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Morre o mexicano Roberto Bolaños, o eterno Chaves

Responsável por um fenômeno televisivo que arrebatou legiões de fãs em toda a América Latina, humorista estava com a saúde fragilizada nos últimos anos

Por Da Redação
28 nov 2014, 17h57

Criador de um fenômeno televisivo que, a partir do México, se espalhou pelo continente e conquistou legiões de fãs em toda a América Latina, o humorista mexicano Roberto Gomez Bolaños, autor e intérprete dos personagens Chaves e Chapolin, morreu nesta sexta-feira, aos 85 anos. Com a saúde fragilizada há mais de uma década, Bolaños passou os seus últimos anos em uma cadeira de rodas, lutando contra problemas respiratórios e complicações de diabetes. Nesta sexta-feira, ele sofreu uma parada cardíaca.

A morte de Bolaños deixa órfã uma geração de fãs brasileiros que cresceu assistindo aos episódios de Chaves, a sua principal criação, reprisados exaustivamente pelo SBT ao longo das últimas três décadas. Um grupo de admiradores fiel que, ignorando todas as limitações técnicas da produção, sempre garantiu ótimos resultados de audiência ao programa mexicano – e sempre mostrou um impressionante poder de mobilização a cada ameaça de cancelamento das exibições do seriado, com campanhas fora e dentro das redes sociais. Nesta sexta, com a notícia da morte do humorista, a direção do SBT estuda levar ao ar um especial para homenageá-lo.

Acervo Digital de VEJA:

Sem querer querendo, humorístico vira santo milagreiro do SBT

Entrevista com Roberto Bolaños: ‘Chaves é uma criança com fome’

Razão de tanto carinho, a história do garoto orfão que “sem querer querendo” inferniza a vida da vizinhança caiu nas graças do público apostando em piadas ingênuas e sem apelação: um exemplo claro do tipo de humor que Bolaños pregava. “Quando sobram piadas chulas, é porque falta talento”, afirmou o mexicano em entrevista a VEJA em 1999. Mesmo não sendo um adepto do politicamente correto – como as pancadas de Seu Madruga em Chaves deixam claro -, Bolanõs fugia do humor preconceituoso nos seus roteiros. “Sempre evitei fazer piadas com raças, religiões, opções sexuais e mulheres. Aliás, nos meus programas as meninas sempre são mais inteligentes. No Chaves, era a Chiquinha quem arquitetava os planos mirabolantes”, comentou.

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EFE

Debilitado, Roberto Bolaños usava cadeira de rodas

Pequeno Shakespeare – Antes de se tornar o criador – e o rosto – de Chaves, porém, Bolaños já havia construído uma sólida trajetória artística em seu país. Versátil, o mexicano trabalhou desde jovem nas mais diversas mídias: foi roteirista de programas de rádio, peças de teatro, esquetes de televisão e filmes no cinema – muitas vezes assumindo também o papel de ator. Tal habilidade rendeu ao multifacetado artista o apelido de Chespirito – “pequeno Shakespeare” -, alcunha pela qual ficaria conhecido no México até o fim da carreira, encerrada hoje.

A fama internacional, no entanto, só chegaria mesmo a partir dos anos 1970, com a criação de seus dois personagens mais famosos: o presunçoso herói Chapolin Colorado e o ingênuo Chaves. Dono de uma marreta biônica de plástico e de “anteninhas de vinil” sensitivas, Chapolin é uma divertida sátira dos infalíveis super-heróis dos quadrinhos americanos. A série colecionou um enorme número de fãs e conquistou o seu próprio status cult – camisetas com o emblema do personagem são um ícone pop até hoje -, mas seu alcance jamais superou o da outra criação de Bolaños.

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‘Los Supergenios de la Mesa Cuadrada’

O programa de 1968 reunia os atores Rubén Aguirre (Professor Girafales), Roberto Bolaños (Doutor Chapatín), Ramón Valdés (Ingeniebrio Ramón Valdés) e María Antonieta de las Nieves (como ela mesma e apresentadora). Em tom bem-humorado, os personagens comentavam notícias do momento, intercaladas por esquetes divertidos. 

‘Chespirito – El Ciudadano Gomez’

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El Ciudadano Gomez (1968) foi umas das histórias criadas por Roberto Bolaños para o programa Chespirito, em que apresentaria diversos personagens — entre eles o que dava título à atração. Foi também em Chespirito que nasceram os roteiros de Chapolin e Chaves. No episódio acima, Maria Antonieta interpreta uma vidente vigarista, que finge ver o futuro em sua bola de cristal. 

‘Chapolin’

A história do herói atrapalhado e medroso nasceu em 1970, um ano antes de Chaves e sua vila. Vivido por Roberto Bolaños, Chapolin aparece sempre que alguém está em apuros e tenta resolver a situação. O mesmo grupo de atores que trabalhava em Chespirito se reveza entre diferentes papéis nas histórias que mantêm apenas o quase-herói (e quase anti-herói) como elo principal. Uma das histórias mais famosas é aquela em que Maria Antonieta de Las Nieves interpreta a Bruxa Baratuxa, que tenta fazer com que a “camponesa de coração nobre” se case com seu filho. 

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‘Aquí Está la Chilindrina’

Em 1994, a personagem Chiquinha protagonizou a série Aquí Está la Chilindrina, que contava com números musicais. A história da personagem, no entanto, é diferente da que ficou conhecida em Chaves. Chiquinha era uma garota abandonada pelos pais que foi viver em um convento e enlouqueceu o padre e as freiras do local. Dirigido por Rubén Aguirre, o Professor Girafales, o programa foi o último apoiado por Bolaños, que queria seu nome nos créditos como criador intelectual da personagem e começou, então, a brigar com Maria Antonieta de Las Nieves. 

‘Kiko e sua Turma’

O ator Carlos Villagrán, intérprete de Kiko, protagonizou o seriado ¡Ah qué Kiko! (1988), traduzido como Kiko e sua Turma pela Rede Bandeirantes, que o transmitiu no Brasil. O programa também tinha o ator Ramón Valdés, o Seu Madruga, que assim como Villagrán se desentendeu com Bolaños e deixou o elenco de Chaves. Na história, Kiko é um garoto que trabalha na venda Surpresa, de Seu Madruga. Entre Chaves e Kiko e sua Turma, Villagrán protagonizou também as séries Kiko Botones (1981), Frederrrico (1982) e Las Nuevas Aventuras de Fredericco (1983). 

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Fenômeno latino – Exibido em mais de cem países ao longo de quatro décadas, Chaves desembarcou no Brasil quase por acaso. A série era parte de um pacotão de programas do canal mexicano Televisa comprado por Silvio Santos para turbinar a programação do ainda jovem SBT. Foi o início de uma bem sucedida parceria. Por quase trinta anos ininterruptos, Chaves foi uma das principais atrações – e curingas – da emissora, cobrindo qualquer buraco que surgisse na grade, e invariavelmente dobrando a audiência da faixa. No auge do sucesso, o humorístico cansou de dar surras na Globo, roubando o primeiro lugar no Ibope e deixando diretores do canal carioca temerosos por seus empregos.

Embora também tenha conquistado fãs em outras partes do mundo, foi na América Latina que a principal obra de Bolanõs ganhou contornos de fenômeno cultural – a ponto de ser comparada pela revista Forbes ao revolucionário Simon Bolivar por seu poder unificador no continente. Para o humorista, os índices de pobreza da região ajudavam a explicar o grande apelo do personagem entre os latino-americanos. “O Chaves é uma criança que não cresce porque não come. O personagem faz sucesso em qualquer lugar do planeta onde haja fome”, disse ele na entrevista a VEJA.

Reprodução

Bolanõs abraça Maria Antonieta de las Nieves, a Chiquinha: disputas judiciais abalaram amizade com ex-colegas

​Triângulo amoroso – A exibição original de Chaves no México durou de 1971 a 1980 – terminou, portanto, anos antes de o programa sequer começar a ser veiculado no Brasil. Após esse período, o seriado sobreviveu até 1992 como esquete dentro do programa de Chespirito na Televisa, chegando ao fim por causa da idade avançada de Bolaños, então com 63 anos. Muito antes disso, no entanto, o humorístico já havia sofrido baixas em seu elenco – a primeira delas por causa de um inesperado triângulo amoroso entre Chaves, Dona Florinda e Quico. Ou melhor, entre Bolaños, a atriz Florinda Meza e o ator Carlos Villagrán.

Namorada de Villagrán durante anos, Meza trocou o parceiro pelo intérprete de Chaves em 1977. Logo depois, Villagrán anunciou sua saída do programa para seguir carreira-solo. A rusga entre os ex-colegas, porém, não terminou por aí e acabou se desdobrando em uma disputa judicial pelo personagem de Quico. Por causa da briga, Villagrán passou a se apresentar alterando a grafia do nome para “Kiko”. Mostrando que o tempo não aplacou a animosidade entre eles, o ator acusou Bolaños em 2011 de não lhe pagar os direitos devidos pelo faturamento do programa. “Tudo quem leva é o Roberto, que é multimilionário”, alfinetou.

Conflito semelhante envolveu a intérprete de Chiquinha, Maria Antonieta de Las Nieves, que se desentendeu com Bolaños em 1994 e travou por mais de uma década uma batalha pelos direitos de uso da personagem. As disputas nos tribunais desgastaram a relação entre Bolaños e os ex-colegas e o criador de Chaves nunca mais retomou a amizade com a dupla. “Ele não atende meus telefonemas nem meus convites. Se não quer, não posso obrigá-lo a ser meu amigo”, lamentou Maria Antonieta em entrevista ao site de VEJA em 2013.

O relacionamento com Florinda Meza, porém, rendeu frutos duradouros. Descrita por Bolaños como “uma dessas mulheres que passam de uma em uma e os homens seguem de três em três”, a atriz, vinte anos mais nova do que ele, foi sua companheira por mais de trinta anos – nos últimos deles fazendo também o papel de assessora e enfermeira do marido já debilitado.

Perguntado muitas vezes sobre a razão do estrondoso êxito de sua principal obra, Bolaños tinha uma explicação simples – e surpreendentemente satisfatória – na ponta da língua: “Chaves sempre defendeu valores familiares como honestidade e compaixão, e as pessoas se identificam com ele por causa disso”.

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