Coordenador da Funai deu expediente após nomeação ser anulada pela Justiça
Responsável por área de índios isolados teve designação suspensa pelo TRF-1, mas denúncia foi enviada ao MPF apontando que missionário trabalhou no órgão
Mesmo com a nomeação anulada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), o antropólogo e missionário Ricardo Lopes Dias continuou dando expediente na Fundação Nacional do Índio (Funai) como Coordenador-Geral de Índios Isolados e Recém Contatados.
A denúncia foi feita à coluna por servidores da Funai. Segundo eles, Ricardo Dias permaneceu indo despachar na coordenação, inclusive de forma presencial, numa escala de revezamento realizada no órgão em meio à pandemia. Outra denúncia sobre o desrespeito à decisão judicial foi enviada ao Ministério Público Federal (MPF), segundo informado por investigadores do órgão.
Procurada pela coluna, a Funai não negou que o antropólogo continue atuando normalmente, e informou apenas que “cumprirá a decisão do TRF-1 tão logo seja intimada oficialmente” (saiba mais abaixo).
Ocorre que pesquisa no site do TRF-1 indica que a intimação foi realizada no dia 21 de maio e a resposta da Funai à coluna foi dada nesta quarta-feira, 27. Ao ser confrontada com o documento que confirma a intimação, a Funai n��o respondeu.
Entenda o caso
A decisão do TRF-1 de anular a nomeação de Ricardo Lopes Dias aconteceu em recurso impetrado pelo MPF na corte, após a 6ª Vara Federal do Distrito Federal manter a designação do pastor Ricardo Lopes Dias ao cargo.
A designação de Ricardo, em fevereiro deste ano, sempre gerou repúdio entre servidores e técnicos da Funai por causa dos objetivos religiosos que ele teria em relação aos índios.
O antropólogo é formado em teologia e atuou como missionário na Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB), organização que prega a evangelização de indígenas na Amazônia. Processos na Justiça aos quais a MNTB responde informam que o instituto “camufla” seus objetivos religiosos nas aldeias com ações de assistência.
Para o MPF, que contestou a nomeação do missionário para o cargo, há grave risco de genocídio em caso de reversão da política brasileira de não forçar o contato com povos em isolamento voluntário, consolidada a partir de 1987. Nesta época, se iniciou a ideia atual de “zero encontro”, para garantir autonomia dos índios isolados.
O que diz a Funai
A Funai já contestou a decisão que anulou a nomeação de Ricardo Lopes Dias para o posto. “A decisão parte da fantasiosa conclusão de que ex-missionários evangélicos, ocupando o cargo, podem mudar a política de isolamento voluntário dos indígenas menos integrados do país”, afirmou o órgão.
“Em resposta a sua demanda sobre a anulação judicial da Portaria que nomeou Ricardo Dias para a Coordenação de Índios Isolados e de Recente Contato da Funai – CGIIRC, a Fundação Nacional do Índio informa que cumprirá a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) tão logo seja intimada oficialmente”, disse à Funai para a coluna ao ser questionada sobre o desrespeito à decisão judicial.
Atualização: nesta segunda-feira, dia 1º de junho, a Funai soltou uma nota para contestar a coluna, mas em nenhum momento nega que Ricardo Lopes Dias tenha dado expediente após ser afastado. Diz apenas que começou a tomar as providências burocráticas para o cumprimento da decisão judicial. Antes da publicação da reportagem, a Funai foi procurada pela coluna, dando-se ao órgão o direito de contestar a informação.