Série ‘The Nevers’, da HBO, mostra dilemas de superheroínas vitorianas
De maneira envolvente, ainda que irregular, a produção reedita tema constante da cultura pop deste século — a euforia e o fardo de possuir poderes especiais
Um objeto de origem ignorada cruza o céu de Londres em um dia do fim do século XIX, e as partículas que se desprendem dele fazem germinar nas mulheres — e em alguns poucos homens — habilidades estranhas. Algumas são surpreendentes, como os lampejos que a viúva Amalia True (a excelente Laura Donnelly) às vezes tem do futuro, ou o dom de sua amiga inventora Penance Adair (a encantadora Ann Skelly) de enxergar o fluxo da eletricidade. Outras são desconcertantes: há a menina que não controla os idiomas em que fala, a jovem que transforma qualquer coisa em vidro. E outras mais são decididamente perigosas — caso da maneira como Bonfire Annie (Rochelle Neil) conjura fogo, ou da força e compulsão da ex-paciente psiquiátrica Maladie (Amy Manson) para matar. The Nevers (Inglaterra, 2021), série da HBO que estreia neste domingo, 11, reedita assim de modo envolvente, ainda que irregular, o tema mais constante na cultura pop deste século: o dos poderes especiais que ao mesmo tempo alijam quem os tem e provocam temor e cobiça em quem não os possui. Olhando-se por qualquer ângulo, a conclusão é a mesma — só uma sensação muito pervasiva de impotência e fragilidade pode produzir tamanha fixação.
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E nenhuma época encapsula tão bem a ideia de vulnerabilidade quanto a era vitoriana — uma era de transformações velozes, de riqueza crescente contraposta à miséria, de ciência e de obsessão pelo oculto. É em um orfanato financiado por uma ricaça que Amalia e Penance recolhem as crianças e adultos “tocados” — mas qualquer equilíbrio que elas tenham conseguido forjar ali está rapidamente se desfazendo. Desde o protagonismo do bando de desajustados, The Nevers tem todas as marcas de seu criador e diretor de três dos seis episódios, o Joss Whedon de Buffy e dos dois primeiros Vingadores. Em ironia flagrante, ele foi afastado de sua criação: conforme uma série de denúncias recentes por comportamento “não apropriado”, não há jovem atriz que, estando no mesmo recinto que ele, não se encontre em situação potencialmente vulnerável.
Publicado em VEJA de 14 de abril de 2021, edição nº 2733
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