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A nova – e promissora – ciência do sangue

Na semana passada, a ciência se aproximou da detecção do Alzheimer e do câncer por meio de exames de sangue. O avanço na compreensão dos biomarcadores permite que uma gota da substância que percorre nossas veias se torne uma fonte inesgotável de informações sobre o corpo humano

Por Marco Túlio Pires
9 jan 2011, 10h42

Os novos exames de sangue podem substituir ou evitar que procedimentos dolorosos e invasivos, como as biópsias, sejam realizados sem necessidade

Doenças antes indetectáveis por meio de exames, como o Alzheimer e o autismo, em breve estarão ao alcance de uma gota de sangue

Qualquer pessoa que já tenha se submetido a um check-up comum sabe da riqueza de informações que um exame de sangue fornece aos médicos. Uma amostra ínfima dos cerca de 5 litros de sangue que, em média, circulam pelo corpo de um adulto, revela a invasão do organismo por parasitas, vírus e bactérias, a carência de nutrientes essenciais ao funcionamento dos órgãos ou a presença de substâncias que podem prejudicá-los. Na semana passada, duas notícias serviram de lembrete para um fato extremamente positivo: a ciência do sangue continua a progredir em grande velocidade, e oferece possibilidades extraordniárias de diagnóstico e monitoramento. Como mostra o quadro abaixo, a detecção de doenças que antes requeriam procedimentos muito mais complicados e invasivos já pode, em diversos casos, ser feita por meio desse exame indolor (está bem, “agulhofóbicos”: quase indolor). Novas técnicas deixarão em breve de ser experimentais e chegarão aos hospitais e laboratórios.

A primeira novidade ligada aos exames de sangue veio na última segunda-feira, quando pesquisadores do Hospital Geral de Massachusetts, nos Estados Unidos, firmaram uma parceria de 30 milhões de dólares com a empresa Johnson & Johnson para viabilizar um teste capaz de detectar uma célula cancerígena entre bilhões de outras saudáveis. A segunda notícia, divulgada na sexta-feira, foi a de que cientistas do Instituto de Pesquisa Scripps, na Flórida (EUA), desenvolveram um teste capaz de detectar com precisão o Alzheimer. Atualmente, a doença só é detectada quando o paciente apresenta sintomas, e mesmo assim só é possível confirmá-la após análise do cérebro depois da morte.

Substância dedo-duro – Esta nova geração de exames surgiu na esteira do sequenciamento do genoma humano, em 2000, e do aparecimento de novas técnicas de análise de substâncias químicas, a partir de 2005, que permitiram que os médicos acelerassem a complicada tarefa de vasculhar o sangue atrás de substâncias conhecidas como biomarcadores.

Os biomarcadores são, em geral, proteínas específicas que o corpo produz por causa de alguma doença. Em alguns casos, o biomarcador pode ser uma célula ou um fragmento do material genético do paciente.

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“A busca por biomarcadores ocorre há pelo menos 30 anos, mas sempre foi uma tarefa muito difícil. A tecnologia deixou esse processo menos complicado, possibilitando o surgimento de novos exames”, diz o médico americano Robert Christenson, diretor do laboratório de biomarcadores da Universidade de Maryland (EUA).

O sangue fala
O sangue fala (VEJA)

Rede de pesca – Para saber se o paciente está doente, os cientistas misturam o sangue com uma substância química que só reage ao entrar em contato com o biomarcador da doença que estão examinando. É como uma rede de pesca que só aprisionasse um tipo específico de peixe. Caso o peixe – o biomarcador – fique preso, quer dizer que o paciente tem a doença.

Um dos biomarcadores mais assediados pelos médicos são os anticorpos, substância formada por proteínas e produzida pelo sistema imunológico para combater organismos invasores ou células cancerígenas. Se o corpo está doente, ele provavelmente irá produzi-los.

Cientistas do mundo todo estão procurando por esses “peixes”. Um deles foi encontrado em 2007 pela médica americana Mary Whooley, da Universidade da Califórnia (EUA). A equipe da pesquisadora conseguiu identificar um tipo específico de proteína que passava a ser liberada em pacientes que já haviam sofrido ataque cardíaco quando estavam sob stress. O exame desenvolvido é capaz de prever o risco do paciente sofrer novo ataque. “A vantagem é que, para monitorarmos a doença, não precisamos colocar um pedaço de metal dentro do paciente ou submetê-lo à radiação”, afirma Whooley.

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DNA – O oncologista romeno Victor Velculescu, da Universidade Johns Hopkins (EUA), publicou no início de 2010 um estudo dizendo que o material genético das células cancerígenas possui padrões de DNA específicos. “Muitas vezes, esse material é arremessado na corrente sanguínea tornando possível identificar o câncer mesmo quando não se consegue pelas vias normais”, explica Velculescu. “Esperamos que em cinco anos o exame esteja disponível para os pacientes”, diz.

Até a identificação de doenças de difícil diagnóstico, como o autismo, poderá ser facilitada com os exame de sangue em um futuro próximo. O médico britânico Anthony Monaco, chefe do laboratório de neurogenética da Universidade de Oxford, conseguiu encontrar uma relação entre o DNA e o autismo. De acordo com Monaco, existe uma diferença marcante entre o material genético de pessoas saudáveis e as que manifestam o problema. Nas doentes, alguns pedaços de DNA são duplicados ou apagados, alterando o comportamento de alguns genes, o que contribui para a manifestação do autismo. “Quanto mais cedo conseguirmos identificar que uma pessoa possui autismo, melhores serão as condições de tratamento e entendimento da doença”. O médico acredita que em três anos será possível ter um exame confiável que ajudará no diagnóstico.

Cura – Muitos médicos acreditam que os novos exames de sangue podem, ao menos indiretamente, encurtar o caminho para a cura de várias doenças. “As pesquisas que buscam entender o sangue e os biomarcadores nos dão condições de aprender mais sobre as doenças”, diz Christenson. Além disso, os exames de sangue ajudam a monitorar a evolução das doenças, acrescenta Velculescu. “Isso é muito importante para descobrir tratamentos que levam à cura”, completa.

Em geral, afirma a médica Lecia Sequist, da escola de medicina de Harvard – uma das pesquisadoras envolvidas com o dispositivo que detecta células cancerígenas -, as novas pesquisas também estão tentando entender a genética humana. “Quais seriam os genes das doenças?”, pergunta a médica. “Poderemos aprender sobre a predisposição genética das pessoas por meio dos exame de sangue. Estamos apenas no início, ainda temos muito a aprender.”

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