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Com ‘Zeitoun’ o escritor americano Dave Eggers se consagra como ativista

Jovem e respeitado, o escritor e editor americano abre um novo flanco entre ativistas e troca show e oportunismo por discrição e rigor na defesa de suas causas

Por Rodrigo Levino
7 abr 2011, 15h15

Durante uma semana Zeitoun se dedicou a ajudar idosos e animais, navegando pelas ruas da cidade a bordo de um pequeno bote. Uma tarde, enquanto falava com o irmão ao telefone, foi preso pelas forças armadas americanas.

A ideia de que um artista ponha a sua fama e o seu talento a serviço de uma causa é muito boa – em abstrato. Na prática, produz horrores: discos ruins, livros ruins, filmes ruins, e exibições exasperantes de tolice e vaidade. Há dois tipos destacados de artista engajado: o messiânico, que acredita que os líderes políticos são seu rebanho (não os violentados e despossuídos, mas os presidentes e primeiros-ministros, que ele pretende evangelizar) e o idiota útil, sempre à mão para defender ideologias mofadas. Na primeira categoria encontram-se cantores como Sting e Bono e o diretor James Cameron. Na segunda, atores como Sean Penn e Benicio del Toro e cineastas como Oliver Stone (todos eles encantados com o ditador venezuelano Hugo Chávez).

Infinitamente mais raro é o artista que, ao engajar-se numa causa, consegue de fato produzir alguma luz. Um representante desse grupo é o escritor e editor americano Dave Eggers, de 41 anos. Quando se entrega a uma missão, ele o faz com discrição, sobriedade e rigor, como demonstra Zeitoun (Companhia das Letras, tradução de Fernanda Abreu, 400 páginas, 49 reais), que chega às livrarias do Brasil nesta semana e explora o mesmo veio que seu livro anterior, O que é o quê? (2006), o relato impressionante da fuga de uma criança de 4 anos de idade de um Sudão mergulhado na guerra civil. Nos dois casos, Eggers destina a renda obtida com a venda dos livros a fundações humanitárias – sem no entanto bater tambor para a própria caridade.

Zeitoun conta a história de Abdulrahman Zeitoun, um marinheiro sírio que, em 1988, radicou-se em Nova Orleans, nos Estados Unidos, onde construiu uma vida confortável trabalhando como pintor e mestre de obras até se tornar dono do próprio negócio.

Zeitoun, sua esposa Kathy e os cinco filhos se acostumaram, como é típico da região, às intempéries. Volta e meia tufões causam prejuízos e mortes no lugar. Em 29 de agosto de 2005, contudo, o furacão Katrina chegou à costa americana com ventos de até 300 quilômetros por hora e deixou pouca coisa inteira em seu rastro. A catástrofe se ampliou quando os diques de contenção que protegiam a cidade se romperam e Nova Orleans se viu submersa.

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Zeitoun, de Dave Eggers, a capa do livro
Zeitoun, de Dave Eggers, a capa do livro (VEJA)

Durante uma semana Zeitoun se dedicou a ajudar idosos e animais isolados e famintos, navegando pelas ruas da cidade a bordo de um pequeno bote. Uma tarde, enquanto falava com o irmão ao telefone, foi preso pelas forças armadas americanas. A origem síria e a religião islâmica transformaram um herói local e um pai de família pacato em suspeito de terrorismo.

O governo de George W. Bush acreditou que o momento de fragilidade da região era propício para que a rede terrorista Al Qaeda, de Osama Bin Laden, se infiltrasse no país. Sem contato com a família e com uma idéia vaga do motivo da sua prisão, a história de Zeitoun ganhou ares kafkianos. Essa é a história que Eggers explora.

Órfão de pai e mãe, nascido em Boston e criado na periferia de Chicago, Eggers já publicou 16 livros, entre relatos de não-ficção e romances. Dirige uma pequena editora que publica jovens ficcionistas americanos, uma revista literária prestigiosa, a McSweeney’s, mantém projetos de educação financiadas pela iniciativa privada e escreve roteiros de cinema. Recluso, quase nunca dá entrevistas e nunca expõe a vida privada. A cada livro publicado reafirma o seu lugar de intelectual atuante e escritor de rara sensibilidade.

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Ao revelar uma face pouco conhecida do que aconteceu em 2005, em New Orleans, Eggers ajuda na reconstrução da cidade – sem para isso lançar mão doe tom panfletário que invalida as boas ações. Embora rejeite o papel de modelo, é um contraponto aos histéricos que misturam show e ativismo.

Leia mais:

Leia mais: A arte de tocar em frente – Como a arte e a cultura estão ajudando a reerguer New Orleans

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