Na crise, Centrão debateu o impeachment de Bolsonaro
Reação esvaneceu com a carta-rendição. No Congresso, agora paira a desconfiança. E no Centrão, a certeza de que, para Bolsonaro, nada será como antes
O impeachment de Jair Bolsonaro foi uma possibilidade real durante 48 horas da semana passada. Líderes de partidos políticos que detêm a maioria dos votos na Câmara e no Senado, entre eles os do Centrão, esteio parlamentar do governo, discutiram a abertura do ritual no Congresso com ex-presidentes, governadores, juízes de tribunais superiores e oficiais das Forças Armadas.
A discussão avançou partir das 16h30 do Dia da Independência, na sequência do comício na Avenida Paulista em que Bolsonaro anunciou desobediência às ordens judiciais assinadas por “canalhas” do Supremo Tribunal Federal. Terminou na tarde de quinta-feira com a carta de rendição escrita com a ajuda do ex-presidente Michel Temer.
O que aconteceu naquelas 48 horas é desafio para historiadores, mas Gilberto Kassab, presidente do PSD, partido do Centrão com 35 deputados e 9 senadores, pincelou o clima num evento do banco BTG Pactual.
“Até dia 7 de setembro”, contou, “o presidente tinha uma base sólida e na presidência da Câmara um aliado importante, o deputado Arthur Lira [do PP de Alagoas]. A base do governo tinha, no mínimo, 200 parlamentares. Com a manifestação que ele fez, iniciou-se rapidamente, inclusive com apoio do PSD, partido que eu presido, um movimento pelo impeachment.”
“Foi algo muito acelerado”, prosseguiu, “por conta de um presidente que disse que não ia mais aceitar decisões judiciais. Portanto, ele caminhava para uma ilegalidade. Existia, também, a suposição de que o governo, ou o próprio presidente, poderia estar ajudando na organização da greve dos caminhoneiros, associado a diversas outras manifestações importantes, de outras lideranças, no campo governista mais radical.”
Kassab acha que Bolsonaro percebeu “o equívoco”, como definiu, ainda na noite de terça-feira. Ao voltar a Brasília constatou que o apoio do Centrão desmoronava: “Sua base de governo [ruía] nos bastidores — porque a queda de um governo sempre começa nos bastidores —, [com] parlamentares registrando expressões como ‘Que fria em que nós estamos’, e, ‘E agora?’. Então, existia um clima de impeachment.”
Impressionou-o a velocidade da ruína: “Aconteceu. Eu participei de várias conversas, fui procurado por várias lideranças políticas, inclusive militares, todas manifestando muita preocupação.”
Bolsonaro salvou-se no recuo, negociado por Temer: “Quando a carta foi assinada e divulgada, desapareceu o fato concreto”, relatou Kassab, em versão idêntica à de líderes da base governista no Congresso.
O impeachment esvaneceu. No Congresso, agora paira a desconfiança. E no Centrão, predomina a certeza de que, para Bolsonaro, nada será como antes.