Nada está tão ruim no Brasil que não possa piorar. Pela primeira vez na nossa história (recente, pelo menos), não são os políticos que estão dando as cartas das eleições majoritárias de outubro. Perderam a bola para o poder judiciário. Quem está ditando regras para as eleições são juízes das mais diferentes instâncias. Das varas aos tribunais, ao STJ, TSE e Supremo.
A judicialização da política tem risco de epidemia. Só não é pior porque o cenário composto pelos candidatos, é ainda mais dramático. Se já temos medo do presente, as possibilidades de candidatos que se mostram medianamente viáveis, dão frio na espinha. Dá medo do futuro.
Sem dúvida, “a Lava Jato revelou o grau de promiscuidade de parte da nossa classe política, mas isso não pode servir de pretexto para que o direito substitua a política”, diz a doutora em Direitos Humanos pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e mestre em Política Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Eloisa Machado. Ela enxerga na interferência do Judiciário perigo iminente de crise institucional e riscos à democracia.
Claro, todos os casos de corrupção devem ser investigados e devidamente punidos, diz a professora. Mas daí a permitir que o judiciário escolha quem governa e quem pode ser eleito vai distância considerável. Hoje, políticos correm atrás da agenda de moralização da política tocada por juizes e tribunais, campanha perniciosa para o ambiente democrático.
A interferência do Judiciário é tamanha que o ministro Gilmar Mendes teria dito que Lula só sairá da cadeia – ou terá sua pena reduzida pelo STF – se renunciar à candidatura à presidência da República. Faz sentido e deve ser verdade a profecia do ministro. Define-se assim não a punição de quem supostamente teria cometido “mal feitos” mas a permissão pelo Judiciário para que uma candidatura exista. Ou não exista.
Dos candidatos que começam a ganhar musculatura para outubro, a popularidade hoje registrada vem justamente do STF: o ex-presidente da Corte, Joaquim Barbosa. Se tiver bom desempenho eleitoral, Barbosa será reflexo do movimento que endemoniza a política e a escancara como algo sujo, intrinsecamente corrupta, onde até ações políticas são vistas como criminosas.
Vem daí a fabricação de super heróis, todos ou quase todos do Judiciário. E a tentação de substituir a via da política pelo discurso fácil e moralista dos evangelizadores da Pátria. Movimento encampado naturalmente pelo Ministério Público, Procuradores, Policia Federal…
Joaquim Barbosa precisa se posicionar, dizer o que pensa, o que pretende para o país, como vê as reformas em andamento. Sem isso, nada feito. Nem ele, nem Sergio Moro, juiz da Lava Jato, poderiam salvar o Brasil apenas combatendo a corrupção. Precisam tirar a toga, botar a cara a tapa e se jogar na estrada. Combater a corrupção é inadiável, mas as eleições estão ai e o Brasil precisa de candidatos de carne e osso, com os pés fincados na politica. Políticos na melhor dimensão da palavra. Sem judicialização. Políticos. Fazendo política, como ela é.
Mirian Guaraciaba é jornalista, paulista, brasiliense de coração, apaixonada pelo Rio de Janeiro