A história da música tem muitos exemplos de garotas-problema. No soul e no rock, soaram nos anos 1940 e 60 vozes abaladas pelo uso de drogas como as de Billie Holiday e de Janis Joplin. E, mais recentemente, calou-se a da britânica Amy Winehouse, outro talento que levava para a sua interpretação, assim como para as suas letras, o peso e a força das experiências que vivia. Todas têm em comum a tentativa de usar a música para mitigar traumas e dramas pessoais. Em comum entre si e também com dois dos maiores talentos do pop atual: as americanas Fiona Apple e Cat Power, ambas vozes proeminentes dos anos 1990. A primeira lançou seu disco mais recente, The Idler Wheel…, em junho, e a outra voltou nesta semana ao mercado com o álbum Sun, o primeiro depois de uma grave crise psiquiátrica que quase a levou ao suicídio.
Longe de o comportamento destrutivo dessas cantoras ser um empecilho para seu trabalho artístico, ele às vezes serve até como combustível. Fiona já disse em várias entrevistas, por exemplo, que ter sido estuprada aos 12 anos de idade a ajudou a perceber o tipo de artista que queria ser. Ela também já admitiu em entrevistas que tem o costume de se autoflagelar para externar a dor emocional. Já Cat Power, nome adotado pela cantora Chan Marshall, praticamente lança um disco a cada vez que termina um relacionamento amoroso, com letras tão confessionais quanto os textos de um diário secreto.
Essa relação entre vida e arte não apenas aproxima Fiona e Chan de virtuoses como Billie e Janis como as distancia de outra categoria de cantoras-problemas, a das bad-girls. Maioria entre as vozes pop de hoje, personalidades como Britney Spears e Rihanna metem o pé na jaca, se internam em clínicas de reabilitação, vivem em uma montanha-russa de emoções mas, como não são propriamente músicas e compositoras, mas entertainers, vestem um personagem quando sobem ao palco. Suas experiências pessoais só se refletem de maneira indireta em suas canções.
É exatamente por essa diferença que Fiona e Chan se sobressaem. Ambas deixam que seus sentimentos – inclusive os piores – impregnem suas canções. Sem receio de chorar. Ou de tocar. É nessa conversão de fragilidade em força musical que reside o talento das duas, que têm muito mais em comum do que belas vozes. Confira.