
Enfim, o Supremo Tribunal Federal concluiu pelo veto às reeleições de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre para as presidências da Câmara e Senado, respectivamente. Uma vitória jurídica para Bolsonaro e derrota política para os dois parlamentares.
O resultado não garante a eleição de um nome da preferência do governo para a Câmara, no caso, do deputado Artur Lira. Antes, o sentimento de autonomia da gestão de Maia é fator que ainda tem influência sobre o Legislativo, que há muito não o experimentava.
Trata-se agora de uma disputa que determinará se o presidente Bolsonaro governará os dois anos que restam de seu mandato com alguma influência na Câmara ou se esta preservará o poder político demonstrado até aqui.
O que fica do episódio, no entanto, conspira contra o Supremo e contra o Congresso. O primeiro, porque teve cinco ministros com voto político em um resultado majoritário que deveria ser unânime.
O Congresso, por sua vez, manteve-se na linha de abdicar de sua soberania como um dos três poderes, ao se exibir incapaz de resolver internamente seus conflitos, terceirizando-os ao Judiciário.
Não deixa de ser uma das muitas consequências da fragmentação partidária – esta que teve prolongada sua sobrevivência exatamente por uma das mais nocivas interferências do Supremo Tribunal Federal no processo político.
O STF declarou inconstitucional a chamada cláusula de barreira aprovada em 1995 para vigorar a partir de 2006, quando foi derrubada. A regra determinava que os partidos com menos de 5% dos votos nacionais não teriam direito a representação parlamentar, nem ao fundo partidário.
Há mais de uma década o antídoto à pulverização partidária teria evitado o cenário atual em que proliferam legendas pessoais, não fosse a decisão que levou o então ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, à época, a acusar o Supremo de legislar.
Como as decisões do STF decorrem das demandas do próprio Legislativo não fica de pé a tese de que a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado é questão “interna corporis”, como alguns ministros chegaram a argumentar.
Para ser questão interna corporis, não poderia ter sido remetida ao STF como dúvida constitucional pelos próprios congressistas que, ao fazê-lo, abriram mão de prerrogativa exclusiva.
O STF, sugerindo gosto pelo poder adicional recebido, produziu um debate interno típico do Legislativo estendendo sua decisão por semanas, num suspense digno de Copa do Mundo.
Se o Legislativo quisesse, poderia ter providenciado uma PEC para remover o empecilho à reeleição, como sugeriu o ex-presidente Michel Temer, até porque essa proibição é obra do regime militar.
Não o fez porque certamente Maia preferiu não arriscar uma campanha antecipada de sua sucessão, que ocorreria se a emenda fosse rejeitada.
Casa política, o Congresso Nacional deveria ser o primeiro a zelar pelo princípio de que não se abdica de qualquer percentual de poder, sob pena de perdê-lo integralmente. Já o governo corre o risco da euforia precoce a partir da batalha jurídica que apenas excluiu aquele que elegeu como inimigo político. O que é pouco.
O que se tem pela frente é uma disputa política que determinará a força do Centrão, sob a liderança de Lira, para emplacar um presidente da Câmara aliado a um governo com um calvário à frente para sobreviver.
Nesse contexto, uma vitória do Centrão tende a ampliar a desconfiança dos agentes econômicos e a insegurança dos investidores que veem o bloco parlamentar como um “centro de custos”. É a turma do gasto no jargão do mercado.
A história ensina que quando os governos interferem no processo eleitoral do Congresso costumam sair chamuscados.
Independentemente da decisão do STF, o legado de afirmação do Poder Legislativo deixado por Maia é música aos ouvidos dos parlamentares. O que, entre outros benefícios, aumenta seu poder de barganha.
João Bosco Rabello escreve no https://capitalpolitico.com/