As oportunidades e os desafios da era das megacidades
Centros urbanos superpopulosos, especialmente na Ásia, são uma marca crescente da civilização
Quando se pensa em Indonésia, o país do sudeste asiático formado por ilhas vulcânicas, é natural que venha à mente Bali. Há, desde a semana passada, a partir de um relatório da ONU, um outro ímã a chamar a atenção daquele canto do mundo: a capital Jacarta é a cidade mais populosa do mundo, com 42 milhões de habitantes. Era liderança que, em 2018, no levantamento anterior, cabia a Tóquio, que agora está no terceiro posto (veja no mapa). Convém ressaltar que para a construção do ranking, em mudança de metodologia, se decidiu contar os cidadãos de franjas urbanas, e Jacarta tem uma periferia imensa. A expansão acelerada é resultado da força econômica da Indonésia, com salto anual do PIB na ordem de 5%, e da abertura de fábricas, sobretudo de eletrônicos, em torno de Jacarta — atalho para o surgimento de aglomerados pobres, os kampungs.
A decisão da ONU de abraçar áreas mais amplas na contabilidade tem uma explicação: é modo mais preciso de iluminar um fenômeno que tem a cara de nosso tempo, vinha se ensaiando e se tornou inevitável: a atração, a um só tempo irresistível e necessária, em busca de emprego, das porções vizinhas de grandes metrópoles. É onda que se vê com nitidez especialmente na Ásia, que concentra nove dos dez lugares mais demograficamente densos do planeta. O único ponto fora do continente é o Cairo, no Egito, com 25 milhões de habitantes.
Nos anos 1950, apenas 30% das pessoas viviam em cidades, em um mundo rural. Hoje, a taxa de urbanidade é de 56% e deve chegar a 68% em 2050. O número de megacidades — definidas como aquelas com pelo menos 10 milhões de habitantes — mais do que quadruplicou, passando de oito em 1975 para 33 em 2025. Há evidentes aspectos positivos, dadas as facilidades de infraestrutura, como saneamento e transporte público, além de oportunidades de crescimento econômico e acesso à educação mais evidentes, na comparação com o cotidiano do campo, muitas vezes apartado de esperança. Convém não esquecer, porém, dos nós alimentados pelo inchaço, da pobreza espraiada ante os obstáculos de tanta gente em um mesmo espaço em busca de chance de uma vida decente — tema que, aliás, andou um tanto à margem das discussões da COP30, realizada em Belém do Pará, e não deveria ter sido assim.
Metrópoles densas, complexas, interligadas e culturalmente diversas moldam um novo perfil global. Tudo é pujante — até mesmo os problemas, quase sempre decorrentes da falta de planejamento. “As megacidades atraem e expressam a realização do capitalismo”, afirma Élcio Batista, coordenador do programa Cidade +2°C, do Insper, em São Paulo. “Jacarta retirou tanta água do subsolo para abastecer a população que o território está afundando em ritmo acelerado.” Algumas áreas já estão abaixo do nível do mar, e especialistas alertam que parte dela pode submergir até 2050, exigindo a construção de uma nova capital, caso não sejam estabelecidas medidas urgentes de controle.
A escassez de água não é exclusividade de Jacarta. São Paulo (18,5 milhões), que chegou a ser a quarta mais ocupada, enfrenta a segunda crise hídrica em uma década. Seu maior complexo de reservatórios, o Sistema Cantareira, está a 20% da capacidade em razão da falta de chuvas, e teme-se pelo que pode vir a acontecer no verão de 2026. “A concentração de pessoas e o excesso de impermeabilização do solo provocam o fenômeno da ilha de calor urbano”, disse a VEJA Johan Rockström, autor da teoria dos limites planetários.
Ainda assim, especialistas destacam que os mesmos fatores que tornam as megacidades frágeis também as transformam em protagonistas na busca por soluções. Iniciativas de adaptação climática, ampliação de áreas verdes, recuperação de rios, transporte limpo e novos modelos de urbanização já despontam em várias das grandes metrópoles. Para urbanistas, o problema não está no adensamento, mas na falta de planejamento — algo que pode ser corrigido. Cidades que investem em resiliência, inovação e qualidade de vida tendem a se tornar não apenas mais seguras, como também mais humanas.
Publicado em VEJA de 5 de dezembro de 2025, edição nº 2973
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