço às “partes lesadas” na mídia. Requião já havia apresentado a matéria em sua passagem anterior pela Casa, mas o texto acabou arquivado pela Câmara. “A falta de um instrumento como esse tem me deixado, e a tantos brasileiros, impossibilitado de defesa quando vítima de informações não verdadeiras.”
Aposentadoria
No discurso, Requião falou sobre a aposentadoria de R$ 24 mil que recebe como ex-governador do Paraná –tema da pergunta do repórter Victor Boyadjian, da Rádio Bandeirantes, que provocou a irritação do senador. O peemedebista disse que decidiu solicitar a pensão por viver um momento de dificuldade financeira na família, depois de receber cobranças de dívidas judiciais. Ele ainda reclamou do valor do salário dos parlamentares, fixado em R$ 26,7 mil. “O salário de um senador é inferior a de um servidor estatutário. É inferior ao de milhares de juízes. O senador Simon foi constrangido por receber R$ 11 mil por mês [de pensão], enquanto funcionários do seu gabinete recebem três vezes isto. Se recebi, recebi porque achei que não era imoral.” Requião disse que, antes de receber a pensão, era o único ex-governador do Estado sem ter direito ao benefício.
“Todos recebem, a única exceção chamava-se Roberto Requião. Como vim ao Senado, abri mão dela por 16 anos. Quando saí do governo, cheguei à situação em que tinha dificuldade de receita pessoal para os gastos familiares comuns.” O peemedebista recebeu a solidariedade do senador Edison Lobão Filho (PMDB-MA) que, apesar de condenar o seu gesto, disse que o ato é “muito pequeno para se contrapor à sua história de vida”. Já o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) exaltou a biografia do senador, mas disse que é um “direito” do jornalista questioná-lo sobre um tema ligado à sua vida pública.
Voltei
As palavras de Requião só não são mais perigosas porque ele é, felizmente, um senador pouco influente. Seu discurso não oferece margem para manobra: ele está inconformado com a imprensa livre. Por essa razão, acredita que é preciso fazer alguma coisa. E agiu por conta própria: tomou o gravador das mãos do repórter e eliminou a gravação.
Ora, por que não deu, então, ao jornalista as explicações que vão acima? Prefere falar resguardado pela tolerância de seus pares a manter uma conversa efetiva com a imprensa, é isso? Afirmar que foi vítima de “bullying” é, obviamente, expressão de cinismo. Não há muita dúvida sobre quem foi o molestado e quem foi o molestador no episódio.
Para o senador, a imprensa está acostumada a “plantar ruídos que se afastam completamente da verdadeira natureza dos fatos”. Ahnnn… Vai ver é chegada a hora de criar um departamento estatal para decidir qual é a “verdadeira natureza dos fatos”, a exemplo do que existe na China, na Coréia do Norte e em Cuba! Liberdade para quê? Esse negócio já começa a incomodar, certo?
O que a “regulamentação do direito de resposta” tem a ver com o episódio? Nada! Eu estou entre aqueles que acreditam que o princípio constitucional precisa, sim, de uma lei que o regulamente, uma vez que restou um vazio jurídico depois do fim da malfadada Lei de Imprensa. Ocorre que não há direito de resposta que justifique o destrambelhamento de Requião, do qual, como se nota, ele não se arrepende!
Ele teve a solidariedade do senador Edison Lobão Filho, é? Bem, esse entende de liberdade de imprensa o que o pai entende de energia… Aquele confundiria uma tomada com um focinho de porco — nos tempos em que não existiam ainda as tomadas-jabuticaba… O Lobinho confunde truculência com indignação cívica.
Requião não quer direito de resposta coisa nenhuma! Ele quer é o direito de calar as perguntas!