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Fundos de pensão têm prejuízo de R$ 528 milhões

Relatório do Ministério da Previdência aponta que os fundos estariam sendo usados para desvio de recursos mediante pagamento de propina

Por Da Redação
11 nov 2013, 10h57

Fundos de pensão de servidores públicos estaduais e municipais acumularam prejuízo de 528,17 milhões de reais em aplicações feitas de 2009 a 2013, conforme levantamento do Ministério da Previdência. Esquemas criminosos e adoção de práticas que não observam regras do Conselho Monetário Nacional ou do Banco Central potencializam o rombo. Essas e outras irregularidades colocam em risco o Regime Próprio de Previdência (RPP), segundo documento do ministério.

O relatório aponta que, neste ano, auditorias conduzidas pela pasta identificaram que “fundos estariam potencialmente sendo utilizados para desvios de recursos” e “colocando em risco a solvência de todo o sistema”. Os nomes desses fundos não foram divulgados.

O levantamento do prejuízo nominal acumulado feito pelo ministério revela que as perdas apuradas pela pasta são dez vezes maiores do que o investigado na Operação Miqueias, desencadeada pela Polícia Federal em meados de setembro tendo como foco desvios ocorridos em quinze municípios. Esse valor abrange apenas três estados – Rio Grande do Norte, Tocantins e Roraima – e 72 municípios, com aplicações feitas entre 2009 e 2013.

Os auditores chegaram a esse valor estimando qual deveria ser atualmente o patrimônio desses fundos com base em suas aplicações originais, levando em consideração a oscilação da economia no período.

Entre as irregularidades identificadas nos RPPs estão o direcionamento de investimentos para fundos criados apenas para explorar a conta do estado ou município, aplicação de mais recursos do que o permitido pelas regras do mercado financeiro e a utilização de fundos considerados de alto risco.

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Do ano passado até agora, o ministério encaminhou 200 relatórios à PF, Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Banco Central, Ministério Público e Tribunais de Contas Estaduais (TCEs). A lista de investimentos suspeitos e outras irregularidades aponta o envolvimento dos RPPs com: apropriação indébita, pagamento indevido de benefícios, falsidade ideológica, utilização indevida de recursos, improbidade administrativa, investimentos que causaram prejuízos e até a inclusão de ocupantes de cargos de livre nomeação entre os beneficiários.

Com base em parte desse material, a PF descobriu a atuação de um esquema criminoso que tinha como foco direcionar investimentos dos RPPs. Ou seja, dinheiro da aposentadoria de servidores municipais e estaduais estava sendo aplicado em determinados fundos não com base em critérios técnicos, mas mediante o pagamento de propina.

Prejuízo – Essas perdas se concentram em seis fundos de investimento. Em comum, todos tinham papéis de bancos liquidados pelo BC nos últimos dois anos: BVA, Panamericano, Rural e Schain. O FI Diferencial, fundo de renda fixa de longo prazo, tinha papéis do Rural, BVA e Panamericano. A perda nominal para os 42 RPPs que aplicaram recursos aí foi de 258,2 milhões de reais.

A PF descobriu que o fundo estava no portfólio da Invista, consultoria financeira do esquema criminoso que corrompia agentes públicos e políticos em troca de investimentos em várias partes do país.

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O RPP do estado do Tocantins, por exemplo, investiu nesse e em outros fundos suspeitos pela PF e registrou prejuízo de 153 milhões de reais, o maior valor entre os demais regimes próprios que também tiveram perda.

Um dos problemas identificados pelo ministério é a aplicação de recursos em porcentual maior do que o permitido pelas regras do Conselho Monetário Nacional e do BC. Conforme a investigação da PF, quanto mais os RPPs investiam, mais propina era paga aos gestores e políticos.

“O grande problema é que alguns RPPs se entusiasmaram e foram aplicando mais do que podiam. Sabendo que tem um limite, por que investiram a mais? O limite é uma forma de proteção dos fundos”, afirmou Otoni Gonçalves Guimarães, diretor do Departamento dos Regimes de Previdência no Serviço Público (DRPSP), vinculado ao Ministério da Previdência, e responsável pelas auditorias.

Entre as irregularidades encontradas estão, ainda, aplicações de RPPs em fundos de investimento que têm alta concentração em apenas um papel. É o caso do NSG Varejo de Participação, que tem 98,3% dos ativos concentrados na Brasil Foodservice Group S/A – holding controladora do restaurante Porcão. E também do Conquest Fundo de Investimento e Participações, que tem 83,06% da carteira aplicada em ativos de emissão da Sala Limpa Serviços e Comércio S.A., uma empresa de lavanderia.

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Mas nesses casos, segundo o ministério, não houve prejuízos financeiros. “A preocupação é a concentração que, dependendo da empresa, talvez não dê a resposta que o fundo deseja”, afirmou Guimarães.

As auditorias do ministério indicaram mudanças no perfil das aplicações dos RPPs nos últimos anos. Eles trocaram investimentos em fundos cujas administradoras faziam parte de conglomerados dos bancos de primeira linha por aquisição de cotas de fundos geridos por entidades de pouca representatividade.

Em 2011, observou-se que as RPPs passaram a aplicar em fundos de investimento em crédito privado, sem efetuar uma análise apropriada dos riscos envolvidos nestas aplicações.

Punição – As irregularidades nos fundos de previdência são punidas pelo Ministério da Previdência com o bloqueio de repasse de verbas federais, por meio da não concessão do Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP). Os auditores da pasta descobriram, contudo, que alguns ministérios repassaram recursos do orçamento a municípios e estados punidos, em desacordo com as normas vigentes.

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Relatórios de auditoria elaborados pelo DRPSP do ministério apontam cinquenta casos em que houve transferência irregular de recursos federais a municípios e estados. Na maioria dos casos, os recursos eram liberados mesmo sem o CRP em época de festa junina, especialmente de emendas parlamentares destinadas à região Nordeste e do Ministério do Turismo.

O Ministério da Previdência informou à Controladoria-Geral da União (CGU) sobre a irregularidade, o que teria motivado o órgão a criar um sistema para identificar diretamente esses repasses em desacordo com a lei, antes captados apenas pela Previdência. Procurada por e-mail, na sexta-feira, a CGU não se manifestou sobre o que foi feito com os casos identificados pelas auditorias nos últimos anos.

As auditorias dos fundos de previdência dos estados e municípios são feitas mediante análise dos dados encaminhados pelos RPPs ao ministério, mas também podem ser presenciais. Os dados são analisados por auditores fiscais cedidos ao Ministério da Previdência.

Gestores – O BNY Mellon, responsável pelos fundos Diferencial e Vitória Régia, informou que “atua como administrador” dos fundos, “não sendo responsável pela decisão de investimento que cabe exclusivamente aos seus gestores”, e que comunicou à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) “as provisões feitas para perdas registradas em razão da deterioração da capacidade financeira dos seus emissores, Banco Rural S.A. e Banco BVA S.A., nos termos dos fatos relevantes”.

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Sobre a investigação da PF, o BNY disse não ter “conhecimento de qualquer envolvimento de fundos sob sua administração na citada operação [Miqueias]”.

A diretora da área de compliance da Adinvest, Vivian Scovinovvo, afirmou que a rentabilidade negativa do fundo Adinvest Top FI RF deveu-se à oscilação das taxas da NTN-C e à intervenção do Banco Central nos Bancos BVA e Rural.

“O administrador do fundo é obrigado a colocar, nesse caso, o ativo como zerado. O que provoca uma queda momentânea. No longo prazo, acaba-se recuperando os ativos.” Vivian observou que os ativos que compõem essa carteira foram adquiridos dentro das regras do mercado financeiro e com baixo risco de crédito, e que a Adinvest não faz captação de clientes. “Somos uma empresa que tem história e um nome a zelar”, afirmou.

Procuradas, a BRL Trust Serviços, que administra o Patriarca Private Equity FIP, e a NSG Capital Serviços financeiros, do Roma FI RF CP Previdenciário, não responderam aos questionamentos da reportagem.

Em nota, o estado do Tocantins afirmou que tomou conhecimento de “aplicações temerárias” com recursos do Instituto de Gestão Previdenciária do Estado (Igeprev) e determinou medidas saneadoras, entre elas a assinatura de dois Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério da Previdência e a Advocacia-Geral da União. Tais medidas resultaram no reenquadramento de onze dos catorze investimentos em condições irregulares.

“Desde maio de 2012, o Igeprev apresenta à Previdência Social relatório de todas as ações realizadas para atender às exigências dos TACs. Não há nenhuma ação do Igeprev que não tenha o conhecimento da Previdência Social.”

(Com Estadão Conteúdo)

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