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Um filme de verão para adolescentes e pais

Rosane Svartman, de 'Como ser solteiro', se aventurou na internet e nas salas de aula para criar 'Desenrola', história sobre as tensões da 'primeira vez'

Por André Gomes, do Rio de Janeiro
2 jan 2011, 18h10

“O público adolescente sente vontade de interagir com o produto. O desafio é convencer tal público a pagar um ingresso e ver um filme brasileiro, coisa que ele não tem costume de fazer”

Conhecida pelo filme Como Ser Solteiro, comédia sobre desventuras amorosas lançada em 1998, a diretora Rosane Svartman volta agora seu olhar para o público adolescente com o longa Desenrola, que estreia dia 14 de janeiro disposto a levar para as salas de cinema brasileiras não só os filhos, mas os pais dos espectadores dessa faixa de idade. Para conseguir tal façanha, a diretora apostou numa protagonista adolescente (Olívia Torres) que, diante da viagem da mãe (Claudia Ohana), tem a casa à sua disposição e a possibilidade de, enfim, ter a aguardada ‘primeira vez’. Os planos vão por água abaixo quando o gostosão da turma (Kayky Brito) pula do sofá, uma vez ciente da virgindade da menina. Para embalar a história recheada por amores platônicos, ciladas e a montanha-russa de emoções típica da adolescência, a diretora escolheu clássicos do pop e do rock dos anos 80 (ouvidos pela protagonista a partir da mãe), num “intercâmbio geracional” que empresta colorido especial ao filme. O humor fica por conta da hilária dupla Boca e Amaral (Lucas Salles e Vitor Thiré), que ganhou série no Multishow (Desenrola Aí) antes mesmo da estreia do filme. Rosane falou ao site de VEJA sobre a expectativa com o filme, gravado no Rio de Janeiro e em Búzios, e sobre o público que espera levar aos cinemas.

Em que a garotada de hoje é diferente da de 20 ou 30 anos atrás?

O mais engraçado foi descobrir o que havia em comum. Quando começamos o projeto a maioria de meus amigos falava coisas do tipo: “Virgindade? Hoje isso não tem importância” ou “beijam aos 12, transam aos 13″. Eu também acreditava nesse lugar comum até começar a pesquisa. Talvez os adolescentes de hoje se vistam melhor (nada como ser ‘pós-ombreiras’), beijem mais pessoas numa festa, mas é bacana perceber que uma boa parte daquela ansiedade, dos medos, fantasias, que têm a ver com a tal primeira vez, ainda continuam. Voltei várias vezes à minha adolescência durante o processo e ela ficou mais perto à medida que eu me identificava com o que os jovens estão passando hoje: aquele turbilhão intenso de emoções e hormônios”.

Rosane Svartman, diretore de 'Desenrola': experiência com adolescentes para criar diálogos autênticos
Rosane Svartman, diretore de ‘Desenrola’: experiência com adolescentes para criar diálogos autênticos (VEJA)
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Há um pouco de você na personagem da Claudia Ohana, na cena em que a mãe lê o bilhetinho da filha (que dorme no quarto com um rapaz) com o recado: ‘você também já teve 16 anos’?

Claro que eu sempre me pergunto como será quando meus filhos forem adolescentes. A produtora do filme, Clélia Bessa, já tem uma filha adolescente e fica lembrando de algumas coisas radicais que já fez ¬- mas que não conta pra ela – e comparando com o que rola hoje. Acho que é uma espécie de recado para mim mesma e para pessoas como eu.

Você acredita que os pais de hoje em dia estão mais tranquilos para lidar com temas como a primeira vez dos filhos?

Talvez, mas também, como é o caso dos pais no filme Desenrola, ficam num conflito danado de até que ponto ir. São mais tranquilos por um lado, mas ainda tentam exercer certo controle por outro, e isso é complicado quando a relação tenta ser muito horizontal. Como a Priscila deixa escapar num certo momento do filme, “Ah, pai tem coisas que eu não vou falar pra você, por exemplo!”.

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Foram desenvolvidas várias frentes de divulgação, especialmente na Internet, para divulgar o filme. Quais deram certo?

O público adolescente sente vontade de interagir com o produto. O desafio é convencer tal público a pagar um ingresso e ver um filme brasileiro, coisa que ele não tem costume de fazer. Nossa ideia foi ir aonde ele está e abrir nosso filme como numa espécie de diálogo, através das ferramentas sociais. A música-tema foi feita de forma colaborativa com a banda Agnela, parte do elenco de apoio foi escolhida de forma participativa, tivemos algumas sessões organizadas através de ferramentas sociais da web e assim por diante. Colocávamos cenas, diálogos nos blogs. Eu avalio que essas experiências funcionam bem juntas: o conteúdo na web pode ser descartável, então a noção de continuidade é importante.

Amores adolescentes: filme aposta em trilha dos anos 80 para atrair pais
Amores adolescentes: filme aposta em trilha dos anos 80 para atrair pais (VEJA)

Em que, efetivamente, a participação do público altera o filme e a história?

Depois de uma série de documentários para o público adulto e de uma web-série participativa sobre o tema ‘a primeira vez’, fizemos uma primeira versão do roteiro. Já tínhamos conteúdo, e na web-serie já havíamos debatido questões que pretendíamos abordar através das redes sociais das personagens. Com esse roteiro, visitei diversas escolas no Rio e São Paulo para ler o roteiro em sala de aula e conversar com os alunos. Cenas inteiras caíram, diálogos foram totalmente modificados. Por exemplo, tem um diálogo do Caco e da Priscila (Daniel Passi e Olívia Torres) que foi sugestão de uma aluna do Santa Cruz. Também chamei alguns jovens roteiristas (homens, já que nunca serei um rapaz adolescente) para participarem do processo. Quando já não dava mais para visitar escolas porque estava em pré-produção, comecei a usar o site do filme para colocar questões do roteiro. Na fase de edição repetimos o processo. Como nossos atores são adolescentes e têm a idade dos personagens, eles também contribuíram. A paródia do ‘Tropa de Elite’ foi um pedido do Lucas e do Vitor (Boca e Amaral); Caco anda de skate por ideia do Daniel Passi e Tize masca chiclete durante uma cena inteira por uma sugestão da Juliana Paiva.

Como foi escolher hits dos anos 80 para um filme que se passa nos dias de hoje? Contaram as suas recordações da época?

Sim. Eu estava no Show do Simple Minds em 1988 e o Breakfast Club é um dos meus filmes prediletos – Don’t You Forget About Me é a música tema. Eu achei o Jim Kerr na Internet. Só soube que era ele mesmo depois que combinamos uma pequena reunião via Skype. O Bruno Levinson, que fez a trilha sonora do filme, sugeriu as músicas dos anos 80 e comemorávamos a cada autorização. A do Paralamas é meio lado B, fiquei com medo de algumas pessoas acharem que era atual. A do Ritchie foi uma daquelas que ficou muito tempo na minha cabeça – da minha e de milhões de pessoas. Ele foi gentil o tempo todo e facilitou bastante a negociação. A música final, em que a Maria Gadú interpreta minha trilha sonora pessoal dos anos 80 (Quase Sem Querer) foi um pedido da produtora, Clélia. Ela achava que no final tínhamos que ter alguma espécie de encontro entre gerações, uma regravação de algum sucesso dos anos 80 por uma artista atual. O Bruno sugeriu a incrível Maria Gadú e eu, a música.

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Você acredita que seu filme dialoga com filmes recentes, caso de As Melhores Coisas do Mundo, da Laís Bodanzky? Que outras produções nacionais têm esse apelo?

Claro. Tem também o Antes que o Mundo Acabe, da Ana Luiza Azevedo, que acho que dialoga bastante com esse público. E acho que o Tropa de Elite e o Muita Calma Nessa Hora também estão trazendo os adolescentes para o cinema, mesmo que não sejam histórias adolescentes e que esse não seja o público-alvo”.

No que um filme como o seu difere dos filmes direcionados ao público jovem nos anos 80, caso de ‘Menino do Rio’?

Eu falsifiquei carteirinha pra ver ‘Menino do Rio’ e lembro de detalhes dessa sessão no cine Jóia, do Rio de Janeiro. E havia também todos aqueles filmes B Rock. Talvez uma das diferenças do Desenrola seja também uma questão de geração. Os anos 80 eram mais liberais, era uma época pós-ditadura, o rock embalando a abertura política, os filmes tinham mais drogas, sexo, e talvez hoje não fossem liberados para o público adolescente. E também o Desenrola fala de jovens em idade escolar, se passa em parte na escola e essa temática e faixa etária não eram muito comum nos filmes brasileiros da década de 80 que eu via”.

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'Desenrola': roteiro alterado com base em interação com adolescentes
‘Desenrola’: roteiro alterado com base em interação com adolescentes (VEJA)

Você dirigiu Confissões de Adolescente nos anos 90. Sentiu que os questionamentos mudaram muito de lá pra cá entre a garotada?

“Era uma delícia escrever para o Confissões, até por que há mais de 15 anos eu me sentia quase pós-adolescente. E escrevia com a Fabiana Egrejas, que é a diretora de arte do Desenrola e amiga de adolescência. Então escrever era lembrar, nem precisamos pesquisar. Acho que tem muita coisa em comum, mais do que muita coisa diferente. Primeiro beijo, primeira transa, aborto, tudo isso ainda permeia a adolescência”.

O filme estreia num momento promissor para o cinema nacional e no período de férias. Qual é sua expectativa de público?

Pergunta difícil pra um diretor responder. Produtores e distribuidores adoram falar sobre isso, já eu fico com vontade de entrar debaixo do cobertor. Mas acho que estamos num momento promissor também para filmes sobre e para adolescentes. Tivemos alguns filmes representativos com essa temática recentemente e acho que eles ajudam a tentar conquistar esse público, que é o grande público do cinema mundial. Nossas expectativas são as melhores possíveis, mas quem define mesmo é o público, na primeira semana. Alinhada com a nossa produtora, Clélia Bessa, posso dizer que nossa expectativa de público é de 1 milhão de espectadores.

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