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A velha e boa lanterna sempre a serviço da razão

O admirável barco de Roberto Campos navega por 50 anos de história

Por Augusto Nunes Atualizado em 19 abr 2017, 00h55 - Publicado em 17 abr 2017, 18h13

No centenário de Roberto Campos, a coluna republica o texto de Augusto Nunes sobre a autobiografia do grande pensador brasileiro:

Convidado para o programa Jô Soares Onze e Meia, Roberto Campos estava no meio de mais uma brilhante digressão quando foi interrompido por um entrevistador aparentemente aflitíssimo. “Para, professor!”, implorou. “Para, porque eu vou acabar aderindo!”. Jô conversava com Campos havia 15 minutos ─ tempo suficiente para que qualquer cérebro em bom estado se renda à inteligência luminosa do autor de A Lanterna na PopaAos interessados em discordar de Campos a qualquer preço, portanto, recomenda-se ficar longe desse barco que percorre 50 anos de história do Brasil. Quem subir a bordo correrá o sério risco de acabar aderindo à essência das ideias desse apóstolo da sensatez.

Saborear a companhia de um homem que pensa muito, pensa com originalidade e, sobretudo, diz o que pensa sem nenhuma concessão a patrulhas tropicais já seria motivo suficiente para embarcar nessa viagem. Mas A Lanterna na Popa é muito mais que a longa revisita de um pensador ao conjunto das próprias ideias. Terminada a leitura das 1417 páginas que compõem a melhor e mais fascinante autobiografia já produzida por um brasileiro, somente um primata não se sentirá 1417 páginas mais inteligente. “O livro é um acontecimento histórico, político, econômico e editorial”, constatou Paulo Francis. “Cinco décadas de Brasil peneiradas por um chef acostumado a lidar com iguarias e não sapoti, jambo e tamarindo. Abro em qualquer página e é um prazer”. Subscrevo.

Como tantos outros leitores, Francis se queixa do peso físico da obra. Cita Edmund Wilson, para quem um livro deve ser levado para a cama sem exigir que se pratique halterofilismo, e lastima que a editora não tenha optado por dividi-la em dois volumes. Subscrevo a ressalva parcialmente. A Lanterna na Popa configura, de fato, um desafio considerável para braços franzinos. Mas é obra para ser lida numa poltrona (de preferência, entre goles de algum vinho capaz de merecer espaço nas mesas que Roberto Campos frequentou e agora ressuscita em suas memórias).

Sobraçando a mesma lanterna posta permanentemente a serviço da razão, o autor se multiplica por diferentes papéis para iluminar as ondas cavalgadas pelo extraordinário elenco com o qual contracenou. O diplomata conviveu com a sedutora exuberância de John Kennedy, com a esplêndida energia de primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, com a soberba autoconfiança de Charles de Gaulle. Vampiro de cérebros singulares, Roberto Campos expropriou desses parceiros frases e lições. Do general francês, por exemplo, tomou emprestada a frase que várias vezes invocaria para lamentar que, embora nadasse contra a corrente, buscava a direção correta: “Estive certo quando tive todos contra mim”.

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Embaixador em Washington do último governo civil, ministro do Planejamento do primeiro governo militar, Campos esteve no olho do furacão de 1964. Os idos de março e seus protagonistas são examinados com a fleugma compassiva que seria aperfeiçoada no comando da embaixada na Inglaterra. Roberto Campos sempre pareceu ter nascido em Londres, com vaga assegurada na Câmara dos Lordes. Mas o nomadismo congênito, em 1982, devolveu-o a Mato Grosso, cenário da campanha eleitoral que transferiria para o Senado a lanterna na popa. Em 1990, para eleger-se deputado federal pelo Rio de Janeiro, sofreu o constrangimento de disputar a vaga, voto a voto, com o cantor Agnaldo Timóteo, uma voz à procura de alguma ideia além de telefonar para a mãe da tribuna da Câmara. Em novembro passado, Campos reelegeu-se. Mas com Agnaldo Timóteo novamente em seus calcanhares. É o Brasil.

O livro ganharia algumas páginas, igualmente irresistíveis, caso o autor revisitasse outras intimidades. Campos preferiu limitar-se a 21 palavras: “Se escrevesse um capítulo amoroso, ele teria apenas uma frase: ‘Não fui veado’. E uma nota de rodapé: ‘Nem atleta sexual'”.

* O texto de Augusto Nunes foi originalmente publicado no jornal Zero Hora em dezembro de 1994.

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