Quem pode ser mais atingido pelas viradas bruscas no termômetro mundial?
Tendência identificada em estudo recente se torna ameaça maior para países de baixa renda, a maioria no continente africano

O aquecimento global não para de bater recordes: o último ano foi o mais quente em 175 anos de registro, segundo a ONU, e a última década (2015-2024) também foi a mais quente já registrada, de acordo com a Organização Meteorológica Mundial. No mesmo ritmo, as consequências da elevação de temperaturas se tornam cada vez mais constantes. Um estudo publicado nesta terça, 22, na Revista Nature, indica que as mudanças rápidas de extremos quentes para frios também aumentaram e continuarão aumentando no planeta, e são um perigo ainda maior para países de baixa renda.
As viradas bruscas no termômetro, chamadas de “temperature flips”, são as rápidas mudanças de temperatura de um calor extremo ao frio extremo, ou vice-versa. O tempo limitado para se adaptar às variações ampliam o leque de consequências negativas para a saúde humana e animal, infraestruturas, vegetação e agricultura, segundo a publicação. Apesar de ser um tema que está recebendo mais atenção, pouco se sabe dos efeitos em larga escala dessas viradas.
Ming Luo, autora principal do artigo publicado na Nature, e seus colegas de pesquisa analisaram dados de mudanças na temperatura dos anos de 1961 a 2023 em uma escala global. Foram consideradas viradas abruptas em períodos de cinco dias, em que as temperaturas desviaram do padrão das médias, tanto para mais quanto para menos.
Os resultados revelam que mais de 60% das regiões analisadas tiveram maior frequência, intensidade e velocidade de transição das mudanças rápidas de temperatura desde 1961. As maiores elevações aconteceram na América do Sul, África, Leste europeu e Sul e Sudeste asiático.
Nos cenários de alta emissão de gases e contínua elevação das temperaturas (SSP 5,0–8,5 e SSP 3,0–7,0) do projeto CMIP (Coupled Model Intercomparison Project), as mudanças rápidas das temperaturas devem aumentar em intensidade e duração entre 2071 e 2100 com menor tempo entre as transições entre os extremos.
Os autores do artigo projetam que a exposição às mudanças pode crescer em mais de 100%, com países de baixa renda como os mais vulneráveis, com transições de quatro a seis vezes maiores que a média global. Segundo a organização World Population Review, 26 países são considerados de baixa renda, sendo 22 do continente africano.
As projeções para o futuro apontam para a necessidade de transformações urgentes na sociedade. Os cenários mais otimistas, com emissões de baixas a médias (SSP 3,0–7,0), apontam que a exposição às mudanças rápidas de temperatura pode ser limitada por ações de redução de emissões de gases e consequente aquecimento global. Os autores do artigo sugerem que os países melhorem suas capacidades de adaptação para as transições entre extremos, principalmente para países em desenvolvimento com grandes populações.
Na contramão da sugestão, a última Conferência do Clima, a COP29, terminou com um acordo frustrante entre os países ricos e as nações mais pobres. De acordo com especialistas e ativistas, seria preciso arrecadar entre 1 e 1,3 trilhões de dólares para atender as necessidades dos países afetados pelas mudanças climáticas, mas o acordo final concedeu 300 bilhões de dólares. Outro fator preocupante é a iminente saída dos Estados Unidos, o segundo maior emissor de CO2 na atmosfera, do Acordo de Paris seguindo a linha negacionista das mudanças climáticas do presidente americano Donald Trump.