Mensalão: réus tentam emplacar tese de caixa dois para minimizar crimes
Objetivo dos réus é tentar evitar condenações por crimes maiores, que podem até levá-los à prisão
Às vésperas do julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), os principais réus do maior escândalo político do governo Lula tentam repisar a tese de que o intrincado esquema de corrupção se resume à utilização de recursos de caixa dois de campanha.
A cantilena dos réus de que eram apenas “recursos não-contabilizados” de campanhas tem o objetivo de tentar minimizar condenações por crimes maiores, cujas penas são mais duras, como lavagem de dinheiro, peculato e formação de quadrilha. Na prática, é uma tentativa de reduzir todo o esquema a um desvio eleitoral, já que a legislação brasileira é branda com o crime de caixa dois. Prevê apenas que, se for comprovado, o político tem o registro de candidatura negado ou, se eleito, passa a responder a processo de cassação. Dos 38 réus da ação penal, apenas três têm mandatos. E não há registros de políticos que tenham perdido o cargo, em última instância, pelo crime de caixa dois.
No entanto, ainda que a cúpula do PT e os beneficiários do que ficou conhecido como “valerioduto”, em alusão ao nome de Marcos Valério, o operador do mensalão, afirmem que tudo não passou de dinheiro recebido “por fora”, o STF tomará decisões a partir da denúncia elaborada pela Procuradoria-Geral da República. Redigida pelo então procurador-geral Antonio Fernando de Souza, a denúncia é assertiva ao afirmar que “Marcos Valério e seu grupo evoluíram, a partir do início de 2003, em conluio com José Dirceu, Delúbio Soares, José Genoino, Silvio Pereira e outros para a compra de apoio político de parlamentares”.
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O escândalo do mensalão, que ameaçou a continuidade do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, também foi investigado por duas CPIs (Comissão Parlamentar de Inquérito) no Congresso Nacional. A mais notória delas, batizada de CPI dos Correios – o órgão estatal foi embrião da crise – rastreou o caminho do dinheiro distribuído aos mensaleiros. O dinheiro do mensalão passava pelas agências de publicidade de Marcos Valério, sem a obrigatoriedade de prestação de serviços. Segundo denúncias, as cifras chegavam aos parlamentares em malas ou por meio de saques na boca do caixa do Banco Rural.
“É reduzir-se em demasia a inteligência dos brasileiros imaginar que será bastante dizer que os milhões não foram distribuídos a parlamentares, mas sim corresponderiam a caixa dois de campanhas”, concluiu o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), relator da CPI dos Correios.
Conforme o próprio Serraglio, a tese de que o mensalão seria mero crime eleitoral só foi cunhada meses depois do estouro do escândalo. “Já então de forma orquestrada”, conclui o parlamentar no relatório final da CPI.
No auge da crise política, o então presidente Lula também tentou minimizar a atuação petista no mensalão e afirmou que o caixa dois era uma prática sistêmica no país. Em suas palavras, “do ponto de vista eleitoral, é o que é feito no Brasil sistematicamente”.