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Bolsonaro está conseguindo reabilitar a política (por Helena Chagas)

Ganhos para os poderes que trabalham para contê-lo

Por Helena Chagas
Atualizado em 30 jul 2020, 18h51 - Publicado em 18 jun 2020, 11h00

O desgaste na imagem dos militares depois de um ano e meio de governo Bolsonaro era previsível diante da lambança em que se transformou a atual gestão. A pesquisa do Estudo do Instituto da Democracia (UFMG, Iesp/UERJ, Unicamp e UnB) que apontou queda de sete pontos no grau de confiança nas Forças Armadas entre 2018 e 2020 (33,9% para 27%) e um claro aumento da rejeição a um golpe militar (de 46,4% para 65,2%) permite ainda uma leitura mais ampla de mudanças na percepção da população que devem ser determinantes na agenda política e nas eleições de 2022.

Embora incipientes, há sinais de que, junto com o prestígio dos militares e a popularidade de Jair Bolsonaro, vai-se também o discurso da “nova política” que elegeu o presidente e um punhado de governadores de estado. A pesquisa “A cara da democracia”, feita anualmente, mostra certa recuperação na imagem de instituições que, em 2018, sob o impacto da Lava Jato, eram pessimamente avaliadas, como o Congresso e os partidos. Não que estejam superpopulares, mas a taxa dos que dizem não confiar no Congresso caiu de 56,3% para 37,2%.

Talvez diante da inépcia e das crises geradas pelo governo, as instituições da “velha política” parecem estar num caminho de reabilitação. Os partidos, sempre na rabeira do ranking, ainda são vistos com desconfiança por 66,9% – mas isso é dez pontos a menos do que há dois anos. Os que confiam “um pouco” neles subiram de 12,3% para 20,5%.

Também o Judiciário tem melhor avaliação. De 2018 para 2019, primeiro ano do governo em que as instituições começaram a ser abertamente atacadas pelos bolsonaristas, o percentual dos que diziam não confiar no poder havia subido de 33,9% para 38,2%. As ações do STF ao longo da pandemia, e a exacerbação dos ataques, agora claramente relacionados a investigações sobre a família e os aliados do presidente, parecem ter levado a rejeição a recuar para 21%. Os que confiam muito no Judiciário subiram de 8,3% para 13,6%, e os que confiam “mais ou menos”, de 28% para 39,4%.

Os últimos meses da pandemia do coronavírus, e as ações dos agentes políticos diante dela, parecem ter tido peso decisivo para a aparente virada no rumo dos ventos. Enquanto o Legislativo aprovava com celeridade projetos para mitigar os efeitos da Covid-19 e o Judiciário – em especial o STF – tomava decisões para barrar a insensatez da suspensão de medidas de proteção contra a “gripezinha”, o presidente da República negava a gravidade da pandemia. É um enredo ainda em curso, e apenas o futuro dirá qual terá sido seu impacto nessas instituições. Pelo andar da carruagem, porém, é possível supor um reforço da tendência de desgaste de Bolsonaro, e de ganhos para os poderes que trabalham para contê-lo.

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Ainda é cedo para avaliar a dimensão do fenômeno, mas tudo indica que o discurso que elegeu Bolsonaro, puxado pela anticorrupção e pela antipolítica, dará lugar a uma agenda bem diversa. Possivelmente, temas como a reconstrução do país no pós-pandemia, geração de empregos e distribuição de renda, terão mais importância do que a esgotada temática da corrupção – até porque o próprio Bolsonaro deu sua contribuição para desmoralizá-la.

A percepção de que a chamada “nova política” era, com raríssimas exceções, uma balela que serviu para eleger, mas não para governar, também poderá ser fator importante. 2022 será de quem souber captar o novo humor e construir um discurso honesto e consistente em cima dele.

Helena Chagas é jornalista

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