Abelha encontrada na África e na Europa sacrifica filhas mais velhas para favorecer caçulas
Estudo suíço mostra que abelhas rainhas da espécie 'Halictus scabiosae' dão propositalmente menos nutrientes a suas filhas mais velhas, condenando-as à morte, para que elas possam ajudar no desenvolvimento das irmãs mais novas
Dizem que as mães devem amar e cuidar de seus filhos de forma igual, sem mostrar predileção por um ou outro. Não parece ser este o caso das abelhas Halictus scabiosae, encontradas na Europa Central e no Norte da África. Um estudo publicado nesta segunda-feira no periódico Frontiers in Zoology sugere que elas praticamente sacrificam suas filhas mais velhas em benefício das caçulas.
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EUSSOCIAL
Eussocial é o termo utilizado para os animais que são organizados nas mais complexas sociedades, o que inclui divisão de tarefas (como entre reprodutores e operárias). São exemplos formigas, abelhas e cupins.
DIAPAUSA
A diapausa é uma espécie de hibernação dos insetos e de alguns outros seres vivos. Em condições climáticas adversas, como em temperaturas muito baixas, ocorre a redução do desenvolvimento de um determinado organismo.
As abelhas Halictus scabiosae são chamadas eussociais, o que significa que são capazes de formar sociedades complexas, com notável divisão de tarefas. Quando acaba o inverno, as rainhas dessa espécie saem em busca, sozinhas ou em grupos, de novas colônias. Na Suíça, onde foi realizado o estudo, elas dão origem a duas ninhadas ao ano, uma entre junho e julho e a outra entre agosto e setembro. Só que as fêmeas da primeira geração, que têm a função de ajudar a mãe na criação de suas irmãs mais novas, são significativamente menores e têm menos reservas de energia. Como essa reserva é fundamental para suportar o rigoroso inverno seguinte, quando as abelhas precisam até mesmo entrar em estado de diapausa (espécie de hibernação dos insetos), a grande maioria das filhas mais velhas morre. Se elas, assim como as caçulas, também têm capacidade reprodutiva, por que são mais frágeis?
A resposta encontrada por Nayuta Brand e Michel Chapuisat, pesquisadores do Departamento de Ecologia e Evolução da Universidade de Lausanne, na Suíça, é bastante simples: a abelha rainha propositalmente deu menos nutrientes às filhas da primeira ninhada, quando elas ainda estavam em estado larval, fazendo com que seus corpos ficassem menores e mais fracos. “Fêmeas com corpos menores podem ser mais fáceis de manipular em um papel subordinado por meio de agressões e interações de dominância”, escrevem os autores no estudo. Ao intencionalmente restringir o desenvolvimento das filhas primogênitas, a abelha-mãe aumenta as chances de sobrevivência das caçulas, que após o inverno reiniciarão o ciclo como novas rainhas.
O acompanhamento de dois anos envolveu 2.498 abelhas e mostrou que o total de pólen e néctar dado à primeira ninhada era menor: as larvas de abelha mais novas receberam, em média, 40% mais recursos do que suas irmãs mais velhas.
“Embora seja difícil distinguir manipulação maternal da disponibilidade natural de recursos, que é influenciada pela vegetação e pelo clima, o fato de termos visto que o tamanho do corpo (das fêmeas) da primeira ninhada permaneceu constante, apesar das diferentes condições climáticas, mostra que as rainhas restringem o alimento para suas filhas, de modo a relegá-las a papéis de operárias”, afirma Chapuisat.
Chapuisat pondera, no entanto, que ainda não está claro até que ponto se pode dizer que a rainha “sacrifica” a primeira ninhada. “Sabemos que existe uma manipulação de alimentos. Mas pode ser que as abelhas mais velhas façam isso voluntariamente, uma vez que ao ajudar suas irmãs e irmãos elas também estão transmitindo seus genes, só que indiretamente.”