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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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AS ELEIÇÕES NO IRÃ E AS ESPERANÇAS TOLAS

O texto abaixo foi publicado às 22h03 de ontem. Faço atualizações em azul: * Comentava ontem  com um amigo as estúpidas ilusões do Ocidente — não, na verdade, as estúpidas ilusões da imprensa ocidental — com as eleições no Irã. Há uma curiosa disjuntiva nesse universo politicamente correto que une academia e imprensa: de um lado, […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 17h27 - Publicado em 13 jun 2009, 07h23

O texto abaixo foi publicado às 22h03 de ontem. Faço atualizações em azul:
*
Comentava ontem  com um amigo as estúpidas ilusões do Ocidente — não, na verdade, as estúpidas ilusões da imprensa ocidental — com as eleições no Irã. Há uma curiosa disjuntiva nesse universo politicamente correto que une academia e imprensa: de um lado, a convicção de que as diferenças culturais devem ser respeitadas e de que não devemos ver “o outro” segundo os nossos padrões. O novo sacerdote desse ponto de vista, claro!, é Barack Obama. Ao mesmo tempo, há um esforço danado para analisar as eleições do Irã segundo os nossos padrões. Não sei se notaram, a tônica da cabertura foi esta: progressistas X conservadores. Parecia que as eleições no Irã mimetizavam as americanas: Mir Hossein Mousavi era tratado como o Obama deles: apoiado pelos jovens, pelas mulheres, com campanha forte na Internet… E Ahmadinejad, o tresloucado presidente atual, era visto, vamos dizer assim, como um reacionário republicano… Ai, meu Deus! Que tédio! Que bode! Como é aborrecido este “Espírito do Tempo” que se sobrepõe aos fatos, à realidade.

Antes que continue, uma observação óbvia. Eu também torcia para que Ahmadinejad, este candidato a besta do Apocalipse, fosse derrotado. Quando menos, um delinqüente explícito a menos no jogo político. Quando menos, ouviríamos menos bobagens. Mas será que Mousavi é mesmo aquele que o Ocidente gostaria que ele fosse? Estaria onde está se pensasse o que a imprensa ocidental e Barack Obama gostariam que pensasse?

Vamos ver: na “democracia iraniana”, que está mais para um fascismo islâmico de massas, os candidatos são submetidos a uma comissão que avalia a sua fidelidade aos princípios islâmicos e à revolução. Qualquer sinal de, digamos, “impureza”, a candidatura é vetada. Mousavi já foi governo. É que agora tirou o turbante e aparece em trajes ocidentais. Mas é, inequivocamente, um deles — embora mais culto e muito mas sofisticado do que o chicaneiro Ahmadinejad. O fato de que fale em negociação com o mundo ocidental e não assuma os extremos de anti-semitismo de seu principal oponente não faz dele um iluminista.

Ele nem mesmo representa uma ocorrência inédita. O mundo já tentou ver Muhammad Khatami, que presidiu o país entre 1997 e 2005, como o, vá lá, “iluminista persa”. De fato, a figura sempre foi doce, caroável até. Nem por isso, seu país deixou de financiar o Hezbollah e o Hamas. Enquanto presidiu o Irã, estava sendo aplainado o terreno em que um delinqüente como Ahmadinejad viria à luz. Mousavi é o Khatami da vez… Pelo visto, não deu certo.

Ainda olhando as eleições iranianas com os olhos com que se vêem as ocidentais, a vitória do “Obama do Irã” chegou a ser anunciada. E o que temos agora? Ou os prognósticos estavam estupidamente errados, ou se assiste a uma fraude eleitoral monumental. Com 61% dos votos, informa o New York Times, Ahmadinejad conta com 66% dos votos, e Mousavi, 31%. Se é assim, o maluco já está reeleito. E a razão é simples. Façamos uma conta com base 100:

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– em 100 votos, já foram apurados 61;
– destes 61, 40,26 (66%) são de Ahmadinejad, e 18,91 (31%) de Mousavi;
– falta apurar  39 votos;
– Mousavi precisaria ter 83% dos votos que ainda não foram apurados — para quem, até agora, teve só 31%…

[Com 80% dos votos apurados, Ahmadinejad tem 64% dos votos (18,8 milhões) contra 31% do rival (9,3 milhões). Não dá mais]

Vai dar? Acho que não… O “progressista” derrotado declarou vitória e ensaia, segundo li no NYT, acusar fraude. Mas certamente será contido pelo Conselho da Revolução Islâmica. E chegamos ao ponto.

É o conselho que manda no Irã, não o presidente. Por isso, nos oito anos em que o iluminista Khatami ficou no poder, o Irã, de fato, cuidou de desenvolver o seu programa nuclear — ou alguém acha que isso se fez nos quatro anos do maluco Ahmadinejad? A diferença entre este celerado e os “iluministas” é que o celerado fala o que pensa. Os outros escondem — como esconderam o seu programa nuclear.

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Observem: publico este texto daqui a pouco (agora, 21h59) e vou mantê-lo no ar ainda que algum milagre tipicamente persa, tipicamente iraniano, declare a vitória de Mousavi. Não muda nada! Ou até mudaria — e, a depender do caso, para pior: ele era a esperança do “Ocidente” (e “Ocidente”, com aspas, quer dizer “Barack Obama”) para não ter de endurecer com o Irã. Mousavi também defendeu o programa nuclear iraniano, mas ressaltando que é pacífico. Ahmadinejad também declara os bons propósitos — só que não esquece de prometer a destruição de Israel… Nesse particular, tanto faz se o presidente será um ou outro: quem manda mesmo é o Conselho da Revolução Islâmica, de que é chefe o aiatolá Ali Khamenei. “Ah, Reinaldo, mas pense num presidente que fosse mais tolerante, que abrisse mais o Irã para o Ocidente, que desse início a uma nova cultura”. É, pode ser… A era Khatami, reitero, foi muito instrutiva a respeito.

Bobagem obâmica
Obama procurou, oficialmente, ficar longe da disputa etc e tal. Mas ele, o Sabereta (como diria Monteiro Lobato da boneca Emília), padece daquela tentação de ter sempre uma opinião sobre qualquer assunto, a exemplo do nosso Apedeuta. E quem fala demais, Apedeuta ou Sabereta, acaba dando bom-dia a cavalo! O presidente americano fez o mundo saber que, segundo seu severo escrutínio intelectual, o povo iraniano teve a chance de escolher a mudança. Pelo visto, escolheu não mudar. E agora?

Sei que é chato e que pode parecer realmente um absurdo, mas devemos estar preparados para o fato de que, bem…, uma boa maioria dos iranianos possa realmente não gostar desse tal “Ocidente”. Neste meu texto, isso importa pouco. Ainda que Mousavi desse a volta por cima, isso só serviria para embalar esperanças inúteis.

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