
Desde que o presidente Jair Bolsonaro se rendeu à evidência de que não se governa sem o Congresso Nacional, o país voltou ao “velho normal”, na contramão das profecias que tentam montar o cenário pós-pandemia. Melhor para o presidente, ainda que possa não ter mudado por virtude, mas por constatar que uma coisa é campanha e outra governar.
A política traz de volta os debates – alguns positivos, outros fisiológicos, mas melhor assim do que um governo fechado em si mesmo. É nesse contexto que está em curso a reprise do confronto entre os chamados “fiscalistas”, e os “desenvolvimentistas”, eufemismo para mais gastança e menos rigor fiscal, no país em que todo ano é ano eleitoral.
O que costuma guiar a decisão presidencial, por isso mesmo, é a reeleição, agora quase um consenso quanto ao seu papel de vírus político.
O conflito entre os ministros da Economia, Paulo Guedes, e o do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, não traz nada de novo. É “velho normal”, reprise dos governos Fernando Henrique, Lula e Dilma, para ficar na história recente. Assim como o enredo político que se desenvolve entre as forças políticas representadas no Legislativo.
No primeiro mandato de FHC, José Serra (Planejamento), dado por desenvolvimentista, e Pedro Malan (Fazenda) protagonizaram o confronto prevalecendo a linha do segundo até que Serra deixasse o governo para concorrer à prefeitura de São Paulo. Derrotado, retornou ao Senado para voltar ao governo no segundo mandato presidencial como ministro da Saúde.
Ali, contudo, o debate se dava em um ambiente virtuoso, longe da disputa eleitoral, tendo como pano de fundo um bem sucedido plano econômico que fez a inflação acumulada de 4923% cair para 33%. E catapultou o candidato Fernando Henrique dos 12% nas pesquisas para a vitória no primeiro turno.
No governo Lula, o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, que dava continuidade ao programa econômico herdado, foi diariamente assediado pelo “fogo amigo” – a corrente do PT que conspirava para substituir o Plano Real pela chamada Nova Matriz Econômica, até deixar o cargo em 2006.
Finalmente na gestão de Dilma Rousseff, os protagonistas do mesmo filme foram Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento), com o primeiro sendo descartado.
Guedes x Marinho
O que se depreende dessa rápida memória é que o conflito produz um vencido e um vencedor, não necessariamente por um critério saudável. No momento, aparentemente todos os personagens do velho enredo se pautam por conveniências que recomendam administrar a crise.
Ao presidente Bolsonaro ainda convém manter Guedes como sinalização ao mercado para não agravar o dano já causado pela instabilidade econômica. Ao mesmo tempo, precisa ter em Rogério Marinho o contraponto que mantenha de pé a expectativa de realizações com os cofres vazios – de resto um malabarismo que garanta a reeleição.
O presidente ainda precisa administrar o descontentamento de eleitores e aliados com o abraço no Centrão e a nomeação do sucessor de Celso de Mello no Supremo Tribunal Federal, um perfil “garantista” que substituiu o “terrivelmente evangélico”. Ao responder a cobranças do seu eleitor, Bolsonaro se justificou dizendo que precisa governar. Está certo – e para isso precisa afastar os riscos jurídicos que rondam seu mandato e os dos filhos, interesse que harmonizam com os alvos da Lava Jato, cujos métodos estão em xeque.
Tudo volta ao seu velho leito.
João Bosco Rabello esvrene no https://capitalpolitico.com/