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A chanchada da Renda Cidadã

O arranjo defendido por Bolsonaro e Paulo Guedes é apenas uma coleção de remendos de baixíssima qualidade

Por Ricardo Noblat
Atualizado em 18 nov 2020, 19h56 - Publicado em 30 set 2020, 13h00

Editorial de O Estado de S. Paulo (30/9/2020)

Calote, pedalada, burla, drible e contabilidade criativa foram algumas das palavras mais ouvidas, no mercado, quando se anunciou a fórmula escolhida para financiar a Renda Cidadã, a nova bandeira eleitoral do presidente Jair Bolsonaro. A imprensa também registrou avaliações como “calote temporário” e “medida estarrecedora”. Conhecida a proposta, o dólar chegou a R$ 5,67, um novo recorde, revertido quando o Banco Central entrou no jogo vendendo moeda americana. A Bolsa deixou a coreografia internacional e encerrou o dia com um tombo de 2,41%.

A proposta assustadora foi anunciada depois de uma reunião do presidente, no Palácio da Alvorada, com parlamentares aliados e ministros, incluído o da Economia, Paulo Guedes. O apoio de Guedes ao esquema demonstra a função real, no atual governo, de um Ministério para assuntos econômicos: cumprir ordens, sem levar em conta prioridade, conveniência econômica e financeira e até critérios de responsabilidade fiscal.

A fórmula para acomodar o novo programa social, substituto do Bolsa Família, é uma combinação perversa de dois truques. Em primeiro lugar, pagamentos previstos de precatórios podem ser limitados, isto é, reduzidos. Em segundo, uma parcela do Fundeb poderá ser convertida em Renda Cidadã. Este componente, se aceito, pode proporcionar uma vantagem especial, por ser isento do teto de gastos. O teto limita o aumento da despesa à inflação tomada como baliza da lei orçamentária.

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Calote ou ameaça de calote, a ideia de reduzir o pagamento de precatórios foi criticada pelo ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União, por políticos, por investidores do mercado e por especialistas em contas públicas. Precatórios correspondem a dívidas do governo reconhecidas pela Justiça. São obrigações financeiras vinculadas a ordens judiciais. Limitar seu pagamento corresponde, em primeiro lugar, a uma escolha de quem terá prioridade no ressarcimento. Isso envolve questões de decência. Envolve também problemas de legalidade.

A questão da moralidade é evidente, mas adiar o pagamento, nesse caso, pode ser também um crime de responsabilidade, análogo às pedaladas do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, como observou o economista Carlos Kawall, diretor da Asa Investments e ex-secretário do Tesouro Nacional. No caso da presidente petista, a violação da lei motivou um processo político encerrado com impeachment, isto é, com perda do cargo.

Igualmente indefensável é o uso de recursos do Fundeb para financiar a Renda Cidadã. A tentativa de usar esse fundo para burlar o teto de gastos já havia sido rejeitada pelo Congresso. Além da manobra para romper o limite, haveria um claro desvio de finalidade de uma importante fonte de financiamento educacional. Mas a fórmula envolve outras importantes questões legais.

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Para criar um gasto permanente, o poder público deve encontrar uma fonte permanente de receita ou eliminar, também de forma duradoura, alguma despesa de montante compatível com a nova necessidade. Nenhuma dessas condições se verifica. Adiar o pagamento de precatórios apenas empurra a despesa com a barriga, sem eliminá-la, como observa o diretor executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto. É fácil perceber esse fato mesmo sem o auxílio de um especialista em contas públicas.

Meter a mão no Fundeb também pode proporcionar apenas uma solução temporária, fora do padrão da Lei de Responsabilidade Fiscal. O arranjo defendido pelo presidente, por seus aliados e pelo ministro da Economia é apenas uma coleção de remendos de baixíssima qualidade, digna de malandragens das velhas chanchadas.

Chanchadas, no entanto, podiam ser divertidas, eram inofensivas e envolviam competência técnica e artística. Nenhuma dessas qualidades aparece na fórmula para financiar a bandeira eleitoral do presidente Bolsonaro. “O Brasil é um país sério”, disse o ministro Guedes, tentando defender o indefensável. Seria bom se o Executivo também mostrasse alguma seriedade ao cuidar da economia e do dinheiro público.

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