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Um novo ‘advogado-geral’ para o PT

Por Felipe Frazão 1 nov 2015, 07h56

Com duas operações da Polícia Federal no seu encalço e no dos seus filhos, o governo Dilma Rousseff ruindo e a imagem do Partido dos Trabalhadores desconstruída, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recorreu a um tipo de personagem de que sempre se cercou: o advogado-militante. Foi assim com o ex-ministro Marcio Thomaz Bastos, um dos principais defensores no escândalo do mensalão, e os ex-deputados Sigmaringa Seixas e Luiz Eduardo Greenhalgh. Desde o início deste ano, o novo representante da estirpe é Wadih Nemer Damous Filho, que passou a frequentar reuniões privadas no Instituto Lula, em São Paulo, e a ser convidado para debates e palestras internas. O carioca de 59 anos, petista desde a fundação do partido nos anos 1980, é suplente de deputado federal e caiu nas graças de Lula ao subir o tom contra um dos pilares da Lava Jato: os acordo de colaboração premiada. Em fevereiro, Damous dividiu com Lula um palanque na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no Rio, em ato supostamente em defesa da Petrobras. Criticou de uma só vez o ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa, relator do mensalão, e o juiz federal Sergio Moro, e comparou as delações premiadas à tortura. Era o que Lula sempre sonhou ouvir.

Wadih Damous presidiu por dois mandatos a OAB do Rio, entre 2007 e 2012. Na campanha de reeleição, em 2009, foi acusado por um adversário, o advogado Lauro Schuch, de abusar dos meios de comunicação e de usar a estrutura do órgão para se autopromover. Uma edição da Tribuna do Advogado veio acompanhada de uma carta laudatória de Damous, inclusive com foto dele. A Justiça Federal deu razão ao desafeto do petista e o proibiu de publicar, durante aquela campanha, seu nome, foto ou logomarca nos veículos institucionais da OAB fluminense. Mas Damous venceu com quase 67% dos votos.

Ele também presidiu a Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB e a Comissão da Verdade do Rio, além do Sindicato dos Advogados do Estado. Formado em Direito na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), onde foi contemporâneo do ministro do STF Luís Roberto Barroso, cursou mestrado em Direito Constitucional na Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ). No início da carreira, conheceu os meandros do sindicalismo, ao trabalhar como advogado dos sindicados dos Metalúrgicos e dos Ferroviários, uma raiz em comum com Lula.

Damous concorreu pela primeira vez nas eleições gerais em outubro do ano passado, mas não se elegeu com os 37.814 votos recebidos e ficou na primeira suplência até maio. Damous fez uma campanha com gastos declarados de pouco mais de 1 milhão de reais, arrecadados principalmente de pessoas físicas. Ele só recebeu dinheiro de três doadores empresariais, todos escritórios de advocacia – entre eles, o próprio, Damous Advogados Associados.

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Ele assumiu o mandato por intervenção de Lula, um mês depois da prisão do então tesoureiro nacional do PT João Vaccari Neto. Lula convenceu partidários do Rio a forçarem a abertura de uma vaga na bancada para o suplente. A vítima da operação foi o deputado Fabiano Horta, indicado a contragosto para uma secretaria na prefeitura do Rio, com aval do prefeito Eduardo Paes (PMDB). Damous era assim escalado para encarnar uma espécie de advogado-geral do PT.

“O presidente Lula entendeu que havia uma carência de quadros jurídicos na bancada do PT, e que era importante que eu fosse para lá”, disse ao site de VEJA, apesar de outros onze dos 62 deputados em exercício também serem advogados. “Tentam me desqualificar, mas não sou criação de Lula nem de ninguém.Tenho trajetória própria.”

Damous tem dado mostras no plenário da oratória talhada nos tribunais que atraiu olhos e ouvidos de Lula para defender interesses do partido. Na terça-feira à noite, além de parabenizar o ex-presidente que completava, conforme suas palavras, “70 honrados anos de idade”, Damous bradou da tribuna contra a publicação na imprensa das informações prestadas em colaboração premiada pelo operador do PMDB no petrolão, Fernando Soares, o Baiano. O delator implicou Lula e seus familiares, indicando que participou de um esquema para repassar 2 milhões de reais a uma nora de Lula.

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Para Damous, Lula e os filhos são vítimas de perseguição. “Espero que os defensores do senhor Fábio [Luís, o Lulinha] e do presidente Lula recorram ao Conselho Nacional de Justiça pedir investigação sobre esses vazamentos, que constituem crime”, disse. Ao site de VEJA, ele também disse que houve excessos na Operação Zelotes durante buscas em endereços de outro filho de Lula, Luís Claudio, como a apreensão de “utensílios domésticos”. “Fui informado de que a defesa do Luis Claudio só teve acesso a certos documentos 24 horas depois da imprensa. Isso é um absurdo, esses vazamentos são criminosos. É inaceitável.”

Damous diz que o Congresso já não é mais um “celeiro de juristas” e admite que uma das estratégias de argumentação dos réus e investigados na Lava Jato, as alegadas violações ao amplo direito de defesa, estão na pauta de seu mandato. Da tribuna, ele é capaz de se exaltar a ponto de dizer que “segmentos do Poder Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal massacram princípios democráticos e são uma ameaça ao Estado Democrático de Direito”. “A conjuntura hoje está impregnada dessas questões jurídicas, de criminalização, de aspectos ligados ao Direito ou à violação de direitos. Acabo sendo muito demandando. Não tem jeito, tenho que me posicionar sobre eles.”

“Seria muito fácil para mim bater palma para o juiz Sergio Moro, para esses procuradores, para as operações da Polícia Federal. Eu estaria eleito com 500.000 votos, até porque faria isso com bem mais qualidade do que muitos fazem. Mas como cidadão que combateu a ditadura militar e como advogado, eu tenho apego a princípios que só com muito suor e trabalho foram inscritos na Constituição. E acho que alguns segmentos violam esses princípios em nome de um susposto combate à corrupção. “

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Assim que foi alçado à bancada petista, Damous ganhou vaga de membro titular na CPI da Petrobras e na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Foi ele o autor do requerimento para convocar o superintendente da PF no Paraná, Rosalvo Franco, para depor da Lava Jato. Em vão, o delegado se manteve calado. Ele já propôs no Congresso a revogação da Lei de Segurança Nacional e a revogação do crime de desacato do Cógido Penal. Wadih justifica que as leis são um “entulho autoritário”.

Na semana passada, em entrevista à TVT, mantida por sindicatos com ligação umbilical com o PT, Damous desqualificou o que identifica como três frentes de golpismo contra a presidente Dilma Rousseff: a ação de impugnação de mantado eletivo no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os pedidos de impeachment na Câmara e a rejeição das contas de 2014 pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Damous evocou até o ex-presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, persona non grata no PT por causa do mensalão, para dizer que o TCU “é um playground de políticos fracassados, uma sinecura composta por apaniguados que não têm conhecimento jurídico”. Ele emendou dizendo que o ministro Gilmar Mendes, relator das contas de Dilma no TSE, é “militante do PSDB” e que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), “em breve estará encarcerado”.

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Cunha, que tem nas mãos o poder de aceitar ou rejeitar os pedidos de impeachment, tem rusga antiga com Damous, por defender o fim do exame da Ordem dos Advogados do Brasil. Damous foi um dos que assinou a representação contra o peemedebista no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, que pode resultar na cassação do mandato de Cunha.

“Se vier um caminhão de provas da Suíça noticiando que ele tem contas, vai se votar como? Vamos fazer de conta que ele não disse na CPI que não tinha contas no exterior? Que essas contas são legais e estão devidamente declaradas no Imposto de Renda? Que ele tem renda compatível para ter movimentado essa dinheirama que os jornais noticiam que movimentou? Isso não é julgamento político. Isso se julga de acordo com as provas, e eu espero que o PT e os outros partidos se pautem por isso.”

Outro desafeto declarado de Damous é Gilmar Mendes, relator das ações contra Dilma Rouseff no TSE. “O ministro Gilmar Mendes é um juiz, então deveria ficar de boca fechada. Ele deveria falar nos autos e não fora deles. Para mim ele é um militante político partidário e acabou. A partir do momento que o ministro Gilmar Mendes se despe da toga para fazer pronunciamentos políticos partidários ele tem que aguentar as consequencias.”

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A maior feito de Damous até agora, em prol do governo Dilma Rousseff, foi conseguir interromper no Supremo o rito de análise dos pedidos de impeachment. Ele foi mentor dos mandados de segurança impetrados para questionar a validade das regras estabelecidas por Eduardo Cunha para dar rito ao processo. A estratégia foi traçada pelos deputados que fazem parte do núcleo de defesa do governo petista. Além de se reunirem periodicamente, eles fazem debates on-line em redes sociais. Participam o líder do governo, Paulo Pimenta (PT-RS), o também advogado Paulo Teixeira (PT-SP), e Rubens Pereira Júnior (PCdoB-MA).

Damous é amigo de Flávio Dino (PCdoB), governador do Maranhão e juiz de carreira, com quem escreveu um livro jurídico. Um de seus apoiadores no núcleo de defesa petista é Rubens Pereira Júnior, deputado do PCdoB maranhense e aliado de Dino. Nas duas últimas eleições gerais, Damous fez doações de dinheiro para candidatos do PCdoB no Rio.

Damous diz que não pertence a nenhuma das correntes internas do PT. Afirma que se mantém distante de articulações, mas sabe que a Construindo um Novo Brasil (CNB), majoritária e integrada por Lula, defende a troca no comando do Ministério da Justiça, desde o início do governo Dilma comandado por José Eduardo Cardozo, da Mensagem ao Partido.

“Tenho excelente relacionamento com o ministro Cardozo. Quem avalia, nomeia e exonera é a presidente da República. Mas, pelo menos nesse momento, acho que o ministro José Eduardo Cardozo tem que permanecer porque estamos atravessando na Câmara essa questão do impeachment ele é um jurista e tem essa questão muito bem definida na cabeça dele.” Nisso, ele discorda de Lula.

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