Nos dias de hoje, há uma sensação se colapso no ar. Não apenas por causa de represas rompidas, ruas inundadas, prédios tombados, mas também pelo sentimento de desgoverno provocado por partidos desmiolados, corporações insanas, governo destrambelhado, judiciário esquizofrênico e ostentatório no meio da pobreza persistente, economia em resistente recessão, filas imensas de desempregados, feminicidios diários e muitos outros sintomas de caos. Mas este colapso é histórico, vem de séculos de uma sociedade sem liga.
Nascemos ocupando um território deste lado, mas olhando para o outro lado do Atlântico. Não fizemos escolas e ainda menos universidades até diversos seculos depois da ocupação. Avançamos destruindo índios e explorando negros. Tropeçamos há cinco seculos nas divisões de grupos, classes, raças, regiões, sem um projeto comum sem perspectiva para o futuro: sem coesão nem rumo. Progressamos colapsando como um edifício sem alicerce nem estrutura.
Ocupamos o território, mas não montamos as necessárias redes de ocupação eficiente; criamos um sistema escolar, inclusive universitário, mas não demos substância educacional; nos transformamos em uma das maiores economias do mundo, mas concentrando a renda social e, sem produtividade, não avançamos na renda per capita.
No meio deste colapso, o governo corta recursos para a universidade, provocando o desabamento do que foi realizado até aqui.
Será uma tragédia se estes cortes levarem ao colapso das universidades, mas será uma tragédia também se não percebermos que que antes mesmo das malditas decisões do atual governo, nosso sistema universitário já vem colapsando, menos por falta de recursos financeiros e mais por falta do fundamental recurso de toda universidade: seu aluno vindo do Ensino Médio. Ainda bem que a universidade desperta e luta contra o colapso da falta de recursos, mas pena que não perceba nem lute contra a maior de suas tragedias: o colapso da falta de alicerce por causa do desprezo à educação de base.
Cristovam Buarque é ex-senador