Brasil se lança na corrida pela produção do lítio, o mineral do futuro
Em Brasília, governo discute criação de entidade supranacional para controlar preços, nos moldes da Opep
Elemento essencial para a fabricação de baterias de longa duração, como as utilizadas em carros elétricos, o lítio entrou na rota de governos e empresas como produto estratégico para o desenvolvimento da economia de baixo carbono.
Na última terça-feira, 9, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, lançou em Nova York o arrojado projeto do Vale do Lítio, a primeira iniciativa do tipo no estado.
A empreitada tem como objetivo fomentar a exploração do minério e levar crescimento econômico ao Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas, hoje uma das regiões mais pobres do Brasil.
O Vale do Lítio deve abranger 14 cidades, onde se localizam as maiores reservas do mineral no país.
O Brasil é um dos países com maior potencial de extração do lítio, juntamente com Chile, Argentina, Estados Unidos, Canadá e Austrália.
O mineral encontrado por aqui, porém, tem elevado grau de pureza, facilitando seu uso na confecção de baterias mais potentes.
As mesmo tempo, o governo de Minas afirma que a extração local consome menos água na comparação com os vizinhos chilenos, sendo assim menos nocivo ao meio ambiente.
De acordo com pesquisas realizadas pelo Serviço Geológico Brasileiro, existem no Vale do Lítio 45 jazidas conhecidas com grande potencial econômico, capazes de garantir fornecimento do mineral por um longo prazo.
Os investimentos no lítio, níquel e cobre, três minerais usados na confecção de baterias, já estão irrigando a economia nacional. Em 2022, a Vale assinou um contrato de longo prazo para fornecer níquel à Tesla, a maior fabricante mundial de veículos elétricos.
No último mês de abril, a Sigma Lithium, uma startup, recebeu autorização para explorar jazidas em Minas Gerais. A iniciativa deve receber investimentos da ordem de 5 bilhões de dólares.
O mercado de lítio começou a se aquecer depois que o governo federal flexibilizou as exportações de lítio, em 2022.
Desde a década de 70, ele era considerado estratégico, com regulação de controle para o comércio exterior. Isso porque o lítio é utilizado nos reatores nucleares.
O governo calcula que o fim do controle deve impulsionar ao menos 15 bilhões de reais em investimentos na produção do minério até 2030.
Encarado como elemento fundamental para a transição verde, o lítio vem atraindo atenções do mundo inteiro para a América do Sul. Isso porque o continente concentra metade das jazidas conhecidas.
Em março, John Kerry, enviado especial para o Clima dos Estados Unidos, esteve na região justamente para assegurar o fornecimento de lítio para empresas americanas.
Autoridades do alto escalão da Alemanha também marcaram três reuniões de alto nível com representantes sul-americanos, ao mesmo tempo em que o chanceler do país, Olaf Scholz, disse em visita a Buenos Aires que as empresas alemãs “vão atuar como parceiras dos sul-americanos”.
O crescente interesse internacional já interfere, inclusive, na geopolítica. Em 21 de abril, o presidente do Chile, Gabriel Boric, anunciou planos para criar uma empresa estatal para explorar lítio.
Caso a legislação seja aprovada, empresas privadas terão de atuar em parceria com a estatal, que terá participação majoritária.
“É a melhor chance que temos de fazer a transição para uma economia sustentável e desenvolvida. Não podemos nos dar ao luxo de desperdiçá-lo.”
O México também já aprovou mudanças no código de mineração, Em 1º de maio, o Senado do país reduziu de 50 para 30 anos a duração das concessões para empresas privadas.
O presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, também assinou em fevereiro um decreto para acelerar a nacionalização das reservas de lítio do país.
O governo do presidente Lula também se movimenta no xadrez político da commodity. Ao lado dos governos de Argentina, Bolívia, e Chile, Lula discute a criação de uma entidade supranacional para controlar a exploração do lítio.
A ideia é que ela funcione como a Opep, organização que reúne países produtores de petróleo e tem poder de ditar os preços no mercado internacional.
A corrida pelo lítio pode ser mais bem entendida através de um recente relatório do Fundo Monetário Internacional.
De acordo com o banco, as receitas dos produtores de lítio, cobre, cobalto e níquel, todos eles metais usados na fabricação de baterias, devem aumentar quatro vezes até 2050.
O FMI calcula ainda que a produção global desses minérios deve somar 13 trilhões de dólares entre 2021 e 2040. O montante é quase igual ao valor esperado na exploração de petróleo no mesmo período.
O avanço já se faz sentir nos países vizinhos. A Argentina espera investimentos de 4,2 bilhões de dólares nos próximos cinco anos, o que equivale a 0,7% do PIB.
E, no ano passado, as exportações argentinas do minério saltaram 250%, passando de 200 milhões para 700 milhões de dólares.