Mayara Vivian, a heroína! Ela não tem voto, mas tem convicção! E Hotimsky, um especialista veterano em políticas públicas, o Rimbaud da catraca
A presidente Dilma Rousseff se encontrou hoje com todos os governadores e prefeitos de capitais. Somavam-se ali milhões de votos. Ninguém apareceu no principal noticioso do país. Sabem como é: como é impossível ouvir 27 governadores e 26 prefeitos, então ninguém mostra a cara. Nesse caso, escolhe-se, sei lá como chamar, a isonomia federativa: todos […]
A presidente Dilma Rousseff se encontrou hoje com todos os governadores e prefeitos de capitais. Somavam-se ali milhões de votos. Ninguém apareceu no principal noticioso do país. Sabem como é: como é impossível ouvir 27 governadores e 26 prefeitos, então ninguém mostra a cara. Nesse caso, escolhe-se, sei lá como chamar, a isonomia federativa: todos os governadores são iguais: quem governa um estado com 42 milhões de habitantes e quem governa um com menos de 500 mil. É um critério.
Já em matéria de Mayara Vivian, aí a coisa é diferente. Embora não tenha sido eleita por ninguém; embora as ruas já estejam com uma agenda bem mais ampla do que a “tarifa zero”, a moça, tudo indica, se tornou uma referência do processo político brasileiro. É assim que entendi o fato de ter ganhado espaço no Jornal Nacional para defender a tal tarifa zero — “ou mais próxima disso”. Ah, bom!
Não que o Passe Livre tenha se encontrado com Dilma para ouvir alguma coisa. Ouvir pra quê? Foram lá para ensinar. Marcelo Hotimsky, este rapaz que vocês veem acima, tem 19 anos e estuda filosofia. Se ele ainda não domina todos os mestres do pensamento — ou melhor, os reles do pensamento —, uma coisa é certa: é um especialista em transporte. Por isso coube a ele fazer uma síntese da reunião com a presidente:
“Não ficamos satisfeitos, foi uma abertura de diálogo importante, mas vimos a Presidência completamente despreparada. Não apresentaram uma pauta concreta para mudar a realidade do transporte no país”.
É isso aí. A imprensa está coalhada de pensadores a saudar a falência da democracia representativa. O poema “Tabacaria”, de Fernando Pessoa (Álvaro de Campos), é um dos meus textos prediletos, em qualquer gênero. Encontro lá:
(…)
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
(…)
Fernando Pessoa não era de nada! Nestes dias, o mundo é, sim, para quem sonha que pode conquistá-lo, mesmo não tendo razão. É o que explica a Mayara Vivian no Jornal Nacional. É o que explica a fala doutoral do, como é mesmo?, Hotimsky. Esse é o filósofo que se negou a condenar os atos de vandalismo porque, disse ele, trata-se de “revolta popular”.
Pouco me importa o que dizem os especialistas os mais renomados e experimentados. Pouco me importa que demonstrem por A + B que a tarifa zero levaria o sistema de transportes ao colapso. Eu confio em Mayara Vivian. Eu confio em Hotmisky, o estudante de filosofia de 19 anos. Rimbaud revolucionou a poesia com 16, 17 anos. Ele revoluciona os transportes públicos com 19. É o Rimbaud da catraca.
Aliás, no caso de uma Constituinte exclusiva, conto com a dupla. Até porque eles já deixaram claro que o transporte público é só um instrumento de luta em favor da superação do capitalismo. E já anunciaram os próximos passos, na semana passada, também no Jornal Nacional: fim do latifúndio agrário e urbano. Finalmente a democracia está superando a necessidade de povo, eleitores, partidos, eleições… Pra quê?