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Por que o BC dos EUA deve continuar a derreter o dólar

Federal Reserve se reúne hoje e amanhã: taxas próximas a zero e injeções na economia devem prevalecer, mesmo que moeda perca força

Por Luisa Purchio Atualizado em 28 jul 2020, 16h55 - Publicado em 28 jul 2020, 16h00

Com a paralisação das economias decorrente da Covid-19, o mundo acionou suas melhores ferramentas para manter seus barcos navegando em águas tão turbulentas. Os Estados Unidos, a maior das economias, recorreram a instrumentos gigantescos para não deixar o seu navio naufragar. As taxas básicas de juros foram derrubadas para zero e trilhões de dólares já foram injetados na economia via benefícios governamentais e títulos públicos. Nesta semana os capitães desse importante navio, cuja força impacta em todo o oceano da economia mundial, atraem a atenção para si. O Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês), do Federal Reserve, se reúne a partir desta terça-feira, 28, para discutir a continuidade de suas estratégias de combate à crise. Sob a presidência de Jerome Powell, as decisões serão anunciadas na quarta-feira, 29, e geram anseio no mercado. A expectativa é que as políticas de incentivo à economia se mantenham: juros próximos a zero e mais injeções de dólar na economia, consequentemente a desvalorização do da moeda frente a seus pares internacionais.

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A política fiscal adotada pelos Estados Unidos segue o modelo keynesiano. Consolidada pelo economista inglês John Keynes na década de 1930, após a crise de 29, a teoria defende a intervenção do Estado na economia para conduzir ao pleno emprego. Em nome da criação de postos de trabalho, se permite aumentar os déficits fiscais em momentos de crise para recuperá-lo quando o crescimento voltar. Isso explica o atual déficit fiscal americano, atualmente em 2,74 trilhões de dólares, 267% maior que o mesmo período do ano anterior. Em conformidade com essa teoria, parte do mercado espera que o Fed crie novos mecanismos que permitam ao banco central comprar ativos de renda variável. “Seria positivo se o Fed aumentasse a compra de ativos já anunciados, ou até mesmo entrasse em outra classe de ativos, como ações. É algo que foi discutido há muito tempo, eles não podem fazer a princípio, mas existem mecanismos para mudar. Isso seria muito positivo para a bolsa”, diz Guilherme Giserman, estrategista internacional da XP Investimentos. Um dos mecanismos criados durante a pandemia, por exemplo, foi a compra de HYGs pelo Fed, ou seja, um ETF com ações de empresas desempenho negativo.

Além disso, há ainda um debate sobre a viabilidade de o Fed negativar a taxa básica da economia. “Eles descartaram essa possibilidade, mas é uma discussão constante no mercado. Temos 13 trilhões de dólares em ativos de renda fixa que geram taxa negativa no mundo, no Japão e na Europa, principalmente na Alemanha”, diz Giserman, da XP. Se os Estados Unidos negativarem suas taxas de juros, atualmente em 0,6% na taxa longa de 10 anos, mais pessoas estariam dispostas a tirar o dinheiro da renda fixa e investir no mercado de renda variável, o que incentivaria a economia.

Por outro lado, taxas básicas de juros tão baixas podem gerar inflação. No último dado divulgado em junho, a inflação americana estava em 0,6%. Isso se explica por causa do atual cenário de deflação do país, causado pelo envelhecimento da população, o aumento da produtividade decorrente do desenvolvimento da tecnologia e a desvalorização da moeda americana. Desde o dia 1º de janeiro, o DXY, índice que mede a força do dólar em relação a uma cesta de seis moedas, caiu 4,5% e desde o dia 20 de março ele caiu 9%. Isso explica o crescimento da busca pelo ouro em detrimento do dólar. Apesar de, por ora, a inflação estar sob controle, os estímulos fiscais dados pelo Fed são sem precedentes e cinco vezes maiores do que os realizados durante a crise do subprime, em 2008.

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Existe, no entanto, uma diferença crucial entre o papel do Fed na crise do subprime e na crise a atual: a solidez dos bancos. Hoje o índice de liquidez dos bancos americanos é muito superior ao de 2008, quando o Fed comprou toneladas de dólar para salvá-los da falência. O nível médio de poupança americano, por sua vez, está bastante alto, mesmo com os juros básicos em níveis historicamente baixos. Em maio de 2020 o índice era de 23,2%, mais que o dobro de janeiro e próximo ao recorde de 24,9%, batido em 1965. Ainda assim, o tema “bancos” deve ser discutido internamente pelo Fed, mas sob uma outra perspectiva. “A grande preocupação do Federal Reverse é a saúde dos bancos americanos e bancos internacionais. Os bancos italianos estão em uma situação difícil, se houver uma quebradeira lá isso certamente repercute nos bancos europeus e americanos. Os bancos chineses também estão com problemas sérios de falta de liquidez e empréstimos podres”, diz Paulo Roberto Feldmann, professor de Economia da USP.

Assim como esperam economistas e analistas em todo o mundo, é quase certo que amanhã o Fed manterá suas taxas em níveis baixíssimos e continuará derretendo o dólar, tendência que deve se manter até a aprovação da vacina contra a Covid-19 e as eleições presidenciais americanas. Após a crise, navegando em águas tranquilas, o país provavelmente reverterá todas estas políticas e se esforçará para aliviar o peso do enorme déficit fiscal que está sendo aberto agora, o que possivelmente deixará o mar revolto em outras economias, sobretudo se transcorrerem enviesadas do protecionismo de um novo governo Trump.

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