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Academia espanhola muda as regras do idioma. E provoca revolta entre os falantes da língua ao redor do mundo

Por The New York Times
26 nov 2010, 12h44

“Todos os dicionários terão de ser refeitos, o que é bom para vender o dicionário da Real Academia, que eles continuam produzindo como se fosse a Bíblia”

Ilan Stavans, professor mexicano de cultura latino-americana

A Real Academia Espanhola retirou duas letras do alfabeto, reduzindo-o a 27. Entre as alterações mais importantes estão a saída do “ch” e do “ll”, para não citar a retirada de muitas entonações irritantes e hífens.

A ortografia simplificada da academia, uma instituição de Madri que é o árbitro de todas as questões gramaticais, deveria ser uma boa notícia para as 450 milhões de pessoas que falam espanhol pelo mundo, sem mencionar as que se esforçam para aprender o idioma. Mas não. Todos, ao que parecem, têm algo a reclamar da academia – a começar pelo presidente venezuelano Hugo Chávez.

Se a academia não considera mais o “ch” como letra separada, desdenhou Chavéz ao seu gabinete, ele passaria a ser conhecimento simplesmente como “Avez”. (Na verdade, seu nome permanecerá o mesmo, embora na ordem alfabética mude de lugar, porque “ch” era a letra que vinha depois do “c”.)

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Um editorial do jornal mexicano El Universal declarou que as novas regras são uma afronta à identidade nacional: “A ortografia não é apenas uma imposição; ela serve para manter um mínimo de coerência e sentido do que será dito e escrito. Isso pode ser ditado por uma sala de conferência no estrangeiro? Um país que tem orgulho de ser independente não pode aceitar isso”. O editorial perguntou: “Será que os Estados Unidos aceitariam ditames da Inglaterra sobre o seu uso do inglês?”

Eles estão entristecidos com o lado europeu do Atlântico. Comentários brotaram na Web – 1 450 deles desde quinta-feira – depois do primeiro artigo sobre as mudanças aparecer no jornal espanhol El País no início do mês. A palavra “absurdo” era uma das mais frequentes.

“É um momento de realismo mágico. Decidiram que duas das 29 letras vão desaparecer”, disse Ilan Stavans, um mexicano que é professor de cultura latino-americana no Amherst College. “Todos os dicionários terão de ser refeitos, o que é bom para vender o dicionário da Real Academia, que eles continuam produzindo como se fosse a Bíblia”.

A academia espanhola usou 800 páginas para explicar as novas regras. Entre outras mudanças: letras com diferentes nomes em países diferentes terão apenas um nome. Além disso, Iraq agora é Irak e quasar será escrito cuasar. Os livros que explicam as novas regras de ortografia serão colocadas à venda até o Natal na Espanha. Os latino-americanos terão de esperar um pouco mais.

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Há muito tempo existem queixas sobre a ortografia espanhola. No primeiro congresso internacional sobre a língua espanhola, em Zacatecas, no México, em 1997, o escritor colombiano e prêmio Nobel de Literatura Gabriel Garcia Marquez declarou: “Vamos aposentar a ortografia, o terror de todos os seres, desde o berço”. Mas ele admitiu que seus pleitos foram pouco mais que “garrafas atiradas ao mar na esperança de que um dia surja o deus de todas as palavras”.

O deus continua em silêncio, mas a Real Academia Espanhola vem preenchendo o vazio desde que foi fundada, em 1713. “Eles têm uma forma oracular de apresentar as coisas, como Moisés descendo do Monte Sinai”, disse Stavans. “Na minha opinião, é uma relíquia do século XVII”, acrescentou. “Temos de esperar pela Espanha para saber como falamos.”

Para aqueles que vivem e respiram espanhol, as prioridades da academia parecem um pouco por fora. “Somos uma língua em debate”, disse o escritor mexicano Paco Ignacio Taibo II. “Infelizmente, a academia não está à frente do debate, está atrás.”

Em sua defesa, a academia teve o cuidado de ressaltar que trabalha em colaboração com seus associados de 21 academias de outros países de língua espanhola, inclusive os Estados Unidos. As primeiras reuniões sobre a nova ortografia foram realizadas no Chile. O texto foi concluído neste mês na Espanha e será ratificado pela academia e suas congêneres na Feira do Livro de Guadalajara, no México, neste domingo.

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Em um e-mail, Juan Villoro, um escritor mexicano que vive em Barcelona, foi filosófico sobre uma mudança que parece atacar o cerne das almas poéticas que falam espanhol dos dois lados do Atlântico. De acordo com as regras antigas, a palavra “solo” tem uma entonação quando significa “somente”, e que não existe quando significa “sozinho”. A academia acabou com a entonação, argumentando que o significado seria evidente de acordo com o contexto. “Às vezes, a lei não tem nada a ver com justiça”, escreveu Villoro.

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