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Na contramão da crise, ritmo de vendas de espumantes bate a dos vinhos

Produtos brasileiros receberam mais de 1.700 prêmios nos últimos anos, mas especialistas alertam que medalhas não são único parâmetro de qualidade

Por Giseli Cabrini
Atualizado em 4 set 2018, 19h22 - Publicado em 1 set 2018, 08h38

O espumante nacional, bebida que se diferencia dos vinhos por ser elaborado a partir de duas fermentações alcoólicas que conferem a ele borbulhas naturais, as famosas “bolinhas”, tem motivos de sobra para festejar. A começar pelo bom desempenho comercial: de janeiro a junho, o ritmo de vendas do espumante nacional superou as do vinho tanto no mercado interno quanto no externo

Dentro do país, a venda de espumantes atingiu 4,3 milhões de litros no primeiro semestre, um crescimento de quase 10% frente a igual período de 2017. A comercialização de vinhos totalizou 88,4 milhões de litros, uma retração de quase 1%. As exportações cresceram 61,21% em volume e 29,23% em valores. No caso dos vinhos, houve um avanço de 37,44% e 33,60%, respectivamente.

Uma das principais ações do setor para ampliar as vendas no país tem sido desmistificar a ideia de que o consumo da bebida deva ocorrer apenas em ocasiões festivas, como o fim do ano. “Cada vez mais, o espumante tem ocupado um espaço maior no cotidiano das pessoas uma vez que é uma bebida que combina com o clima do Brasil e com o comportamento mais descontraído do brasileiro”, diz Maurício Salton, presidente da Vinícola Salton.

Na Cooperativa Vinícola Garibaldi, as vendas de espumantes tiveram um salto de 50% só no primeiro semestre. No ano passado, o avanço foi de 37%, acima da média do mercado. “Além das características particulares do produto nacional, há outros fatores que estimulam as vendas de espumantes como o fato de que internamente se trata de uma categoria de consumo ainda nova com muitas oportunidades, além das premiações”, avalia o presidente da Garibaldi e do Ibravin, Oscar Ló.

Um sinal de que a bebida se popularizou é que agora ela pode ser encontrada o ano todo no varejo, até mesmo em lojas de vizinhança e de conveniência, o que não ocorria antigamente quando as garrafas estavam presentes apenas perto do Natal e Réveillon.

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Para Salton, a maior aceitação do espumante pelos consumidores brasileiros também demonstra que a bebida, ao contrário do vinho nacional, não carrega o estigma ter qualidade inferior em relação aos rótulos importados.

Atualmente, as exportações têm pequena participação nas vendas totais da categoria, mas são importantes para consolidar a qualidade do produto tanto lá fora quanto aqui dentro. Proveniente de um diferenciado terroir – ambiente natural de uma região produtora que garante à bebida uma especificidade única – na avaliação de especialistas e fabricantes, o “líquido borbulhante” brasileiro alcançou uma qualidade sensorial que o faz disputar em pé de igualdade a preferência de consumidores daqui e do exterior frente a outros tipos de espumantes como astis, cavas, proseccos, sekts e até mesmo champanhes (veja arte abaixo).

“Por mais que as pessoas comparem produtos de terroirs diferentes, não é correto. Champanhe é um produto mais maduro e muito mais caro. Cava não é fresco como o brasileiro. Prosecco é um líquido sem longevidade devido à leve estrutura. O espumante brasileiro é um rótulo muito fresco, com a cara do Brasil. Não existem produtos similares produzidos pelo mundo”, afirma o presidente da Associação Brasileira de Enologia (ABE), Edegar Scortegagna.

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O diretor da Associação Brasileira de Sommeliers de São Paulo (ABS-SP), Guilherme Velloso, explica que cada bebida é única por estar ligada a uma região de origem diferente. “Uma mesma uva se expressa de forma diferente devido ao terroir, que é o fator que confere à identidade do vinho seja ele tranquilo ou espumante. Isso significa que o espumante nacional tem uma personalidade própria que está sendo descoberta e apreciada pelas pessoas que consomem esse tipo de bebida.”

Para o presidente da Vinícola Salton, Maurício Salton, o terroir da Serra Gaúcha possui características como altitude e maior precipitação. O solo é mais pedregoso o que permite uma maior drenagem dos vinhedos. “As uvas brancas que compõem a bebida tiveram uma aclimatação excelente o que resulta em uma maior consistência entre as safras. Já o Chile e a Argentina possuem clima mais seco e quente, o que faz com que a bebida perca frescor e acidez.”

Segundo especialistas e fabricantes, além das particularidades do terroir, pesam no desempenho do espumante nacional fatores como condições de manejo da produção, investimentos em tecnologia e ações de marketing para promover o consumo dentro e fora do país.

As principais áreas de produção de espumantes são a Serra Gaúcha, a Campanha Gaúcha, a Serra do Sudeste e os Campos de Cima de Serra – todos localizados no Rio Grande do Sul. As outras regiões são o Planalto Catarinense e o Vale do São Francisco (entre os estados da Bahia e Pernambuco).

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A safra das variedades utilizadas para a elaboração de espumantes no Rio Grande do Sul costuma ser iniciada no fim de dezembro, dependendo das condições climáticas ao longo do ano, e se estende até fevereiro, de acordo com as áreas de produção. No Nordeste é possível colher essas variedades em qualquer período, já que na região ocorrem 2,5 safras por ano.

Os métodos de fabricação de espumantes usados no Brasil são o Charmat (com a segunda fermentação em tanque) e o método tradicional ou Champenoise (com a segunda fermentação na própria garrafa). No caso de espumantes moscatéis é realizada uma única fermentação dentro de um grande recipiente (autoclave) que conserva a presença do anidrido carbônico, responsável pelas borbulhas naturais, seja eliminado. Ele também é conhecido por ser elaborado pelo método Asti, criado na região piemontesa de mesmo nome, na Itália.

Certificações de origem

Outra variável que pode colaborar para consolidar a qualidade do espumante nacional é a busca por certificação de origem, uma espécie de assinatura que atesta a qualidade de cada terroir de nosso país.

O reconhecimento de Indicações Geográficas (IG) de vinhos brasileiros tem por objetivo valorizar produtos tradicionais de determinados territórios, possibilitando a proteção da região produtora e garantindo aos consumidores vinhos diferenciados, atendendo a requisitos específicos de produção. Cada indicação está vinculada a uma associação de produtores que atua na sua gestão, incluindo o controle, a proteção e a promoção.

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No Rio Grande do Sul, a Associação dos Produtores de Vinhos Finos da Campanha Gaúcha deverá receber neste ano o reconhecimento de indicação geográfica para a zona produtora que abrange a fronteira do Brasil com o Uruguai. Em outro extremo do Brasil, os produtores ligados ao Instituto do Vinho Vale do São Francisco (VinhoVasf) buscam a certificação para o Vale do Submédio São Francisco. Conforme novas regiões vinícolas vão se desenvolvendo no país, são esperados mais pedidos de indicação geográfica.

No Brasil, existem duas modalidades de Indicações Geográficas: a Indicação de Procedência (IP) e a Denominação de Origem (DO). A IP se aplica às regiões que se tornaram reconhecidas na produção de vinhos. Já na DO, os vinhos apresentam qualidades ou características que se devem essencialmente ao meio geográfico, incluídos os fatores naturais e humanos.

Pioneiro na busca por regras de certificação, o Vale dos Vinhedos foi a primeira zona produtora a receber a denominação de origem para vinhos no Brasil. A conquista ocorreu em 2012, exatos dez anos após a região alcançar o status de indicação de procedência, pré-requisito exigido pelo INPI para a concessão da denominação de origem.

Premiações

Os espumantes brasileiros conquistaram quase 1,7 mil medalhas só nos últimos dez anos, segundo o Ibravin. O espumante Garibaldi Moscatel, da Cooprativa Garibaldi, por exemplo, recebeu a medalha Gran Ouro no concurso Catad’Or Wine Awards, realizado em Santiago, no Chile.

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Mas as medalhas sozinhas não são o único parâmetro de qualidade, já que muitos produtos não enviam seus espumantes para as competições. “O que não podemos esquecer é que os produtos enviados para degustação representam a minoria vendida no Brasil. Existem muitos vinhos e espumantes de qualidade igual ou até superior aos premiados. O que ocorre é que nem todas vinícolas enviam amostras para o concurso pelo custo ou por filosofia”, ressalta Scortegagna, da ABE.

Segundo o Ibravin, nem todas as empresas têm recursos disponíveis para realizar a inscrição nos concursos e degustações – em especial as de menor porte –, e muitas delas produzem ótimos produtos.

Para o diretor da ABS-SP, Guilherme Velloso, os concursos funcionam mais como divulgação e têm pouca importância para quem é conhecedor do produto. “A participação é válida como forma de comparação, mas não é isso que, de fato, irá determinar a qualidade final devido à grande quantidade de concursos e premiações que possuem critérios de avaliação às vezes não muito rigorosos. Mas como estratégia de marketing para consolidação de marca, a premiação tem sua importância.”

 

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