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Pode-se tirar o Presidente do ar? (por Joaquim Falcão)

Nos Estados Unidos, pode sim

Por Joaquim Falcão
Atualizado em 18 nov 2020, 19h44 - Publicado em 14 nov 2020, 11h00

Trump estava dando uma coletiva de imprensa no dia 05 de novembro, diretamente da Casa Branca. Afirmava ter tido fraude nas eleições. Mas não mostrava provas.

As redes de televisão aberta NBC, ABC e CBS, quase no mesmo instante, suspenderam a transmissão. Tiraram Trump do ar. Não queriam participar de um desserviço jornalístico.

Twitter também tirou Trump do ar.

E aqui no Brasil? Seria possível? Pode-se tirar Bolsonaro do ar? Quando? Como? Sob que condições? A Constituição permite? É factível?

A polêmica esta no ar.

Este talvez tenha sido o resultado mais importante das eleições americanas. Para o futuro da política e da democracia digital. Lá, e com repercussão no mundo inteiro.

Vamos analisar melhor o que ocorreu nos Estados Unidos. Que fatores teriam sido considerados para a crucial decisão de calar um presidente da República. Devem ter sido muitos. Cada um com seu peso.

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Primeiro. Trata-se da maior autoridade dos Estados Unidos, à qual se exige maior respeito. Inclusive por questões de segurança nacional.

Segundo. O pronunciamento, mesmo sendo na Casa Branca, foi como press conference, e não como pronunciamento oficial. Em princípio, teria fé pública. Mas não tem.

Terceiro. Foi no momento em que a credibilidade do sistema eleitoral, mais do que qualquer candidato, estava em jogo.

Quarto. As redes de televisão são privadas. A programação é de sua competência. Ninguém pode obrigá-las a veicular ou não veicular qualquer noticia.

Quinto. Houve uma coordenação prévia entre elas, o que diminuiu o risco da competição e aumentou a força da decisão.

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Sexto. Não agir poderia significar dano irreparável para a democracia.

Sétimo. O presidente Trump não entrou na justiça contra elas. Não alegou censura. Aceitou o fato.

Aqui no Brasil, as opiniões divergem. Alguns alegam que o bom jornalismo, ou mesmo as leis, exigiriam que se veiculasse a fala presidencial. Somente depois a TV informaria se tratar de opinião sem provas. Assim, se melhor protegeria a liberdade de imprensa, de comunicação. E a do próprio presidente.

Ou seja, retirar do ar o que já estava indo seria uma espécie de censura.

O pressuposto dos que defendem que não poderia ter acontecido é que o timing da notícia é neutro.  Tem igual impacto no telespectador. Ou seja, a notícia posterior tem impacto igual à notícia anterior.

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Não tem. Esperar acabar a fala de Trump seria correr o risco de veicular uma falsidade difícil de ser desfeita. Mobilizaria cidadãos, os apuradores e os partidos numa direção intencionalmente equivocada.

Na comunicação, o tempo, o timing, é quase tudo. Ou tudo. Notícia antes ou depois? A medalha de ouro de qualquer jornalista é o “furo”. Ganha quem deu a notícia antes de todos.

De resto, mentir é mais fácil do que desmentir. Aliás, para alguns, como sugeriu João Santana, no excelente programa Roda Viva com Vera Magalhães, mentir em tempos eleitorais é quase um prazer…

Se trouxermos esta análise para o Brasil, poderíamos observar o seguinte.

Já existe um semiprecedente parecido. As estatísticas da pandemia. As principais televisões concordaram num consórcio e divulgam antes seus números. Embora depois divulguem os oficiais. Mas não precisaria.

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Mesmo sendo concessões, a programação é de sua liberdade e responsabilidade. Dentro dos limites da lei, é claro.

Se for um pronunciamento oficial da Presidência ou de algum dos três poderes, dentro dos protocolos regulamentares, é claro que não se pode deixar de veicular ou tirar do ar.

Mas lives, opiniões,  discursos,  solenidades, nenhum meio de comunicação é obrigado a cobrir e veicular. Tanto que o Presidente dá entrevista apenas para quem quer.

Se, mesmo assim, houver algum acidente e retirarem o presidente do ar, o caminho no Estado Democrático de Direito da Presidência é ir ao Supremo. E não efetivar um ato de força de desconexão tecnológica.

Outro fator a considerar é que nos Estados Unidos houve uma coordenação entre as redes, e suspenderam por momentos a competição e entre elas.

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Aqui, como o sistema é muito mais plural, uma unanimidade das redes é quase impossível. O que não significa que, dado o share da audiência, a suspensão ano atingisse a imensa maioria dos telespectadores.

Esta medida, digamos, extrema das redes americanas coloca uma barreira as “fake news”. Sinaliza que os tempos mudaram.

Na ausência de regulamentação e controle judicial  efetivos, não somente os gigantes da mídia digital – Google, Twitter, Facebook etc. – mas a mídia tradicional, televisão e rádio, podem se juntar à própria imprensa e tomar medidas no âmbito de sua competências.

Não importa quem está falando.

A grande novidade a médio prazo é esta. E decisiva. Autoridades têm limites privados para abuso e uso das mídias sociais e tradicionais. Sobretudo em época eleitoral, ou seja, aqui no Brasil, em todos os anos. Ou quando a democracia venha estar claramente ameaçada.

Nesta sexta-feira, a CNN dos Estados Unidos interrompeu uma press conference com a presença de Trump e do vice-presidente Mike Pence porque estava fazendo propaganda sobre suas ações contra a pandemia. Esta questão tende a crescer no mundo inteiro.

Será este o caminho?

 

Texto do professor Joaquim Falcão

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