Governo britânico volta a criticar relatório da brasileira Raquel Rolnik
Relatora da ONU, ela reiterou pedido de suspensão da política que reduz auxílio moradia. Governo classificou relatório de “diatribe marxista enganosa”
Um relatório da ONU sobre as condições de moradia na Grã-Bretanha publicado nesta segunda-feira reanimou a discussão em torno da avaliação feita pela brasileira Raquel Rolnik. No papel de relatora especial das Nações Unidas para habitação, ela pediu o fim da política conhecida como “bedroom tax”, que reduz o auxílio moradia para pessoas que vivam em residências com mais quartos do que precisariam. Seu posicionamento foi rejeitado pelo governo, que o classificou de partidário, desacreditado e de uma “enganosa diatribe marxista”.
Governo e oposição usam termos diferentes para se referir à mudança que entrou em vigor em abril deste ano. Enquanto a coalizão governista fala em “subsídio do quarto extra”, os oposicionstas preferem “imposto do quarto” (“bedroom tax”, em inglês).
Entre agosto e setembro do ano passado, a relatora viajou à Grã-Bretanha para pesquisar sobre o tema. À época, seu posicionamento contrário à política governista já foi bastante criticado, com espaço até para comentários grosseiros e exagero na reação contrária a um relatório que, como quase todos os produzidos sob a ONU, deve ter consequência zero. Agora, com a publicação do relatório completo, as reações mais uma vez foram exageradas, como apontou o jornal The Guardian, ao afirmar que dois departamentos do governo reagiram com “palavras fortes pouco usuais”.
“Este relatório partidário está completamente desacreditado, e é decepcionante que a ONU tenha se permitido associar com uma enganosa diatribe marxista”, disse o ministro da Habitação, Kris Hopkins. “O relatório é baseado em evidências anedóticas e a conclusão foi claramente escrita antes que qualquer pesquisa tenha sido completada”, disse uma porta-voz do Departamento de Trabalho e Pensões.
Rolnik, que foi diretora de Planejamento da Prefeitura de São Paulo na gestão de Luiza Erundina e secretária nacional de programas urbanos do Ministério das Cidades no governo Lula, disse que não faria comentários sobre o relatório até que o Conselho de Direitos Humanos discuta o conteúdo do documento em reunião marcada para o dia 10 de março.
Contudo, a fala da relatora no ano passado demonstrou certa base ideológica. Ela chamou a atenção para uma “mudança de status” das pessoas que conseguem, com dificuldade, acesso ao benefício habitacional. “Isso agora é visto como algo apenas para os vulneráveis, para aqueles que falharam como profissionais. Tornou-se algo estigmatizado”. E criticou o governo pelo grande investimento em estímulos para o mercado imobiliário, que não vai resolver o problema. “Os sistemas que estão sendo propostos, como auxílio para compra ou o esquema hipoteca para aluguel, eles não vão proporcionar moradias acessíveis”.
Ao Guardian, Aoife Nolan, especialista em direitos humanos, lembrou que o governo britânico não é forçado a seguir as recomendações do relatório. Acrescentou que, por outro lado, o documento deverá ser usado por grupos que buscam proteger os direitos a benefícios habitacionais.