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Passaporte para a impunidade

A reforma política deveria propor soluções para as mazelas. Mas não. Entre outros absurdos, tenta criar um salvo-conduto para candidatos enrolados

Por Felipe Frazão, Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 22 jul 2017, 06h00 - Publicado em 22 jul 2017, 06h00

O roteiro é surrado. A cada crise que protagonizam, deputados e senadores prometem aprovar uma reforma política. As motivações são sempre nobres: acabar com os partidos de aluguel, reduzir o número excessivo de legendas, ceifando o convite ao fisiologismo, e fechar as brechas que permitem relações cavilosas entre interesses públicos e privados. Sob o manto dessas iniciativas saneadoras, os parlamentares querem mesmo é resolver seus problemas e, de quebra, pavimentar o caminho para a própria reeleição. Em tempos de Lava-Jato, o enredo está se repetindo com maior ímpeto. Relator da reforma política na Câmara, Vicente Cândido (PT-SP) incluiu em seu parecer uma regra que amplia dezesseis vezes o prazo de imunidade temporária desfrutada por candidatos. Hoje, eles não podem ser presos a partir do 15º dia que antecede ao da eleição. O relator quer que esse salvo-conduto comece a valer até oito meses antes do pleito. Assim que os políticos obtivessem da Justiça Eleitoral, em fevereiro de 2018, um certificado prévio de habilitação para concorrer, a imunidade começaria a funcionar. Incluída à sorrelfa no relatório, a medida logo foi batizada de “Emenda Lula”.

Amigo do ex-presidente desde antes da fundação do PT, diretor da CBF e protagonista recorrente de tramas que envolvem os interesses de grandes corporações, Vicente Cândido formalizou a ideia um mês e meio antes de o juiz Sergio Moro sentenciar Lula a nove anos e meio de prisão, quando a condenação já era aguardada. Lula só cumprirá a pena na cadeia caso o Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região ratifique a decisão. Se a emenda de Cândido passar, eventual condenação de Lula no TRF só terá efeito prático se for proferida antes de fevereiro de 2018, o que é considerado pouco provável. Com a candura digna de seu nome, o relator credita à maldade alheia o epíteto pespegado à sua iniciativa: “Lula nem sabia de nada. É uma maldade da mídia. Eu queria evitar o abuso de autoridade. Alguém que já tem processo instaurado e que, porventura, um tribunal pode vir a sentenciar no meio da campanha eleitoral não se enquadraria”. Além dessa ressalva, o deputado petista garante que sua iniciativa é uma tentativa de proteger todos os candidatos da extrema “judicialização da política” — como se houvesse candidato sendo preso de norte a sul do país.

“Emenda Temer” – Mansur: entusiasta de uma saída negociada (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Cândido aposta no espírito de corpo. Eterno pré-candidato a governador da Bahia, o ex-ministro Geddel Vieira Lima, hoje em regime de prisão domiciliar, também poderia se beneficiar da emenda. Seu irmão, o deputado Lucio Vieira Lima (PMDB-­BA), é o presidente da comissão da reforma política. Investigados pela Lava-Jato, os presidentes do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-­CE), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), dizem que a “Emenda Lula” será rejeitada. A decisão final, no entanto, não cabe aos dois, mas ao plenário das duas Casas. A busca por blindagem é uma prática recorrente entre os parlamentares enrolados. Eles já tentaram aprovar uma anistia ao caixa dois e, recentemente, um pequeno grupo discutiu a possibilidade de estender o foro privilegiado a ex-­presidentes da República — beneficiando Lula agora e Temer daqui a pouco. A ideia foi aventada como uma “saída negociada” em troca da renúncia de Temer, logo depois da delação da JBS. Entre seus entusiastas naquela época estava o deputado Beto Mansur (PRB-SP), um dos principais aliados de Temer no Congresso. Como o peemedebista decidiu lutar pelo cargo, a ampliação do foro foi deixada em banho-maria.

Publicado em VEJA de 26 de julho de 2017, edição nº 2540

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