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Alexandre Schwartsman: Resultado esperado, mas ainda frustrante

Em análise do PIB para VEJA, economista afirma que recuperação tem sido fraca na comparação com outros períodos que se sucederam a recessões

Por Alexandre Schwartsman
30 Maio 2019, 16h37

Não houve surpresa desta vez com o crescimento do PIB. A projeção média dos analistas apontava para queda de 0,2% do produto no primeiro trimestre do ano em comparação com o último de 2018 (já ajustado à sazonalidade) e foi exatamente este o número que o IBGE divulgou nesta quinta-feira, 30.

Interrompe-se, portanto, a sequência de 8 trimestres de expansão que se seguiram aos 11 trimestres de contração, mas, se o leitor não percebeu o crescimento, a culpa certamente não é sua. Desde que foi decretado o fim da recessão, no final de 2016, o produto cresceu pouco mais de 3%, o que corresponde a uma expansão média de 1,4% ao ano, quase imperceptível para efeitos práticos.

A recuperação do Brasil tem sido muito fraca na comparação com outros períodos que se sucederam a recessões. Mesmo se compararmos apenas às duas grandes recessões que sofremos nos últimos 40 anos, no começo dos anos 80 (por causa da crise da dívida) e no começo dos anos 90 (cortesia dos nossos heterodoxos que criaram o Plano Collor), a atual recuperação perde de lavada: no primeiro caso, 9 trimestres após atingir o fundo do poço o PIB superava o pior momento da recessão por pouco mais de 12%, enquanto no segundo a recuperação emplacava 8% de crescimento, uma marca respeitável.

A fraqueza fica mais patente nos dados mais recentes e pelo mesmo motivo: o investimento, que segue abatido e sem sinais de reversão até onde se pode ver. É verdade que o consumo também perdeu fôlego, crescendo modestos 0,3% no começo de 2019, mas, bem ou mal, conseguiu recuperar cerca de 60% das perdas registradas durante a recessão; em contraste, o investimento mal cobriu 10% das perdas no período, e, se considerarmos que começou a cair já em meados de 2013, o desempenho consegue ser ainda pior.

Por que o investimento não deslancha? Parte da história é esperada: depois de uma recessão profunda, como a enfrentada entre o começo de 2014 e o final de 2016, há muita capacidade ociosa, não só na indústria, mas em geral, reduzindo a urgência de criação de nova capacidade por meio do investimento. Isto, contudo, também era verdade em seguida às outras grandes recessões e, mesmo assim, a economia se recuperou de forma mais vigorosa, o que indica haver também outras forças em campo.

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No meu entendimento, o nó que impede destravar o investimento se encontra nas contas públicas. Não é segredo que temos uma trajetória complicada de endividamento do governo: era da ordem de 50% do PIB há cinco anos e hoje se aproxima de 80%. Mesmo que o teto de gastos inscrito na constituição seja respeitado (uma questão nada trivial, como argumentarei), a dívida não pararia de crescer com relação ao PIB (ainda mais com o crescimento baixo deste último) até, pelo menos, 2022-2024, na casa de 85-90% do PIB.

A manutenção do teto, todavia, requer a aprovação de reformas adicionais, principalmente da previdenciária, pois, da forma como o regime funciona hoje, a expansão do gasto previdenciário obrigaria a reduções ainda mais drásticas das despesas discricionárias do governo, provavelmente inviabilizando seu funcionamento, ou, mais provavelmente, o teto de gastos ainda antes da estabilização da dívida.

A incapacidade do mundo político de produzir estas reformas, ecoando talvez a incapacidade da sociedade brasileira de fazê-lo, fenômeno que não vem de hoje, mas desde o começo de 2015 pelo menos, é o que trava o investimento. O resultado é o que vemos: o PIB patina e, mesmo que não entremos em nova recessão por agora, não há como ficar otimista.

Caso este raciocínio esteja correto, enganam-se também os que imaginam que uma reforma desidratada resolveria o problema. Ao contrário, apenas empurraríamos a decisão para alguns anos à frente, mantendo a incerteza acerca do estado das contas públicas e, assim, o investimento permaneceria travado.

É verdade que, do lado do mercado de trabalho, as notícias, embora ruins, estão melhorando: o desemprego tem caído lentamente, o emprego formal cresce (também devagar), mas o ritmo tem sido decepcionante. Se vale o observado nos últimos seis anos, não parece ser necessário crescer muito para reduzir o desemprego: em média, quando o crescimento do PIB supera 1%, o desemprego cai. Como, porém, a diferença tem sido pequena (quando não existente), a queda do desemprego também é modesta.

Dados os resultados do primeiro trimestre parece difícil atingirmos até mesmo o baixo crescimento do PIB registrado nos dois últimos anos, a menos de revisões significativas dos dados passados. De fato, para o que o PIB de 2019 cresça 1% na comparação com 2018 será necessário que, nos três trimestres remanescentes deste ano, o crescimento atinja, em média, 0,55% por trimestre (ou seja, 2,2% ao ano). Não parece muito até lembramos que o crescimento médio da economia do final de 2016 para cá não chegou a 1,5% ao ano, e que nos últimos trimestres tem sido, em média, ainda inferior a isto.

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Assim, o mais provável, considerando o cenário político, é um crescimento entre 0,5% e 1% em 2019, o que sugere desemprego estável e ainda elevado, no máximo com pequena redução.

Assim, do ponto de vista da inflação, em que pesem os efeitos de alimentos e combustíveis, que devem levá-la pouco abaixo da meta para este ano (4,25%), as perspectivas para 2020 sugerem que esta deverá ficar abaixo da meta para aquele ano (4%). Sob tais circunstâncias, o BC deve promover nova rodada de redução de juros para evitar este resultado.

Isto dito, dificilmente isso teria efeitos significativos já em 2019. Como notado, teremos mais um ano de baixo crescimento, reflexo da nossa incapacidade de resolver nossos próprios problemas.

 

Alexandre Schwartsman, 56, é doutor em Economia pela Universidade da Califórnia, Berkeley e ex-diretor do Banco Central do Brasil (www.schwartsman.com.br, @alexschwartsman, e aschwartsman@gmail.com).

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