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Um Bolívar antibolivariano

Por Simon Romero E María Eugenia Díaz, The New York Times
29 out 2011, 08h09

Hugo Chávez, presidente da Venezuela, transformou Simón Bolívar, o aristocrata do século 19 que libertou boa parte da América do Sul da Espanha, na figura central de uma ideologia estatal ‘bolivariana’, invocando seu espírito, exumando seu sarcófago e começando a construir um novo mausoléu, em formato de navio, para seu herói neste ano. Porém, numa reviravolta no esporte de contato que é a política venezuelana, um dos mais fortes desafiantes na missão de derrotar Chávez na eleição presidencial do ano que vem é um ativista com sangue de Bolívar nas veias: Leopoldo López, um aristocrático economista que estudou em Harvard e é descendente de Juana, irmã do Libertador.

A campanha de López se tornou possível graças a uma determinação, de setembro, da Corte Interamericana de Direitos Humanos, estabelecendo que o governo venezuelano deve retirar uma desqualificação que o impedia de disputar eleições. López argumentou que a desqualificação era discriminação política. Ela fora imposta por autoridades a favor de Chávez em função de processos legais da época em que ele fazia parte de uma organização sem fins lucrativos e como prefeito de Chacao, um dos distritos de Caracas.

Certamente, havia uma condição depois que as instituições do governo de Chávez reagiram à decisão da Corte Interamericana, entidade jurídica da Organização dos Estados Americanos. Numa decisão recente, a Suprema Corte da Venezuela pareceu sustentar a desqualificação de López.

A Suprema Corte, controlada por juízes leais a Chávez, chamou a decisão da Corte Interamericana de ”inexecutável”. Mas Luisa Estella Morales, presidente da corte venezuelana, também afirmou que López ”pode livremente se candidatar e participar das eleições”, inclusive a do ano que vem, embora tenha se abstido de dizer se ele poderia exercer o cargo caso fosse eleito presidente.

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López, 40 anos, sabe operar dentro das zonas nebulosas da política da Venezuela, país que realiza eleições e a crítica pública é centrada em Chávez, mas também onde burocratas perseguem líderes oposicionistas com ameaças legais e os reguladores multam organizações noticiosas independentes, evidenciado pela penalidade de US$ 2 milhões imposta recentemente à rede de televisão Globovisión por noticiar revoltas com mortes na prisão.

”O estado procura desqualificar quem busca uma alternativa por meio de um assassinato implacável da personalidade”, disse López durante entrevista. ”Eles têm medo de mim porque posso vencer”.

López, produto da elite americanizada da Venezuela, se formou no Kenyon College, em Ohio, e fez mestrado em políticas públicas na Universidade Harvard. Casado com Lilian Tintori, ex-apresentadora de televisão e campeã de kitesurf, sua formação privilegiada contrasta de forma acentuada com a de Chávez, ex-oficial do exército que saiu da pobreza para criar um movimento político que afeta a influência dos Estados Unidos na América Latina.

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Entretanto, López parece ter adotado algumas estratégias de Chávez, que fortaleceu um movimento político popular na década de 1990 depois que liderou um golpe fracassado em 1992. López viajou para longe da capital, Caracas, montando um movimento nacional chamado Vontade Popular, que se transformou num partido político de centro.

López, que raramente anuncia os laços familiares com Bolívar, ganhou projeção nacional durante seus oito anos como prefeito de Chacao, distrito relativamente próspero de Caracas. Ele foi eleito para o segundo mandato em 2004 com 80 por cento dos votos, depois de reformar as escolas locais e o sistema de transporte público.

Durante um golpe caótico em 2002, que tirou Chávez brevemente do cargo, López atraiu a ira dos apoiadores do presidente ao participar da prisão de Ramón Rodríguez Chacín, então ministro do interior. Mais tarde, em 2006, homens armados mataram um dos guarda-costas de López que estava sentado em seu carro, episódio que, segundo ele, pretendia provocar uma intimidação assustadora.

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Não é a primeira vez que o governo busca desqualificar López para impedi-lo de se candidatar. Quando foi prefeito de Chacao, as autoridades fizeram várias acusações, como a de que ele teria transferido impropriamente dinheiro, em 2003, de uma parte do orçamento do município para outra.

López disse ser ”completamente inocente”, sustentando que o processo legal envolvia pagar salários e benefícios a professores promovidos pelo próprio Chávez. Embora as autoridades tenham impedido dezenas de outras pessoas de disputar eleições, López assinalou que nenhuma corte venezuelana o condenou por qualquer transgressão.

Após a decisão da Corte Interamericana, uma frente ampla de partidos opositores da Venezuela saudou os planos de López disputar uma primária programada para fevereiro. Em pesquisas recentes, ele foi visto, ao lado de Henrique Capriles Radonski, governador do estado de Miranda, como um dos candidatos líderes da oposição.

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Aquele que vencer a primária deve enfrentar uma eleição diferente de todas na história recente do país. Embora Chávez tenha dominado o cenário político por mais de 12 anos e seus apoiadores controlem a Assembleia Nacional, a Suprema Corte e a companhia estatal de petróleo, sua luta contra o câncer expôs uma vulnerabilidade.

Ainda assim, não se sabe como a doença de Chávez irá influenciar a disputa. Seus índices de aprovação aumentaram após a revelação da doença e nenhum outro candidato comanda os recursos financiados pelo petróleo ou o aparato de propaganda estatal que ele tem em mãos. O presidente disse recentemente que derrotou o câncer, sem revelar detalhes, e renovou o escárnio aos oponentes.

Enquanto isso, a candidatura incerta de López dependerá em parte de instituições controladas por apoiadores de Chávez. Um experiente promotor público disse há pouco tempo que as autoridades iram divulgar ”oportunamente” os resultados dos inquéritos criminais contra López.

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Depois que a Suprema Corte desconsiderou a decisão vinculante da Corte Interamericana, o Human Rights Watch classificou a recusa como um ”golpe contra o estado de direito”.

Todavia, o esforço de López, que já dura vários anos, para ter o nome removido da lista negra eleitoral do governo pode estar dando frutos.

O Conselho Nacional Eleitoral, também controlado por apoiadores de Chávez, aceitou recentemente que López disputasse as eleições.

”Não é uma briga fácil, mas como Davi contra Golias, nós somos perseverantes, fiéis e sabemos onde mirar”, declarou o economista.

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