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‘Armamentos enviados a rebeldes líbios poderiam acabar até nas favelas do Brasil’

Diretor do Projeto de Monitoramento de Venda de Armas americano diz que, uma vez no mercado negro, armamentos têm circulação global – e por isso é preciso pensar duas vezes antes de distribuí-los na Líbia

Por Nana Queiroz
11 abr 2011, 16h08

“É preciso lembrar que o comércio ilegal de armas é global. Teoricamente, um armamento que entra no mercado negro em um lugar poderia terminar em qualquer outra parte do mundo”, diz Schroeder

As fotos dos conflitos na Líbia parecem anúncio de um saldão da Guerra Fria. São um desfile de rifles, metralhadoras e granadas propelidas por foguetes fabricados por russos e americanos nos anos 70 e 80. Agora, os países ocidentais envolvidos na intervenção militar discutem enviar mais material bélico aos rebeldes, para que eles derrubem o ditador Muamar Kadafi. EUA, Grã-Bretanha ou França não negam que a ideia esteja sob consideração. A Itália foi ainda mais longe e prometeu enviar o aparelhamento de combate necessário. Mas onde é que essa artilharia iria parar ao fim do conflito? “Os armamentos doados aos insurgentes quase certamente serão desviados”, alerta Matt Schroeder, diretor do Projeto de Monitoramento de Venda de Armas da Federação dos Cientistas Americanos. E, uma vez no comércio ilegal, esses equipamentos militares podem chegar a qualquer outro comprador no globo que esteja disposto a pagar o preço – até mesmo nas favelas brasileiras. Confira trechos da entrevista que Schroeder concedeu ao site de VEJA.

Matt Schroeder, diretor do Projeto de Monitoramento de Venda de Armas da Federação dos Cientistas Americanos
Matt Schroeder, diretor do Projeto de Monitoramento de Venda de Armas da Federação dos Cientistas Americanos (VEJA)

É uma boa ideia mandar armas aos rebeldes líbios? As autoridades americanas e seus aliados estão em uma posição difícil. Parte dos armamentos doados aos insurgentes quase que certamente será desviada para o mercado negro ao fim do conflito. Por outro lado, se os governos envolvidos na intervenção militar não enviarem material bélico aos insurgentes ou terceirizarem esse trabalho (o que parece estar sendo considerado), eles perderiam controle sobre o processo. Os rebeldes, obviamente, precisam de armas neste momento e as comprarão por caminhos legais ou ilegais – e o último caso aumentaria as chances de desvios.

Que riscos essa artilharia representaria mais tarde para o mundo? Parte desse material seria inofensiva, como peças para veículos militares ou equipamentos de comunicação. Mas há armas que não devem jamais ser oferecidas, como mísseis portáteis de última geração. Se desviados, a ameaça que esses armamentos representam é simplesmente grande demais para quese possa arriscar. Especialmente se considerarmos a completa desorganização dos rebeldes. Há muito pouca informação pública que sugira que eles são capazes de controlar o destino dessas armas.

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Há grupos terroristas que atuam na região e que poderiam adquiri-las? O risco mais imediato é representado pela Al Qaeda no Magreb Islâmico, braço do grupo extremista na Nigéria. Há relatos de autoridades de diferentes partes da África que dizem que essa organização já se aproveitou do caos na Líbia e adquiriu armas.

Terroristas investem em atentados, não em insurgências. Isso faz com que enviar metralhadoras e rifles seja um risco menor? Essas armas representam ameaças diferentes a pessoas diferentes. Um míssil lançado do ombro, usado para abater tanques ou alvos aéreos, é uma grande ameaça a aviões civis e militares, mas seria de pouco uso a um ladrão de rua. Já um rifle representa um risco enorme a populações de refugiados, cidadãos em áreas de grande criminalidade etc. É preciso lembrar que o comércio ilegal de armas é global. Teoricamente, um armamento que entra no mercado negro em um lugar poderia terminar em qualquer outra parte do mundo. Isso só depende do tipo de arma, da demanda por ela e das conexões entre grupos e infraestrutura para entregá-la.

Essas armas poderiam parar no Brasil? Possivelmente. Claro que não faria sentido que os criminosos brasileiros importassem armas comuns da Líbia já que eles têm fornecedores locais mais acessíveis e baratos. Porém, se há um tipo raro e muito desejável de equipamento que não está disponível em seu mercado tradicional, essa é uma possibilidade concebível.

Se os países ocidentais decidirem mandar armas, o que devem fazer para evitar que desvios aconteçam? Primeiro, certificar-se de que as quantidades fornecidas são adequadas para as necessidades imediatas da operação. Excesso de armas é um facilitador para desvios. Depois, monitorar essas armas o mais extensivamente possível e deixar de enviá-las para aquelas unidades que não conseguirem rastreá-las. Pode-se registrar os números de série. Com isso, se elas pararem nas mãos erradas é possível identificar de onde vieram. Também é necessário considerar os grupos que atuam na região. Por exemplo: se determinada organização terrorista normalmente usa um certo tipo de armamento, você não vai querer distribuir peças e munições para essa arma na Líbia. Os governos envolvidos também podem solicitar a ajuda dos rebeldes para localizar itens preocupantes que já foram perdidos. E nós temos muitas evidências de que mísseis lançados do ombro, que os rebeldes tomaram de arsenais do governo, estão agora fora de rastreamento. Essas medidas básicas podem não ser infalíveis, mas é preciso aplicá-las. Finalmente, devemos, em caso de vitória dos insurgentes, pedir certos armamentos de volta. Todas as medidas de controle devem ser tentadas.

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