Como acreditar no que o general Eduardo Pazuello, ministro da Saúde, disser ou fizer doravante? Se tivesse o mínimo de preocupação com a sua e a imagem dos colegas de caserna, pediria demissão depois de desautorizado pelo presidente Jair Bolsonaro no caso da compra da vacina chinesa contra a Covid-19.
Mas, não. Infectado pelo vírus, recolhido ao hotel do Exército em Brasília, onde mora, Pazuello foi acordado, ontem à tarde, para receber a visita de Bolsonaro. E foi constrangido a gravar uma parte de sua conversa com ele onde afirmou: “É simples assim, um manda e outro obedece. Mas a gente tem carinho”.
Vexame, vexame, vexame! Onde já se viu um general render-se a um capitão? Ou melhor: a um ex-capitão? Tudo bem, o ex-capitão é hoje o presidente da República, e o general ainda na ativa, seu vassalo. De toda forma, pegou muito mal para ele entre seus colegas de farda. Primeiro foi desautorizado. Depois, humilhou-se.
No último fim de semana, Pazuello havia combinado com Bolsonaro no Palácio da Alvorada o que diria quando se reunisse com os governadores para discutir a compra de vacinas. E cumpriu o combinado ao anunciar:
“A vacina do Butantan será a vacina brasileira. Já fizemos carta em resposta ao ofício do Butantan, e essa carta é o compromisso da aquisição das vacinas que serão fabricadas até o início de janeiro, em torno de 46 milhões de doses, e essas vacinas servirão para nós iniciarmos a vacinação ainda em janeiro. Essa é a nossa grande novidade e isso reequilibra o processo”.
Aí, o governador João Doria (PSDB), de São Paulo, o padrinho da vacina chinesa no Brasil, celebrou o anúncio nas redes sociais e por toda parte. Aí, no dia seguinte, os bolsonaristas de raiz foram para cima de Bolsonaro nas redes. Aí, furioso e a conselho dos três filhos zeros, Bolsonaro deixou Pazuello pendurado na brocha.
Militares próximos ao presidente, e militares da reserva ficaram indignados com o episódio. Inicialmente, com o que Bolsonaro fez. Ontem, com o que fez também Pazuello. Até porque a vacina chinesa, ainda em fase de teste como as demais, se aprovada acabará sendo comprada. Doria continua rindo à toa.
Essa parada foi ganha por ele, que mais e mais se oferece como o candidato capaz de derrotar Bolsonaro em 2022. Cerca de 70% dos brasileiros se dizem dispostos a se vacinar, segundo pesquisa Datafolha. E parte deles começa a ver Bolsonaro como inimigo de tudo o que possa salvar vidas.
Em tempo: Pazuello revelou que está sendo tratado com cloroquina. Bolsonaro ficou muito satisfeito com o que ouviu.