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O risco tem nome, e é Jair Bolsonaro

Alguém imaginava, há tempos, estar discutindo na campanha de 2018 avanços civilizatórios dados como garantidos?

Por Helena Chagas
Atualizado em 30 jul 2020, 20h18 - Publicado em 27 set 2018, 14h00

O clima anda tão pesado que às vezes imagino estar, em poucos anos, vivendo na série “O Conto da Aia”, baseada na obra de Margaret Atwood. Situado em futuro não muito distante, no que teria sido os Estados Unidos, o enredo mostra uma sociedade distópica, misto de ditadura militar com república fundamentalista religiosa. Destaca-se a situação das mulheres, sempre aias, empregadas, esposas proibidas de trabalhar, de ter conta em banco ou sair de casa. O mais assustador é que as personagens femininas um dia foram como nós – executivas, cientistas, professoras, profissionais que, com as mudanças naquela sociedade, foram perdendo os direitos e o espaço. Isso é mostrado aos poucos, em flashbacks, tornando o seriado mais aterrorizante.

É um pesadelo particular, e é sempre melhor pensar que não sairá do plano da ficção. Mas a realidade anda metendo medo. Estão dando nos nervos, por exemplo, seguidas declarações de autoridades da República de que a democracia não corre riscos, que assume quem ganhar as eleições, que a Constituição garante, as Forças Armadas garantem, o Supremo garante, etc. Do presidente do STF, Dias Toffoli, ao da República, Michel Temer, passando por Luís Roberto Barroso e pelo general Luna e Silva, todo mundo ensaiadinho.

Será que, se não houvesse risco – ou, ao menos, preocupação com a possibilidade de haver risco – estariam falando no assunto?

Pois é. Alguém imaginava, há tempos, estar discutindo na campanha de 2018 avanços civilizatórios dados como garantidos? Não. Estamos retornando a campos de batalhas consideradas vencidas, retomando bandeiras como os direitos das mulheres, o repúdio à tortura e à ditadura militar, a luta contra o armamento da população e os preconceitos por opção sexual, etc. Voltamos a uma inacreditável agenda regressiva, que inclui até propostas de militarização das escolas, de elaboração de uma Constituição sem Congresso, e, quem sabe, um hipotético “autogolpe” militar…

Não há sinais mais claros de que o risco existe. Só que às vezes apresentado de forma enviesada e escamoteada – o que só faz duplicar o perigo. Como nas declarações das autoridades em defesa da democracia que não citam nomes e passam longe de tocar na origem dos temores. Ou nos editoriais e artigos que falam dos riscos à democracia a partir da “polarização” entre os dois candidatos mais bem colocados nas pesquisas.

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Vamos falar a verdade: o risco de retrocesso democrático tem nome, e é Jair Bolsonaro. Não há lógica, nem boa fé, em espetar essa conta na hipótese de retorno ao poder de quem já governou por 13 anos, respeitando o Estado de Direito e até aperfeiçoando, com leis e medidas, por exemplo, as instituições responsáveis pelo combate à corrupção.

Pode-se dizer qualquer coisa do PT – e, sim, há muitas coisas ruins a dizer – menos que, no poder, terá flertado com saídas antidemocráticas. Lula governou oito anos e saiu com alta popularidade, recusando propostas públicas de aliados para alterar a Constituição e permitir mais uma reeleição – instituto, aliás, criado durante o governo do tucano que foi o primeiro a se beneficiar dele.

Não se pode tampouco, sem constrangimentos, confundir ação judicial e retórica política – o tal juris esperniandis – com desrespeito ao Judiciário e a regras da democracia. Basta lembrar onde está o sujeito que, segundo adversários, ia fugir e pedir asilo intenacional: na cadeia, em Curitiba, cumprindo a pena decretada pela Justiça.

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Se, de lá, ele for capaz de ganhar a eleição, são outros quinhentos. Não dá para botar a culpa na democracia e nem dizer que ela estará em risco.

 

Helena Chagas é jornalista desde 1983. Exerceu funções de repórter, colunista e direção em O Globo, Estado de S.Paulo, SBT e TV Brasil. Foi ministra chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (2011-2014). Hoje é consultora de comunicação

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