O belo Raya e o Último Dragão, nova animação da Disney, exorciza era Trump
Na trama do longa deslumbrante, uma jovem asiática procura quem possa ajudá-la a remendar um reino partido
Kumandra foi, um dia, um rico e vasto reino. Mas, como costuma acontecer nas fábulas, uma força destruidora o arrasou. Os maléficos Druun, capazes de transformar em pedra tudo o que é vivo, só foram derrotados graças aos dragões, que deram a vida na batalha. Cinco séculos depois, porém, os traumas da tragédia perduram. O reino se partiu nas falanges de Coração, Garra, Cauda, Coluna e Presa, inimigas entre si e, sobretudo, invejosas de Coração, que tem sob sua guarda a gema mágica que contém o espírito dos seres alados. Por causa da cobiça e de uma traição, a gema se quebra, os Druun se libertam e novamente arrasam essa terra de fantasia inspirada nas tradições dos países do Sudeste Asiático e evocada com visual deslumbrante em Raya e o Último Dragão (Raya and the Last Dragon, Estados Unidos, 2021), que está disponível para compra na Disney+ por R$ 69,90 até 19 de março, depois apenas para aluguel e finalmente, a partir de 23 de abril, de forma gratuita para assinantes da plataforma.
Agora faz seis anos que Raya, a última guardiã da gema mágica, procura os cacos dela, na esperança de entregá-los a Sisu, o único dragão (na verdade, dragã) ainda existente, e que há 500 anos ninguém avista. Mas Sisu, afinal, não é bem o que Raya imagina: em vez de intimidar, ela é alegre e gentil; seu “poder especial” é nadar muito bem (o resto da família é que tinha os poderes bacanas, afirma); e ela confia em todo mundo, ao passo que Raya não confia em ninguém. Mais ainda porque, lógico, ela não é a única a querer reunir os fragmentos da gema: entre muitos outros, Namaari, a princesa rival que a traiu anos antes, vive no seu encalço.
Raya, enfim, é um exemplo daquilo que, nos seus melhores momentos, só a Disney faz como a Disney. Mesmo sem inovar na fórmula, ela aqui ao mesmo tempo enche os olhos com a beleza dos cenários e a excelência da ação, diverte, emociona, eletriza, cativa com o sortimento farto de personagens secundários (como a adorável bebê vigarista) e explora na medida certa uma “mensagem”. Que, no seu tema de superar diferenças e trabalhar por um bem comum, é, em um lance inédito, essencialmente política. Até os desenhos animados da Disney, pelo jeito, querem esconjurar o fantasma da era Trump.
Publicado em VEJA de 10 de março de 2021, edição nº 2728