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George Soros: papel da UE será crucial para o futuro da Ucrânia

Investidor diz que bloco foi atropelado pela Rússia nas negociações de acordo com a Ucrânia. Agora poderá ajudar o país a conquistar acesso a mercados

Por Da Redação
27 fev 2014, 17h56

Depois de uma escalada terrível da violência, a revolta ucraniana teve, surpreendentemente, um resultado positivo. Contra todas as expectativas racionais, um grupo de cidadãos armados com pouco mais que bastões e escudos feitos de caixas de papelão e tampas de latas de lixo de metal esmagou uma polícia que disparava balas de verdade. Houve muitas vítimas, mas os cidadãos levaram a melhor. Esse foi um daqueles momentos históricos que deixam marcas permanentes na memória coletiva de uma sociedade.

Como pôde uma coisa dessas acontecer? A mecânica quântica tem como pilar a teoria do princípio da incerteza, de Werner Heisenberg, que apresenta uma metáfora adequada à situação. Para Heisenberg, fenômenos subatômicos podem se manifestar como partículas ou ondas; da mesma forma, os seres humanos podem alternar entre se comportar como partículas individuais ou como elementos de uma onda maior. Em outras palavras, a imprevisibilidade de eventos históricos, como os da Ucrânia, tem a ver com um elemento de incerteza na identidade humana.

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A identidade das pessoas é composta de elementos individuais e elementos de unidades maiores a que pertencem, e o impacto das pessoas sobre a realidade depende de quais elementos dominam o seu comportamento. Quando os civis se lançaram em um ataque suicida contra as forças de segurança em Kiev, no dia 20 de fevereiro, seu senso de representante da “nação” em muito superou a preocupação com sua mortalidade individual. O resultado foi levar uma sociedade profundamente dividida que estava à beira de uma guerra civil para um sentido inédito de unidade. (Continue lendo o texto)

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A duração dessa união dependerá de como a Europa vai responder. Os ucranianos demonstraram sua fidelidade a uma União Europeia que é ela mesma dividida, com a crise do euro colocando países credores e devedores uns contra os outros. É por isso que a UE foi categoricamente atropelada pela Rússia nas negociações com a Ucrânia sobre um Acordo de Associação.

Fiel à forma, a UE, sob a liderança alemã, ofereceu muito pouco e exigiu demais da Ucrânia. Agora, depois que o compromisso do povo ucraniano em estabelecer laços mais estreitos com a Europa impulsionou uma insurreição popular bem-sucedida, a UE, junto com o Fundo Monetário Internacional, está preparando um pacote de resgate multibilionário para salvar o país do colapso financeiro. Mas isso não será suficiente para manter a unidade nacional de que a Ucrânia vai precisar nos próximos anos.

Fundei a Renaissance Foundation na Ucrânia, em 1990, antes da independência do país. A fundação não participou da recente revolta, mas foi defensora daqueles que foram alvo ​​da repressão oficial. A fundação agora está pronta para apoiar ucranianos que desejem fortemente instaurar instituições democráticas legítimas (acima de tudo, um sistema judiciário independente e profissional). Mas a Ucrânia vai precisar de ajuda externa que só a UE pode proporcionar: competência de gestão e acesso a mercados.

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Numa notável transformação das economias da Europa Central na década de 1990, a competência de gestão e acesso a mercados resultaram de investimentos maciços de companhias alemãs e empresas sediadas em outras partes da União Europeia, que integraram produtores locais a sua cadeia global. A Ucrânia, com seu capital humano de alta qualidade e economia diversificada, é destino de investimento potencialmente atraente. Mas perceber esse potencial exige melhor o ambiente para negócios na economia como um todo e em setores específicos – abordando particularmente a corrupção endêmica e a fraca aplicação do direito que repelem tanto investidores nacionais quanto estrangeiros. (Continue lendo o texto)

​Além de incentivar o investimento estrangeiro direto, a UE poderá prestar apoio à formação de gestores de empresas locais e ajudá-los a desenvolver suas estratégias de negócio, com prestadores de serviços remunerados por participações acionárias ou participação nos lucros. Uma maneira eficaz de implantar esse tipo de apoio a um grande número de empresas seria combiná-lo com linhas de crédito concedidas pelos bancos comerciais. Para incentivar a participação, o Banco Europeu para a Reconstrução e o Desenvolvimento poderia investir em empresas, paralelamente a investidores locais e estrangeiros, como aconteceu na Europa Central. Desta forma, a Ucrânia abriria seu mercado interno para produtos fabricados ou montados por subsidiárias total ou parcialmente de propriedade de companhias europeias, enquanto a UE aumentaria o acesso ao mercado para as empresas ucranianas e as ajudaria a integrar os mercados globais.

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Espero e confio que a Europa sob a liderança alemã se mostre à altura dos acontecimentos. Venho há vários anos defendendo que a Alemanha deve aceitar as responsabilidades e obrigações de sua posição dominante na Europa. Hoje, a Ucrânia necessita de um equivalente moderno do Plano Marshall, pelo qual os Estados Unidos ajudaram a reconstruir a Europa após a II Guerra Mundial. A Alemanha deve desempenhar o mesmo papel hoje como os EUA fizeram naquele momento.

Devo encerrar, no entanto, com uma palavra de cautela. O plano Marshall não incluiu o bloco soviético, reforçando assim a divisão da Guerra Fria na Europa. Uma reprise da Guerra Fria poderia causar um dano imenso tanto para a Rússia como para a Europa, e acima de tudo para a Ucrânia, que está situada entre eles. A Ucrânia depende do gás russo e precisa de acesso aos mercados europeus para os seus produtos; deve ter boas relações com ambos os lados.

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Aqui, também, a Alemanha deve assumir a liderança. A chanceler Angela Merkel deve se comunicar com o presidente Vladimir Putin para assegurar que a Rússia é um parceiro, não um adversário, no renascimento ucraniano.

George Soros é presidente da Soros Fund Management e da Open Society Foundations. Um pioneiro do mercado dos fundos de hedge, e autor de vários livros, incluindo ‘A Alquimia das Finanças’, ‘Novo Paradigma para Mercados Financeiros: A Crise de Crédito de 2008 e Suas Implicações’ e ‘A Tragédia da União Europeia’

© Project Syndicate, 2014

(Tradução: Roseli Honório)

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