Os mitos e omissões da Oxfam sobre a desigualdade
Relatório da ONG britânica é uma aula de como mentir com estatísticas
Todo ano a ONG britânica Oxfam divulga um relatório com dados alarmantes sobre a concentração de riqueza no mundo. “Patrimônio dos 62 maiores bilionários se iguala à de metade da população mundial”, alarmou o grupo nesta semana. Como se fosse uma estatística oficial, a afirmação foi manchete de jornais e apareceu em quase todos sites de notícias. Seria mais honesto se a Oxfam esclarecesse que:
1. O relatório toma endividados como pobres
A Oxfam se baseia em tabelas do banco Credit Suisse sobre patrimônio líquido – o que sobra da riqueza de cada um se subtrairmos as dívidas. Por esse critério, qualquer pessoa que tem uma dívida maior que o patrimônio faria parte dos mais pobres do mundo – entre eles, americanos atolados no cartão de crédito, o Eike Batista e os brasileiros que financiaram um imóvel no Leblon. Como diz o jornalista econômico Felix Salmon, “minha sobrinha, que acabou de conseguir 50 centavos, tem mais dinheiro que a riqueza somada dos 2 bilhões de pessoas mais pobres do mundo”. O estranho critério da Oxfam faz com que existam mais miseráveis nos Estados Unidos (7,5% dos mais “pobres” do mundo) que no Paquistão e em Bangladesh somados (7,2%).
2. O relatório não inclui a riqueza informal
Camelôs, donos de negócios e de casas não legalizadas entram na lista da Oxfam como gente com riqueza zero. Como o economista Hernando de Soto mostrou no livro “O Mistério do Capital”, os pobres possuem pelo menos 10 trilhões de dólares desse tipo de riqueza, não legalizada pelo Estado. Além disso, grande parte da riqueza dos pobres se constitui de bens de consumo e bens não-duráveis, como geladeiras e televisores, que não entram no cálculo de patrimônio. “Quem não tem renda consome muito pouco. À medida que sua renda aumenta, você vai consumir mais”, diz o economista Carlos Góes. “Só depois de sua renda satisfazer suas necessidades imediatas você vai ter dinheiro suficiente pra poupar e acumular riqueza.”
3. Pela primeira vez na história, menos de 10% da população mundial são pobres
Principalmente por causa do avanço do capitalismo na Ásia, a pobreza despencou na última década a níveis inéditos em toda a história da humanidade. Em 2000, a meta estabelecida pela ONU, de cortar pela metade o número de pessoas que viviam com menos de US$ 1,25 por dia até 2015, parecia ambiciosa demais. Pois o mundo conseguiu atingir esse objetivo cinco anos antes do previsto. Nunca uma parcela tão pequena da população mundial foi miserável, como mostra esse gráfico do economista Max Roser:
Quando o assunto é pobreza e desigualdade, temos muitos motivos para comemorar. Mas sabe como é: notícias alegres não ganham destaque nos jornais nem geram doações para ONGs britânicas.
@lnarloch