Leio e ouço muitas especulações sobre o futuro que virá. Como será a vida nas cidades, no trabalho, nas escolas, nos restaurantes? Como será o convívio com as pessoas, com a família, amigos e colegas de trabalho?
Quem poderia imaginar que, um dia, em vez de pegarmos a bolsa ou o guarda-chuva para sair de casa, pegaríamos a máscara? Essa indumentária meio estranha, meio esquisita que, de repente, passou a ser essencial como um sapato. O curioso é que as máscaras, na minha opinião, estão fazendo com que as pessoas fiquem menos “mascaradas”. Porque o acessório encobre quase tudo no rosto; menos o olhar, que acaba ganhando destaque. Difícil se deixar enganar por um olhar mais triste, mais alegre, mais preocupado, apaixonado ou deprimido. Os olhos denunciam o amor e a dor, assim como o sofrimento e o medo.
E o maior medo neste momento é de não podermos mais conviver fisicamente com as pessoas: olhar no olho, abraçar, beijar e ficar bem perto de quem gostamos. E aí nos deprimimos: será que vai ser assim para sempre, ou ao menos até inventarem uma vacina contra o coronavírus?
Ainda que o país e o mundo comecem a ensaiar um retorno à normalidade, ninguém tem a resposta segura de como será esse novo tempo. Por outro lado, não acredito que seja hora de ficar imaginando o nosso futuro. É um exercício meio inútil, porque o futuro, tal como o passado, não existe de fato, a não ser em nossa cabeça: o passado na forma de memória, o futuro como projeção. Tudo o que temos, de verdade, é o presente.
“Enquanto não conseguirmos alterar as circunstâncias que nos rodeiam, inventemos nossas próprias vacinas”
Cada um de nós saberá o que fazer quando a vida voltar ao normal. Talvez o segredo para superar a angústia das incertezas seja estar aberto ao que vier, sem expectativas. Independentemente do que nos atinja, precisamos estar cada vez mais fortes, física e espiritualmente. Quando as circunstâncias se apresentam como incontornáveis, como é o caso desta pandemia, as mudanças mais profundas vêm de dentro para fora.
Tenho uma história pessoal de superação que me ensinou muito. Obesa de 120 quilos, fumante inveterada, pouco atenta à saúde, um dia resolvi mudar e comecei a botar em ordem o que me parecia mais visivelmente errado: meu corpo. Foi um tremendo esforço, mas, depois que cuidei da minha saúde, tudo começou a se encaixar e melhorar em todos os planos. Foi como se, combatendo a obesidade e o sedentarismo, eu tivesse criado anticorpos para outros males. O que perdi em peso ganhei em confiança em mim mesma. Emergi desse processo com a certeza de que cada minuto de batalha valeu a pena. Aos 40 anos, comecei a ser uma mulher saudável.
Portanto, não espere um futuro determinado pelos outros. Como cantou Geraldo Vandré — deixando o contexto histórico de lado, porque o que interessa agora é a dimensão pessoal da conclamação: “Quem sabe faz a hora / não espera acontecer”. Enquanto não conseguirmos alterar as circunstâncias que nos rodeiam, como a proliferação do vírus, inventemos nossas próprias vacinas. Fortalecer nossa imunidade contra outras doenças do corpo, do espírito, da carreira profissional e nas nossas relações de vida.
Publicado em VEJA de 1 de julho de 2020, edição nº 2693