Cartão-postal verde: iniciativas sustentáveis viram cobiçada atração turística nas Bahamas
O impacto de sucessivos furacões fez com que o arquipélago se mexesse para domar a natureza

A primeira vez que Cristóvão Colombo fincou os pés em terras americanas, em 1492, foi em uma ilha então conhecida como Guanahani, que mais tarde formaria o arquipélago das Bahamas, o paraíso caribenho banhado por águas de um verde cristalino. Nos séculos seguintes, toda aquela área que oferece um cartão-postal atrás do outro serviu de porto para navios piratas, tornando a maré mais turbulenta. Nem mesmo depois de os ingleses tomarem dos espanhóis esse belo naco do planeta fez-se a paz. As mais de 700 ilhas, palco de sucessivas batalhas sangrentas, acabaram se convertendo em tempos modernos em um grande resort a céu aberto que, com população de 400 000 pessoas, recebeu o número recorde de 11 milhões de turistas estrangeiros no ano passado — quase o dobro do Brasil.
Agora, atento às oportunidades de impulsionar o afluxo de forasteiros, o país vem apostando numa nova modalidade, que gira em torno de recentes iniciativas tomadas ali em prol do meio ambiente. Tradicionalmente varrido por furacões, cuja temporada vai de agosto a outubro, o conjunto de ilhas ao sul dos Estados Unidos vem sendo assolado cada vez mais pelo violento fenômeno. Por isso, resolveram se mexer, de modo a manter o turismo, a mola da economia local, firme e forte. “Furacões como o Dorian, em 2019, o mais aterrador da história, custaram muitas vidas e causaram um declínio absurdo de visitantes, um duro golpe para nós”, disse a VEJA Trevor Moss, à frente do Departamento de Turismo.

Foi um gatilho para implantarem-se por lá ambiciosos projetos, públicos e privados, com o objetivo de frear os estragos. E, bem à moda das Bahamas, eles logo se incorporaram ao rol de atrações, ao lado de cassinos e areias de rara brancura. Exemplo disso ocorreu com um vasto programa para a recuperação de manguezais, que, além de serem habitat de uma rica vida marinha, funcionam como redes de proteção contra tempestades, tal qual esponjas capazes de amortecer a fúria das chuvas. O que era um grande lixão hoje é tomado de deques para contemplação e fotos à vontade. “Queríamos ver de perto as inovações sustentáveis daqui. Esses quilômetros de passarelas para observar a natureza são incríveis”, dizia, sobre uma delas, a australiana Sophia Pakin, 30 anos, que integra, com o marido, a ascendente turma de turistas engajados.
Em alguns casos, a ideia é fazer das medidas voltadas para o verde também fonte de saber. Isso sem nunca, claro, abandonar a marca registrada dos bahamenses: aproveitar aquela beleza de cenário e relaxar. O complexo Island School, a 100 quilômetros da capital Nassau, contém essa mescla. Ali fica um superlaboratório de corais — criados em piscinas artificiais e depois conduzidos ao oceano, onde, por conta do aquecimento dos termômetros, têm sido registradas sucessivas baixas de espécies marinhas. “Nossa meta é adaptar esses corais nos mares para ajudar a reverter a situação”, explica Nikki Rolle, assistente-executiva do complexo, que alia educação aos mimos da boa hospitalidade. O turista fica alojado em um hotel em que os quartos, com vista para a praia de águas mornas, são decorados com mobiliário todo sustentável. Há passeios variados à disposição, entre mergulhos e tours por locais de concentração de corais, e também palestras para aprender sobre o tema e oficinas que ensinam a produzir cadeiras, mesas e roupas com resíduos descartáveis.

Aquelas ilhas, a cerca de uma hora de voo de Miami, precisam importar 90% dos alimentos que consomem, daí ser preocupante a alta na assiduidade dos furacões, que comprometem a modesta produção local. Da necessidade de preservar o que frutifica no solo pouco fértil nasceu o hotel-escola The Farm, na região de Eleuthera, com o propósito de cultivar imensas hortas em estufas climatizadas resistentes à força das tempestades, algo inovador. “Mais dois anos e vamos ter como exportar tomates e pepinos cultivados por hidroponia, na água”, orgulha-se a engenheira agrícola Selima Hauber, uma das coordenadoras do projeto, iniciado em 2023. Os forasteiros, que fazem tour completo pelas dependências, se alojam em quartos confortáveis e provam pratos da gastronomia local, preparados com itens orgânicos saídos direto das plantações dali — como o conch, saborosa mistura de frutos do mar com legumes.
Agir em prol do meio ambiente é questão de sobrevivência para as Bahamas, que, com a escalada dos furacões, criaram a Autoridade de Gestão de Risco de Desastres, responsável por um treinamento para lidar com as intempéries, destinado às comunidades locais mais vulneráveis a calamidades. São permanentes os programas de conscientização da população, que incluem planos de evacuação — tudo movido a incentivos públicos somados a recursos de organizações internacionais. “Investimos em pesquisa e soluções rápidas para diminuir o impacto dos furacões na vida das pessoas e não afugentar o turista”, diz Prescott Young, à frente da divisão do turismo em Eleuthera. É verdade que ainda há muito que caminhar — a energia solar, por exemplo, representa apenas 1% do fornecimento no país. Mas não faltam opções para quem busca uma experiência sustentável nessas bandas onde celebridades como Shakira, Tiger Woods, Eddie Murphy e outros têm uma ilha para chamar de sua. Para os demais mortais, fica o aviso: uma garrafinha de água no lindo arquipélago pode sair por até 20 dólares, coisa de uns 120 reais, mas há por lá abundantes fontes potáveis que não custam um único cent. E a vista é de graça.
Publicado em VEJA de 17 de abril de 2025, edição nº 2940