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50 anos depois, a questão: JFK seria mito sem a tragédia?

Reportagem de VEJA desta semana mostra que, a julgar pelas suas ideias e ações, é provável que Kennedy faria o mesmo que Johnson, afundando os EUA no Vietnã e dando apoio ao golpe no Brasil

Por Duda Teixeira Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 22 nov 2013, 10h12

Da mente de escritores e roteiristas surgiu um curioso gênero de ficção, a história alternativa. Em vez de levantar fatos e interpretá-los, a proposta é descaradamente modificar um único acontecimento, manter os demais e imaginar o que teria acontecido a partir desse ponto. Trata-se da brincadeira do “e se…”, que historiadores sérios só fazem entre amigos íntimos. E se os nazistas tivessem vencido a II Guerra? E se Getúlio Vargas não tivesse se suicidado? Nos Estados Unidos, um dos exercícios preferidos é imaginar como teria sido se John Kennedy tivesse sobrevivido ao atentado em Dallas, em novembro de 1963. Elucubrar sobre o que aconteceria nos dias e meses seguintes não seria tão difícil. O americano Bryce Zabel, por exemplo, autor do livro Surrounded by Enemies (Cercado por Inimigos), lançado em julho passado nos Estados Unidos, imaginou que, se estivesse vivo, Kennedy não perderia a chance de se encontrar com os integrantes da banda inglesa The Beatles quando esta fosse se apresentar no programa de TV de Ed Sullivan, em fevereiro de 1964. À medida que o tempo passa e mais episódios vão se somando à narrativa, porém, a história alternativa vira um jogo de adivinhação.

A morte de Kennedy é um dos fatos históricos que mais renderam livros, quadrinhos e filmes que tentam reescrever os rumos dos acontecimentos. No livro Novembro de 63, de Stephen King, recém-lançado no Brasil, um professor viaja no tempo, retornando a setembro de 1958. Cinco anos depois, consegue distrair Lee Harvey Oswald, o “candidato” a assassino do presidente, fazendo-o errar o alvo. Na imaginação de King, Oswald é, em seguida, morto pelo serviço secreto. Kennedy é reeleito em 1964, mas dá lugar em 1968 ao democrata segregacionista George Wallace, que transforma a Guerra do Vietnã em um conflito nuclear. King é um pessimista, assim como Zabel, que em seu livro supõe que Kennedy sofreria um impeachment depois que seus casos de infidelidade, tratamentos médicos e diversos negócios escusos fossem revelados pela imprensa. Outros autores, porém, são mais sonhadores e ingênuos. Segundo James Blight, Janet Lang e David Welch, que escreveram Vietnam If Kennedy Had Lived (O Vietnã Se Kennedy Tivesse Vivido), o presidente tiraria os soldados do Vietnã, domaria a União Soviética e ficaria amigo dos ditadores cubanos. A ideia de que ele faria tudo certo e que a ordem global tomaria um rumo pacífico e harmônico tem sua razão de ser. Ao morrer de forma brusca e ainda jovem, aos 46 anos, JFK transformou-se em um mártir. Para seus admiradores, não há dúvida de que o mundo teria sido um lugar melhor com ele. Daí a noção de que Kennedy teria poupado os Estados Unidos de seu maior fracasso geopolítico, a Guerra do Vietnã. A hipótese só tem cabimento em um universo paralelo. Foi Kennedy quem, de fato, enfiou o seu país na lama do conflito asiático. Além disso, bater em retirada seria um suicídio eleitoral. “Nenhum presidente democrata poderia se mostrar fraco com a União Soviética naquela época. Se fizesse isso, perderia o pleito seguinte na certa”, diz o historiador americano Andrew Wiest. O irmão Robert Kennedy, confidente do presidente e procurador-geral, não deixou dúvidas sobre as intenções de John em uma entrevista (real) concedida em abril de 1964. “O presidente tinha uma razão forte, decisiva, para estar no Vietnã e pela qual deveríamos ganhar a guerra”, disse Bobby. Essa razão era o medo generalizado de que a teoria do dominó se concretizasse: caso o Vietnã caísse nas mãos dos comunistas, todo o sudeste da Ásia teria o mesmo destino.

E, se Kennedy tivesse sobrevivido, teria ele sido contrário ao golpe que derrubou o governo brasileiro de João Goulart, em 1964? Lyndon Johnson, o vice que assumiu a Presidência após a morte de JFK, preparou um reforço militar para o caso de haver resistência à deposição de Jango: um avião carregado com armamentos estava pronto para decolar dos Estados Unidos rumo ao Brasil, se necessário. Não foi, como se sabe. Com Kennedy, não teria sido diferente. Ele estava insatisfeito com a nomeação de comunistas para o governo de Goulart. O brasileiro se declarava contra o embargo americano a Cuba e se aproximou do bloco soviético. Poucos meses após o assassinato em Dallas, em conversas com o historiador Arthur Schlesinger, a viúva Jacqueline Kennedy falou sobre como o marido via o brasileiro: “Ele pensava que Goulart era desonesto. Goulart estava realmente bagunçando tudo, não? Na economia e os comunistas. Acho que ele (Kennedy) pensava que ele (Goulart) era um falso e um ladrão”. Voltar no tempo para salvar Kennedy, mesmo na ficção, não seria a maneira mais convincente de apagar o golpe militar da história do Brasil.

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