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Hip-hop, o gênero que deu nova ginga à economia dos EUA

Em livro, ex-executivo da música responsável por lançar carreiras bem sucedidas, como a do rapper Nas, mostra como o gênero sacudiu o mercado americano

Por Carol Nogueira
20 jan 2012, 23h11

“Outras modas vieram à tona com o hip-hop no fim dos anos 1980. Roupas de inspiração africana, joias douradas (chamados de blings), correntes penduradas na carteira e roupas que carregavam as cores da África (vermelho, preto e verde) tomaram as ruas e, é claro, as lojas. Nos anos 1990, vieram os jeans baggy e os casacos com capuzes. Hoje, muitas grifes têm suas próprias linhas ligadas ao estilo, e quase todas são de propriedade de rappers”.

Em 2011, o rapper Eminem recebeu 1 milhão de dólares para estrelar um comercial da montadora Chrysler para o Superbowl, a final do futebol americano que é a maior audiência televisiva dos Estados Unidos. Com dois minutos de duração, o anúncio se tornou o mais longo do evento e um dos mais caros da história – cada minuto de exibição no intervalo da partida custa cerca de 3 milhões de dólares; ao todo, foram gastos 9 milhões.

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O episódio reflete o ótimo momento que vive o hip-hop na economia americana. Além de constar entre os maiores vendedores de discos da revista Billboard e entre os mais ricos nos rankings da Forbes, os rappers lucram como empreendedores vorazes que são. Gravadoras, marcas de roupas, restaurantes… Tudo isso faz parte da eclética fonte de renda dos grandes nomes do hip-hop mundial.

É este o mote de The Tanning of America – How Hip-Hop Created a Culture that Rewrote the Rules of the New Economy (em tradução livre, algo como O Bronzeamento da América – Como o Hip-Hop Criou a Cultura que Reescreveu as Regras da Nova Economia), livro lançado em setembro nos Estados Unidos e ainda sem data para chegar ao Brasil.

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Trata-se mais de uma biografia maquiada de seu autor, Steve Stoute, que um ensaio sobre o tema. Mas nem por isso, o título, que passou semanas na lista dos mais vendidos do jornal New York Times, é menos interessante para quem deseja entender a relação entre música e marketing. Ou, sob um aspecto mais abrangente, a relação entre cultura e economia.

No começo dos anos 2000, Stoute presidia a divisão de música urbana da gravadora Interscope, onde foi responsável por lançar carreiras bem sucedidas como a da cantora Mary J. Blige e a do rapper Nas. Mas, de uma hora para outra, jogou tudo para o alto e decidiu investir em um palpite que o levou a um mundo até então completamente desconhecido para ele: o da publicidade. Em pouco tempo, o executivo se tornou a maior ponte entre artistas negros e marcas nos EUA, ajudando grifes de roupas, relógios e bebidas a encontrar entre as estrelas do hip-hop o rosto ideal para seus produtos.

Hoje, aos 41 anos de idade, Stoute se coloca como pioneiro de uma mudança estrutural da cultura americana. Este é um dos defeitos do livro. Muitas vezes, o executivo perde a chance de fazer uma análise mercadológica de alto nível para contar detalhes de sua vida pessoal em fases distintas. Mas, afinal, foi isto que fez dele um best-seller.

Stoute nasceu no Brooklyn, bairro de Nova York que é um dos epicentros do rap nos Estados Unidos (o outro fica na Califórnia), e conhece o gênero suficientemente bem para saber que, ao contrário do que os executivos brancos poderiam pensar, do alto de suas confortáveis cadeiras nos arranha-céus de Manhattan, o hip-hop é a música que mais conecta pessoas de todas as raças e classes nos EUA.

É claro que este cenário pode parecer irreal no Brasil, onde o rap é ainda música de minoria – embora Emicida e Criolo tenham dominado as premiações nacionais em 2011, a música popular brasileira hoje, aquela que vende discos e toca nas rádios, é mesmo a sertaneja. Por aqui, o gênero apenas engatinha para o mainstream. Mas, nos EUA, sua grande popularidade data de meados dos anos 1980.

17º: Jay-Z
17º: Jay-Z (VEJA)
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Rap is business – Foi também naquela década que, segundo Stoute, os executivos de marketing perceberam o potencial marqueteiro do hip-hop. Para ele, o ponto de virada foi um show histórico do grupo Run-DMC no Madison Square Garden – a primeira apresentação de rap na casa de shows mais importante do país – em 1986. Naquele dia, durante a música My Adidas, o grupo pediu que quem estivesse calçando um tênis da marca tirasse um dos sapatos e o erguesse. De repente, um mar de gente de 20.000 pessoas ergueu seus tênis de três listras sobre as cabeças. A cena atraiu a atenção dos donos da marca alemã, que na época amargava vendas baixas. Os executivos trataram de oferecer ao grupo uma linha própria de tênis, que logo se tornou um hit entre os jovens americanos, salvando a empresa da falência. Hoje, o grupo Adidas é um dos maiores de roupas esportivas do mundo.

Outras modas vieram à tona com o hip-hop no fim dos anos 1980. Roupas de inspiração africana, joias douradas (chamados de blings), correntes penduradas na carteira e roupas que carregavam as cores da África (vermelho, preto e verde) tomaram as ruas e, é claro, as lojas. Nos anos 1990, vieram os jeans baggy e os casacos com capuzes. Hoje, muitas grifes têm suas próprias linhas ligadas ao estilo, e quase todas são de propriedade de rappers. É o caso da Sean John (do rapper Diddy), da Rocawear (do rapper Jay-Z) e da Phat Farm (de Russell Simons, um dos fundadores da gravadora de hip-hop Def Jam, ao lado de Jay-Z).

Para Stoute, a associação de marcas ao hip-hop, gênero em que música e estilo de vida estão completamente relacionados, era tão natural que era uma questão de tempo até que as empresas o percebessem. “O rap tem uma vantagem sobre as outras culturas. Nenhum músico de outro estilo se gaba tanto do seu poder aquisitivo quanto o rapper. Isso ocorre porque esse músico vem de uma classe social mais baixa, então, ele quer mostrar aos amigos aonde chegou. Conheço milhares de raps que falam a mesma coisa: ‘Olha só o que eu consegui, eu tenho uma BMW'”, escreve o executivo, que também gosta de contar aos outros as suas conquistas.

Entre elas, está uma campanha memorável, a do slogan “Amo muito tudo isso”, da rede de fast-food McDonald’s. Nos Estados Unidos e em outros países, o jingle original, I’m Lovin’ it, era cantado por Justin Timberlake. O jingle, aliás, não era um jingle: era uma música de Timberlake que, sombreada pela fama do McDonald’s, se tornou aos olhos e ouvidos do público uma composição da rede – o que fez o cantor declarar à revista GQ inglesa, alguns anos depois, que se arrependeu de entrar na campanha.

Mas este é um episódio raro em que a conexão do hip-hop com a publicidade gerou consequências negativas. Outros casos, como o do rapper Jay-Z, só tendem a ser benéficos. Em 2006, ele estrelou uma campanha para promover os notebooks da marca HP, na qual ganhou o título de “CEO do hip-hop”. Jay-Z sabe o que faz: “Eu não sou um cara de negócios. Eu sou o negócio, cara”, declarou certa vez. É o que os americanos como Stoute costumam chamar de situação “win-win”. O artista ganha seu dinheiro e a marca vende seus produtos. E, ao mesmo tempo, ambos se tornam conhecidos por um público maior. Todos saem ganhando. Bling.

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