De tédio jamais morreremos nos próximos três anos e sete meses. O governo mais acidental e conflituoso de todas as épocas desrespeita a trégua que deveria se dar, e também ao país, pelo menos nos fins de semana. Em tempos idos, a sexta-feira era o dia do boato. E a segunda-feira, de feriado bancário para o anúncio de medidas econômicas extraordinárias.
Agora, qualquer dia é dia de conflito interno no governo, sem esquecer os externos alimentados diretamente por ele que não sabe viver em paz. Em entrevista à VEJA, o ministro Paulo Guedes, da Economia, admitiu pedir as contas se o Congresso aprovar “uma reforminha” ao invés da robusta e ambiciosa reforma da Previdência desejada por ele e capaz de abrir as portas para um mundo novo.
De Pernambuco, onde se encontrava durante sua primeira visita ao Nordeste depois de empossado, o presidente Jair Bolsonaro respondeu de bate pronto: “Ele está no seu direito [de ir embora]. Ninguém é obrigado a continuar ministro meu”. Haveria espetáculo mais atraente do que um duelo ao por do sol entre dois velhos pistoleiros ligados pelo mesmo destino?
O temperamento irascível liga Bolsonaro a Guedes. O gosto por uma polêmica, também. Igualmente a disposição que eles têm para o uso da retórica como arma letal. Em linguagem das redes sociais, Guedes tentou lacrar Bolsonaro, que revidou tentando lacrar Guedes. E antes que esqueçamos, é bom lembrar que os dois estão do mesmo lado. Deveriam marchar no mesmo passo.
Guedes, diante do primeiro revide de Bolsonaro, fez questão de repetir o que também dissera na entrevista. Não, ele não é um homem irresponsável. Não, ele não deixará o cargo por qualquer motivo. Não isso, não aquilo. O Ministério da Economia apressou-se a distribuir uma nota para abortar mais uma crise capaz de abalar o governo. Ou de pô-lo abaixo, no extremo.
Aconselhado por assessores, Bolsonaro passou o resto do dia demolindo sua própria declaração inicial. Não, se Guedes quiser sair deve ser para ir a uma praia (kkkkkkkkkk). Não, Guedes está certo quando alerta para o perigo de o Congresso aprovar uma reforma do tamanho de “pinto de japonês” (kkkkkkkkkkkkkk). O casamento dos dois é forte e seguro, taokey?
A verdade é que Guedes está irritado com Bolsonaro e desesperado com a falta de articulação política do governo. Sente-se praticamente só à frente da batalha para que a reforma da Previdência acabe aprovada. E, pior, à frente de tropa nenhuma. Talvez de um arremedo de destacamento mal treinado e sem disciplina para a tarefa a se que propõe.
O ministro aproveitou a entrevista para dar um abatimento na reforma pretendida. Ela deveria representar uma economia de 1 trilhão e duzentos milhões de reais. Guedes baixou para 800 bilhões. Ora, ora, ora… Guedes piscou primeiro. Se ele baixa para 800 bilhões, aceitará um pouco menos. Quem sabe 600 bilhões e não se fala mais nisso?