Quando o poder inebria
De Paulo Maluf a Demóstenes Torres: quem são os enófilos que passaram – ou correm o risco de passar – alguns dias a pão e água
Entre as centenas de ligações telefônicas protagonizadas por Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, e gravadas pela Polícia Federal durante a Operação Monte Carlo, uma chamou especialmente a atenção. Menos pela ilegalidade e mais pelo caráter inusitado do tema. Na conversa, em vez de negociarem propinas, indicações de compadres para cargos públicos ou licitações fraudulentas, o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO) pede ao contraventor que compre cinco garrafas de Cheval Blanc, safra 1947, um dos vinhos mais caros do mundo. No Brasil, cada garrafa custa cerca de 30 000 reais.
Numa ligação para tratar do assunto, Gleyb Ferreira da Cruz, um dos braços direitos de Cachoeira, informa ao senador que o valor total das garrafas era de 13 584 dólares – depois de conseguir um desconto de 566 dólares. “Compra tudo”, manda Demóstenes.
Ao ser informado de que três delas estavam com o rótulo estragado, o senador responde: “Nada a ver. Mete o pau. Para muitos, é o melhor vinho do mundo de todos os tempos”. Qual a forma de pagamento?, quer saber Gleyb. “Passa o cartão do nosso amigo aí, depois a gente vê”, fala Demóstenes, pedindo para que seja usado o cartão de Carlinhos Cachoeira.
A encomenda é um sinal dos novos tempos. Enquanto o uísque foi a bebida que dominou as rodas políticas na maior parte do século XX, com Juscelino Kubitschek (Buchanan’s, Ballantine’s e Chivas entre as marcas preferidas), Jânio Quadros (todas), João Goulart e Fernando Collor (Logan) entre seus grandes apreciadores, o vinho ganhou cada vez mais admiradores na última década. Alguns desses enófilos, entretanto, autoproclamados grandes conhecedores da bebida, já passaram – ou correm o risco de passar – alguns dias a pão e água. Confira: