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De Fátima Bernardes a Fatinha: o desafio de entreter o público

A difícil primeira semana da ex-âncora do 'Jornal Nacional' nas manhãs da Globo mostra a distância que separa o jornalismo do entretenimento

Por Mariana Zylberkan
30 jun 2012, 17h40

Fátima Bernardes é outra pessoa desde que transferiu para Patricia Poeta, em dezembro, a fução de âncora do Jornal Nacional – que desempenhou por 14 anos. A jornalista séria que desejava boa noite ao telespectador ao lado do marido engravatado deu lugar à apresentadora Fatinha, como a chamou no ar a colega de emissora Sandra Annenberg, com fofura calculada, no dia seguinte à estreia de Encontro com Fátima Bernardes. A transformação no perfil da mulher de William Bonner é imposta pelo novo rumo que ela deu à carreira: a transferência do jornalismo para o entretenimento, um caminho que, como prova a audiência periclitante da sua primeira semana na faixa matinal da Globo, nem sempre é fácil de ser percorrido. Especialistas ouvidos pelo site de VEJA alertam para uma série de cuidados que devem ser tomados por jornalistas que queiram fazer o mesmo percurso – cuidados que a Globo deve intensificar com Fátima nas próximas semanas.

As duas funções parecem próximas. Mas a postura corporal, a entonação da voz e o visual têm de mudar radicalmente no momento em que um jornalista vira apresentador. Que o diga Pedro Bial, um dos mais bem sucedidos nessa transformação. Bial usa, há mais de dez anos, sua bagagem como repórter, que inclui a cobertura da Guerra do Golfo em 1991, para mediar conflitos no Big Brother Brasil. Saiu-se tão bem que desbancou até a comediante Marisa Orth – os dois começaram apresentando juntos o BBB em 2002, mas a atriz acabou dispensada da missão.

Ou que o diga, como exemplo pelo avesso, o travado Britto Jr., simulacro de Bial na Record, onde comanda o reality show A Fazenda. Duro, com dificuldade para improvisar ao vivo, Britto Jr. não diverte nem entretém. Melhor do que ele se saem Astrid Fontenelle, à frente de Chegadas e Partidas, do GNT, e até – quando levado em consideração o contexto, é claro – Sonia Abrão, do sangrento A Tarde É Sua, da RedeTV!, e o estridente José Luiz Datena, que assumiu, recentemente, sua porção showman à frente do game-show Quem Fica em Pé?, na Band.

Para ganhar um ar descontraído e estabelecer maior intimidade com o público, “Ótima Bernardes”, como costumava ser chamada nas sátiras do Casseta & Planeta, já tem um novo guarda-roupas – e novos cuidados de estética. Ela agora usa vestidos fluídos, cílios postiços, cabelos com discretas mechas em tom de mel e muitos, muitos sorrisos.

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Fátima migrou de vez para o mundo do entretenimento – como prova o seu novo contrato com a TV Globo. Funcionária da Central Globo de Jornalismo antes de estrear seu programa matinal, ela passou a fazer parte da Central Globo de Produções. Mais do que mero detalhe, isso significa que Fátima agora pode protagonizar ações de merchandising, proibidas para a turma do jornalismo para não atrelar a credibilidade dos profissionais a produtos e serviços de anunciantes.

Nesta primeira semana, Fátima ainda não atuou como garota-propaganda, pelo menos de forma explícita. O esmalte e o batom que usou na sua estreia, porém, já viraram objetos de desejo entre o público feminino. “Muita gente me liga para saber a marca das coisas que ela usa”, diz o maquiador Ton Reis, responsável pelo visual de Fatinha no ar.

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Além de repaginar a imagem no vídeo, o jornalista metamorfoseado em apresentador tem de encontrar um novo jeito de se comunicar com o público. O espalhafato de Bial ao cumprimentar o espectador a cada episódio do BBB não tem nada de fortuito, assim como o esforço de Fátima para suavizar o tom de voz firme que usava no Jornal Nacional. “O apresentador torna-se um personagem de si mesmo e, por isso, deve estabelecer um clima de conversa com o telespectador”, diz a fonoaudióloga Leila Mendes.

Técnicas – Fátima agora tem passe livre para usar interjeições e gesticular bastante. As mãos de Fátima, no ar, se mexem mais do que as de um italiano de caricatura durante uma discussão . Segundo algumas teorias de linguagem corporal conhecidas dos diretores da Globo, os gestos criam um clima de informalidade e, por isso, devem ter sido estimulados.

A liberdade das mãos combina com o improviso demandado por programas de entretenimento feitos ao vivo. Ao contrário dos telejornais, atrações como Big Brother Brasil, A Fazenda, A Tarde É Sua e Encontro com Fátima Bernardes são guiadas pelo Ibope, que mede a audiência minuto a minuto. Se um determinado quadro chama a atenção do público, ele fica mais tempo no ar, assim como um convidado pode ter a sua participação abreviada se não atrair espectadores suficientes. Já o noticiário televisivo raramente lança mão dessa técnica.

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Em tese, jornalistas se saem bem no improviso graças ao traquejo previamente adquirido em frente às câmeras. Além disso, agregam valor a um programa de entretenimento, já que carregam com eles a credibilidade obtida na lida com notícias sérias. “O perigo é colocar a credibilidade desse profissional a serviço de um jogo duvidoso”, adverte Aldo Quiroga, professor de telejornalismo da PUC-SP e apresentador do programa Matéria de Capa, da TV Cultura.

Talvez por isso, profissionais como Pedro Bial se esforcem para dar um lustro intelectual à sua função de entertainer. Os discursos “filosóficos” feitos nas noites de eliminação do BBB, e que beiram, para dizer o mínimo, a falta de sentido, se tornaram sua marca registrada no reality. E devem ter reprise em seu novo programa, o semanal Na Moral, com estreia marcada para 5 de julho.

Bial ainda insiste em encarnar o jornalista, apesar de se dedicar, quase exclusivamente, a programas de entretenimento que, por definição, deveriam ser despretensiosos. Em Na Moral, Bial vai discutir a moralidade na sociedade brasileira sob diferentes aspectos.

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Se o apresentador ainda encara desafios para se enquadrar no formato diversão-na-TV, apesar de ter dez anos nessa estrada, é óbvio que Fátima Bernardes tem sérios obstáculos a superar. O mais urgente é encontrar um atalho para a emocionar o público. A firmeza com que se expressa pode ter sido eficiente durante os anos em que se dedicou ao Jornal Nacional, mas, no papel de apresentadora, é preciso deixar transparecer seu lado acolhedor e doce. Isso exige mais do que lindos vestidos e bela maquiagem. A Globo está de olho – e espera ver Fatinha desabrochar de verdade.

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